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Privatizações são essenciais para retomada do crescimento brasileiro

Em artigo, Robson Braga de Andrade, presidente da CNI, fala sobre a expansão da participação privada e seu papel na melhora da eficiência dos serviços

Bandeira do Brasil no Rio de Janeiro (Cesar Okada/Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 14 de março de 2022 às 18h41.

Última atualização em 14 de março de 2022 às 19h50.

PorRobson Braga de Andrade*

Há quase três décadas, o Brasil iniciou o processo de desestatização de ativos públicos, em grande parte de bens e empresas no setor de infraestrutura. A expansão da participação privada, além de melhorar a eficiência e a cobertura na prestação dos serviços, se contrapôs à progressiva redução da capacidade de investimento governamental, agravada pela crise fiscal e econômica dos últimos anos.

Atualmente, os recursos privados respondem por 70% dos cerca de R$ 130 bilhões investidos por ano nas diferentes áreas da infraestrutura brasileira. Em 2010, essa participação era de apenas 46%. O capital privado impediu que a queda nos investimentos em infraestrutura fosse ainda mais pronunciada nesse período.

A expansão do capital privado foi alcançada graças a uma série de iniciativas: a aprovação da Lei de Concessões de 1995; a criação das agências reguladoras, no início dos anos 2000; e a instituição do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), em 2016. O PPI combateu uma antiga deficiência do poder público na estruturação, elaboração de estudos e implementação de projetos de infraestrutura para a desestatização.

Entre 2017 e 2021, União, estados e municípios assinaram mais de 600 contratos para a exploração privada de empreendimentos em diferentes setores. Os números revelam que o Brasil possui um dos maiores programas de transferência de ativos públicos de infraestrutura em todo o planeta.

Hoje, o capital privado opera 44 aeroportos federais, 367 terminais e áreas portuárias arrendadas ou autorizadas, 30 mil quilômetros de ferrovias, e 24,7 mil quilômetros de rodovias (12% da malha pavimentada do Brasil). Também merece destaque a crescente operação privada de áreas para a exploração de petróleo e gás, de distribuidoras e geradoras de energia elétrica, e de segmentos de telecomunicações e de saneamento básico.

O saneamento é a boa novidade na programação das privatizações. Os leilões que aconteceram após a aprovação do Novo Marco Legal do setor (Lei n.º 14.026/2020) foram todos bem-sucedidos, com destaque para a privatização da Companhia Estadual de Água e Esgoto do Rio de Janeiro (Cedae), que arrecadou R$ 22,6 bilhões em outorga e foi considerado um dos maiores leilões de infraestrutura dos últimos anos.

Nesse segmento, ainda há um longo trabalho pela frente, pois apenas 515 municípios são atendidos por empresas privadas. Os investimentos em saneamento, além de alavancar a economia local por meio da geração de empregos e de renda, têm efeito multiplicador em uma longa cadeia produtiva, com ênfase em serviços de engenharia e construção civil, produtos químicos, produtos de metal para reservatórios e tubos, que, por sua vez, serão demandantes da indústria de aço e alumínio. Há, também, aumento na procura pela fabricação de produtos de plástico e borrachas, assim como na indústria de materiais não metálicos (cimento e concreto).

A continuidade e o aprofundamento das concessões e das privatizações são primordiais para intensificar o processo de recuperação econômica e auxiliar na pavimentação de um novo ciclo de crescimento com base na expansão do investimento privado.

Ainda em 2022, são aguardados os leilões dos últimos 16 aeroportos federais geridos pela Infraero, além da desestatização da primeira administração de um porto público, a Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa). O certame servirá de modelo para a transferência ao setor privado das demais Companhias Docas do país, incluindo o Porto de Santos. Essas empresas públicas são marcadas por ineficiências administrativas e dificuldades na realização dos investimentos em infraestruturas portuárias essenciais à competitividade do produto nacional.

