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Panorama Econômico
Publicado em 15 de setembro de 2025 às 07h32.
Nas últimas duas décadas, testemunhamos a mais violenta redistribuição de riqueza da história moderna. Não foi através de guerras ou revoluções políticas, mas de algo aparentemente mais sutil: a transformação digital. Os dados são eloquentes: das dez pessoas mais ricas do planeta hoje, oito construíram seus impérios sobre bits, não sobre tijolos. O Vale do Silício destronou Wall Street. A China emergiu como superpotência tecnológica. O cetro mudou de mãos, e muitos investidores tradicionais sequer perceberam.
Este não é apenas mais um momento de mudança. É o momento em que a velocidade da mudança se tornou exponencial. No universo dos investimentos, cinco anos, antes considerados curto prazo, agora representam um ciclo completo de transformação setorial. Empresas centenárias desaparecem enquanto startups se tornam gigantes trilionárias. E a pergunta que deveria tirar o sono de todo investidor é: de que lado desta equação você estará?
A internet, desde os anos 2000, introduziu uma força deflacionária sem precedentes na economia global. Produtos e serviços que custavam milhares passaram a custar centavos. Quem compreendeu esse fenômeno (e, mais importante, suas implicações para a alocação de capital) encontrou oportunidades extraordinárias. Amazon, Google e Facebook não apenas criaram novos mercados: eles destruíram margens de setores inteiros enquanto capturavam valor em escala planetária.
Agora, com a inteligência artificial, esse processo se intensifica de forma dramática. Funções inteiras estão sendo eliminadas da noite para o dia. Programadores juniores, designers gráficos, analistas financeiros — tarefas que consumiam semanas agora são executadas em minutos por algoritmos que custam frações de centavo. É a deflação em esteroides, criando simultaneamente oportunidades monumentais e riscos existenciais para patrimônios construídos sobre premissas obsoletas.
Há uma verdade incômoda que poucos gestores admitem: a democratização da informação eliminou quase completamente as oportunidades de arbitragem tradicional. Algoritmos processam notícias em nanossegundos. Milhões de investidores retail têm acesso aos mesmos dados que antes eram privilégio de poucos. Os preços dos ativos refletem novas informações quase instantaneamente.
Neste ambiente hipercompetitivo, a ingenuidade é punida sem piedade. Investidores despreparados tornaram-se, nas palavras cruéis, mas precisas, do mercado, “provedores de liquidez”. É o eufemismo educado para quem está do lado perdedor das transações. Vivemos a nova seleção natural do capital, onde apenas os mais adaptados prosperam.
Se a informação não é mais vantagem, o que é? A resposta está nos modelos — frameworks sofisticados de tomada de decisão que transformam dados em inteligência acionável.
Warren Buffett e Charlie Munger não ficaram bilionários por terem informações exclusivas, mas por terem desenvolvido um modelo mental superior para processar as informações disponíveis a todos.
Hoje, os melhores gestores combinam intuição humana com poder computacional, modelos quantitativos com análise qualitativa, inteligência artificial com inteligência emocional. Não se trata mais de escolher entre homem ou máquina, mas de orquestrar uma simbiose entre ambos. Os profissionais que dominam essa alquimia são os novos guardiões da riqueza, capazes de conduzir seus clientes através da complexidade exponencial dos mercados modernos.
Mas talvez a reflexão mais importante não seja sobre como preservar riqueza, e sim sobre o que constitui riqueza em primeiro lugar. Numa era em que fortunas bilionárias evaporam em dias e unicórnios se tornam dinossauros em meses, a própria definição de patrimônio merece revisão.
Paradoxalmente, quanto mais volátil se torna o mundo material, mais valiosos se tornam os ativos intangíveis: conhecimento adaptável, redes de relacionamento resilientes, capacidade de aprendizado contínuo. A verdadeira preservação de riqueza no século XXI pode não estar em proteger o que você tem, mas em desenvolver a capacidade de criar valor continuamente, independentemente das disrupções que virão.
A questão não é se o próximo tsunami tecnológico vai reorganizar a distribuição de riqueza global. Ele vai. A questão é se você será surfista ou será a onda que quebra na praia. E essa escolha, ao contrário do que muitos pensam, ainda está inteiramente em suas mãos.
A preservação de patrimônio na era digital não é sobre resistir à mudança, mas sobre surfar sua crista com inteligência e propósito.
Eduardo Rolla é sócio e membro do conselho de administração da Oikos Multi Family Office e CEO da Zsys Capital, a gestora de recursos do grupo.