Sua marca quer ser relevante? É bom conversar com a sua comunidade
As pessoas de uma comunidade digital têm legitimidade de expert e a mesma característica: são especialistas
Publicado em 30 de junho de 2020 às, 12h43.
Última atualização em 15 de julho de 2020 às, 20h30.
Um dos temas que têm mais me chamado atenção e acredito que para as empresas e agências de marketing digital é sobre o entendimento do que são comunidades digitais e como dialogar com esse público.
Antes de mais nada, precisamos entender o que são comunidades no seu sentido stricto do termo. Comunidades são organizações de pessoas que em conjunto constroem relações íntimas. A comunidade desenvolve se forma através de uma motivação afetiva e lida com a interação interior e exclusiva, ou seja, seria o estado ideal dos grupos humanos.
As comunidades digitais, guardadas devidas proporções são constituídas de conexões moldadas à imagem e semelhança das comunidades tradicionais.
A antropologia contemporânea entendeu a necessidade dessa linha de pesquisa e se presta a investigar o ciberespaço e a cibercultura, estes são alinhados em três princípios: a interconexão, as comunidades digitais e a inteligência coletiva.
No caso, a cibercultura é um formato de “tecnocultura” onde se misturam cenário material, simbólico e imaginário que não envolve apenas discurso no sentido stricto, mas também práticas, objetos, imaginários e formas de sociabilidade.
No caso das comunidades digitais as práticas coletivas ganham uma dimensão global, pois algumas das suas principais características são virtualização e a desterritorialização, fazendo com que ações, vínculos, relações sociais ocorram em grande escala. Além disso, cria-se uma rede de interações com o intuito de se fazer estar e ser no mundo, é um registro social baseado em relações recíprocas de copresença.
Nestes “espaços” as pessoas reafirmam, produzem e reproduzem crenças, regras, valores
Para o sociólogo Maffesoli existe uma “efervescência e eflorescência”, “numa dimensão afetiva e sensível” que traduzem o novo espírito do tempo, o “reagregamento” de pessoas já que o homem não é passível de isolamento. Nesses lugares as pessoas podem ser o que quiserem, experimentarem a si mesmas, levantarem bandeiras, é um lugar para a gente ser a gente sem esforço. É o que Le Breton chama de “socialização afetiva”, em vez de distanciar, a internet junta quem já está próximo, conjugam os mesmos regimes de valor e sistema de crenças produzindo visibilidades e expressão dos sujeitos.
Vivemos sob esse código – o espírito do tempo – e ninguém está imune.
Desafio para as marcas
O grande estímulo e ao mesmo tempo obstáculo para as marcas será a forma de entendimento da própria comunidade. Entender sua história, mensagem, regras e valores. As pessoas pertencentes às comunidades digitais ganham a legitimidade de um expert, defendem bandeiras (políticas ou não), mas comungam a mesma característica: são especialistas.
O sociólogo Bruno Latour, um estudioso da teoria Ator-Rede que eu mesma usei para estudar redes sociais e comunidades na minha tese de doutorado indica um caminho que obtive sucesso ao adotar: “rastrear relações mais sólidas e descobrir padrões mais reveladores quando se encontra um meio de registrar vínculos entre quadros de referência estáveis e mutáveis em vez de tentar estabilizar um deles”.
Ou seja, não adianta criar personas únicas, pois elas são fluidas, precisamos analisar as comunidades digitais como associações, investigar suas lideranças, seus mediadores e vozes.
Defende que para analisar redes sociais ou associações faz-se necessário entender lideranças, e outros componentes que ele denomina de “mediadores e intermediários”. As marcas precisam entender profundamente a essência da comunidade digital para só depois testar inserções, que devem ser graduais, como provas de testes.
Além disso, o DNA da marca precisa conversar com os valores dos grupos – das comunidades digitais, senão poderá cair no erro de um oportunismo descabido e completamente fora do contexto contemporâneo.
Como consumidores, estamos cada vez mais atentos e vigilantes em termos de ações de marketing, e, para ser consistente as marcas precisam, inevitavelmente, construir sua relação de proximidade junto das pessoas, suas bandeiras, gostos, escolhas, crenças e valores. Como a aposta está no vínculo social se faz cada vez mais necessário profissionais treinados para lidar com essa nova forma de fazer publicidade. Não adianta ideias criativas e bem intencionadas se não houver verdade (na leitura do público-alvo)...
Como defensora da Antropologia Estratégica, aquela que possui uma aplicação na vida cotidiana, o caminho está na humanização, no entendimento das práticas culturais e é isso que a Antropologia se propõe: gerar vínculos, criar pontes e construir entendimentos. That's the answer!
Hilaine Yaccoub é doutora em Antropologia do Consumo. Atua como palestrante, e consultora, realizando estudos que promovem ligação entre o mercado consumidor, o conhecimento acadêmico e as empresas. Para seguir nas redes sociais: @hilaine