A redução na quantidade de empresas públicas no país é essencial para reequilibrar as contas do governo e retomar a capacidade de investimento do Estado. Apenas no âmbito federal, existem, hoje, 155 estatais – eram 230 em 2016. O total considerável de companhias ainda sob gestão governamental revela que há espaço para novas desestatizações, especialmente na área de infraestrutura.

Entre as desestatizações previstas para os próximos anos, a principal é a do Grupo Eletrobras. Trata-se da maior holding do setor elétrico da América Latina e uma das cinco maiores geradoras hidrelétricas do mundo em capacidade instalada. Além disso, a empresa detém mais de 30% da geração do Brasil e mais de 70 mil quilômetros de linhas de transmissão.

O processo de desestatização da Eletrobras é muito importante para o país. A empresa precisa realizar os investimentos necessários sem as amarras do controle público e com a agilidade do setor privado. O processo avança na direção de libertá-la de possíveis ingerências políticas, que tantos prejuízos já causaram a ela e ao Brasil.

Atualmente, 67% do mercado de geração de energia elétrica já é operado por empresas privadas. Não existe falha de mercado que justifique a manutenção de uma empresa estatal no setor.

Essa grande desestatização está inserida no contexto de reforma estrutural do setor elétrico brasileiro. O atual modelo tem apresentado claros sinais de desgaste. Problemas no planejamento e na gestão dos mercados desestabilizaram o setor, gerando custos adicionais, crescente judicialização e enormes passivos financeiros que recaem sobre os consumidores. Hoje, dois projetos de lei (PL nº 1.917/2015 e PL nº 414/2021) tramitam no Congresso Nacional e, ambos, com os aperfeiçoamentos necessários, serão capazes de promover as transformações de que o país precisa nessa área.

Apesar dos avanços observados e da ambiciosa agenda de desestatização prevista, não devemos subestimar a complexidade do processo e os obstáculos nos próximos anos. Essa pauta deverá perdurar por ao menos mais uma década, havendo vontade política de avançar e compreensão da sociedade de sua importância. Não há outro caminho: a superação do baixo nível de investimentos em infraestrutura depende da consolidação do processo de desestatização como uma prioridade de Estado.

* Robson Braga de Andrade é e mpresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI)

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PorRobson Braga de Andrade*

Há quase três décadas, o Brasil iniciou o processo de desestatização de ativos públicos, em grande parte de bens e empresas no setor de infraestrutura. A expansão da participação privada, além de melhorar a eficiência e a cobertura na prestação dos serviços, se contrapôs à progressiva redução da capacidade de investimento governamental, agravada pela crise fiscal e econômica dos últimos anos.

Atualmente, os recursos privados respondem por 70% dos cerca de R$ 130 bilhões investidos por ano nas diferentes áreas da infraestrutura brasileira. Em 2010, essa participação era de apenas 46%. O capital privado impediu que a queda nos investimentos em infraestrutura fosse ainda mais pronunciada nesse período.

A expansão do capital privado foi alcançada graças a uma série de iniciativas: a aprovação da Lei de Concessões de 1995; a criação das agências reguladoras, no início dos anos 2000; e a instituição do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), em 2016. O PPI combateu uma antiga deficiência do poder público na estruturação, elaboração de estudos e implementação de projetos de infraestrutura para a desestatização.

Entre 2017 e 2021, União, estados e municípios assinaram mais de 600 contratos para a exploração privada de empreendimentos em diferentes setores. Os números revelam que o Brasil possui um dos maiores programas de transferência de ativos públicos de infraestrutura em todo o planeta.

Hoje, o capital privado opera 44 aeroportos federais, 367 terminais e áreas portuárias arrendadas ou autorizadas, 30 mil quilômetros de ferrovias, e 24,7 mil quilômetros de rodovias (12% da malha pavimentada do Brasil). Também merece destaque a crescente operação privada de áreas para a exploração de petróleo e gás, de distribuidoras e geradoras de energia elétrica, e de segmentos de telecomunicações e de saneamento básico.

