Quando a emoção vence a razão e gera receita
Quando a empresa é pequena, é natural estar próximo ao cliente. Quando a empresa cresce, surgem as dores do crescimento
Publicado em 1 de outubro de 2020 às, 16h14.
Última atualização em 2 de outubro de 2020 às, 19h33.
Há alguns anos eu me tornei corretor de imóveis. Sendo o CEO de uma das principais empresas de tecnologia do setor imobiliário no país, entre os afazeres da companhia, precisei conciliar a formação de corretor, o Curso Técnico de Transações Imobiliárias. Este processo durou em torno de um ano. A razão para tal decisão: empatia.
Este é um tema muito discutido recentemente e possui diferentes definições por diversos autores e estudiosos. Eu gosto de interpretar como a capacidade de entender emocionalmente a outra pessoa. Neste caso, entender emocionalmente o nosso cliente, dado que corretores e imobiliárias são os principais anunciantes de nossos portais imobiliários, ZAP Imóveis e Viva Real.
Quando comuniquei para pessoas próximas esta decisão, o julgamento inicial foi de que seria uma tremenda perda de tempo. Eu queria viver na prática a vida dos corretores. Desde quando pensam em fazer o curso de formação técnica, passando pelas provas e estágios em imobiliárias, até o momento de fechar a transação, assim como fiz.
Se nossa empresa quer ajudá-los, precisamos saber, no detalhe, como aquela pessoa se sente quando usa nosso produto. É muita ousadia oferecermos algum serviço que vai facilitar a vida de um cliente, sem conhecer os desafios pelos quais ele passa.
No mundo de produtos de tecnologia, é um entendimento cada vez mais comum que precisamos estar conectados com os nossos clientes e humanizar as relações. Foi justamente essa abordagem que quis colocar em prática. Esmiuçar a empatia, o aspecto humano. No meu caso, quis entender todas as curiosidades e peculiaridades da vida profissional de um corretor de imóveis.
Quando a empresa é pequena, é natural estar próximo ao cliente. Quando a empresa cresce, surgem as dores do crescimento. E como consequência o CEO é forçado a se desconectar da ponta, já que as dores do crescimento tomam muito tempo do time executivo.
Crescimento gera complexidade: especialização de funções, revisão de processos, protocolos que precisam ser recombinados, cerimônias de alinhamento e comunicação que, por muitos, são erroneamente interpretadas como burocracia ou um "mal necessário". E quanto mais complexa fica a organização, menos inovadora fica a empresa. Se crescimento gera complexidade e complexidade mata o crescimento, estamos em um beco sem saída. Como você pode lidar com isso?
A chave para sair desse enigma está justamente na empatia, em se colocar no papel do cliente. É a melhor forma de mobilizar a organização ao redor das oportunidades reais do mercado. Aqui entra a importância de se ter a genuína empatia, viver as dores e os desafios do seu cliente.
No meu caso, aprendi o que o cliente sentia quando trabalhava. Entendi qual era o estado de humor do cliente quando usava nosso produto. Descobri que certas funcionalidades de nossos produtos, até então consideradas prioritárias por nós, eram distrações para uso de nossas ferramentas no dia-a-dia dos clientes. Muitas outras crenças se provaram erradas. Algumas hipóteses sim foram comprovadas, até reforçadas. Entendi que comunicar adequadamente, pelos diversos canais, com mensagens precisas, é crítico, necessário e nunca suficiente. Com isso revimos prioridades, simplificamos processos complexos e impactamos diretamente nossas taxas de crescimento.
Essa empatia também é a chave da criação de uma relação de confiança com o cliente. Você aprofunda a relação, ela se torna recíproca, mais emocional. Você oferece um serviço que, de verdade, será útil. Que resolve um problema do cliente. Seu cliente sabe que você se importa com isso, se importa com o sucesso do dele. E quando a relação chega a este nível de confiança, seu cliente se torna o seu promotor, o seu defensor. Ele passa a levantar a bandeira do seu produto. Passa a contribuir para o seu sucesso.
O terceiro grande benefício que o exercício da empatia para com seu cliente traz é fomentar a transformação do seu time em organização orientada ao sucesso do cliente. Comportamento é contagioso. Se a liderança não executa o que prega, não adianta esperar que a organização faça o que a liderança diz que tem que ser feito. A melhor maneira de fazer sua equipe atender o cliente com um sorriso no rosto é sorrir primeiro. A melhor maneira de mostrar para a organização que o feedback do cliente é importante para o desenvolvimento do produto é mostrar que a definição da estratégia corporativa levou em consideração recomendações que você, executivo, recebeu diretamente de conversas com seus clientes. A maneira mais eficiente de transformar a cultura da empresa é servindo de modelo da cultura. Nada substitui o exemplo.
Ao longo de anos de crescimento acelerado que gerava complexidade, passamos por momentos de confusão e perda de foco. Investir no exercício da empatia foi sempre uma ferramenta importante para a definição das alavancas de crescimento futuro. Ela nos permitiu refinar o processo de definição do nosso portfólio de produtos, estabelecer uma relação de maior confiança com o cliente e mobilizar a organização para colocar o foco no cliente como prioridade estratégica.
Todas as empresas estão em busca das novas alavancas de crescimento. Um simples exercício de conexão com os clientes pode trazer resultados financeiros surpreendentes.
*Lucas Vargas possui MBA pela Harvard Business School e é formado em Administração de Empresas e Engenharia de Telecomunicações. Em 2016, tornou-se CEO do Viva Real, onde liderou a fusão com o Zap Imóveis. Atualmente, é CEO do Grupo ZAP.