O saneamento é a boa novidade na programação das privatizações. Os leilões que aconteceram após a aprovação do Novo Marco Legal do setor (Lei n.º 14.026/2020) foram todos bem-sucedidos, com destaque para a privatização da Companhia Estadual de Água e Esgoto do Rio de Janeiro (Cedae), que arrecadou R$ 22,6 bilhões em outorga e foi considerado um dos maiores leilões de infraestrutura dos últimos anos.

Nesse segmento, ainda há um longo trabalho pela frente, pois apenas 515 municípios são atendidos por empresas privadas. Os investimentos em saneamento, além de alavancar a economia local por meio da geração de empregos e de renda, têm efeito multiplicador em uma longa cadeia produtiva, com ênfase em serviços de engenharia e construção civil, produtos químicos, produtos de metal para reservatórios e tubos, que, por sua vez, serão demandantes da indústria de aço e alumínio. Há, também, aumento na procura pela fabricação de produtos de plástico e borrachas, assim como na indústria de materiais não metálicos (cimento e concreto).

A continuidade e o aprofundamento das concessões e das privatizações são primordiais para intensificar o processo de recuperação econômica e auxiliar na pavimentação de um novo ciclo de crescimento com base na expansão do investimento privado.

Ainda em 2022, são aguardados os leilões dos últimos 16 aeroportos federais geridos pela Infraero, além da desestatização da primeira administração de um porto público, a Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa). O certame servirá de modelo para a transferência ao setor privado das demais Companhias Docas do país, incluindo o Porto de Santos. Essas empresas públicas são marcadas por ineficiências administrativas e dificuldades na realização dos investimentos em infraestruturas portuárias essenciais à competitividade do produto nacional.

A redução na quantidade de empresas públicas no país é essencial para reequilibrar as contas do governo e retomar a capacidade de investimento do Estado. Apenas no âmbito federal, existem, hoje, 155 estatais – eram 230 em 2016. O total considerável de companhias ainda sob gestão governamental revela que há espaço para novas desestatizações, especialmente na área de infraestrutura.

Entre as desestatizações previstas para os próximos anos, a principal é a do Grupo Eletrobras. Trata-se da maior holding do setor elétrico da América Latina e uma das cinco maiores geradoras hidrelétricas do mundo em capacidade instalada. Além disso, a empresa detém mais de 30% da geração do Brasil e mais de 70 mil quilômetros de linhas de transmissão.

O processo de desestatização da Eletrobras é muito importante para o país. A empresa precisa realizar os investimentos necessários sem as amarras do controle público e com a agilidade do setor privado. O processo avança na direção de libertá-la de possíveis ingerências políticas, que tantos prejuízos já causaram a ela e ao Brasil.

Atualmente, 67% do mercado de geração de energia elétrica já é operado por empresas privadas. Não existe falha de mercado que justifique a manutenção de uma empresa estatal no setor.

Essa grande desestatização está inserida no contexto de reforma estrutural do setor elétrico brasileiro. O atual modelo tem apresentado claros sinais de desgaste. Problemas no planejamento e na gestão dos mercados desestabilizaram o setor, gerando custos adicionais, crescente judicialização e enormes passivos financeiros que recaem sobre os consumidores. Hoje, dois projetos de lei (PL nº 1.917/2015 e PL nº 414/2021) tramitam no Congresso Nacional e, ambos, com os aperfeiçoamentos necessários, serão capazes de promover as transformações de que o país precisa nessa área.

Apesar dos avanços observados e da ambiciosa agenda de desestatização prevista, não devemos subestimar a complexidade do processo e os obstáculos nos próximos anos. Essa pauta deverá perdurar por ao menos mais uma década, havendo vontade política de avançar e compreensão da sociedade de sua importância. Não há outro caminho: a superação do baixo nível de investimentos em infraestrutura depende da consolidação do processo de desestatização como uma prioridade de Estado.

* Robson Braga de Andrade é e mpresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI)

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