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Não é tão simples entender o impacto das medidas de Trump – nem na economia, nem na opinião pública

Geopoliticamente, as estratégias de Trump apontam para um retrocesso nos esforços de cooperação internacional

WASHINGTON, DC - APRIL 07: U.S. President Donald Trump takes a question from a member of the media during a meeting with Israeli Prime Minister Benjamin Netanyahu in the Oval Office of the White House on April 7, 2025 in Washington, DC. President Trump is meeting with Netanyahu to discuss ongoing efforts to release Israeli hostages from Gaza and newly imposed U.S. tariffs.   Kevin Dietsch/Getty Images/AFP (Photo by Kevin Dietsch / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP) (Kevin Dietsch/AFP)

WASHINGTON, DC - APRIL 07: U.S. President Donald Trump takes a question from a member of the media during a meeting with Israeli Prime Minister Benjamin Netanyahu in the Oval Office of the White House on April 7, 2025 in Washington, DC. President Trump is meeting with Netanyahu to discuss ongoing efforts to release Israeli hostages from Gaza and newly imposed U.S. tariffs. Kevin Dietsch/Getty Images/AFP (Photo by Kevin Dietsch / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP) (Kevin Dietsch/AFP)

Marcos Calliari
Marcos Calliari

CEO da Ipsos no Brasil

Publicado em 27 de abril de 2025 às 06h00.

Não é tão fácil compreender totalmente o impacto das medidas de nacionalismo econômico impostas pela ainda recém-empossada administração de Donald Trump – nem do ponto de vista econômico, nem sob a ótica de percepção da população.

O discurso do governo de querer “acabar com as desvantagens comerciais” sofridas pelos Estados Unidos teve, inicialmente, um forte apoio – em especial de sua base republicana. Contudo, embora as tarifas tenham apelo populista, elas têm se mostrado amplamente impopulares mesmo em solo estadunidense. Em uma pesquisa recente realizada pela Ipsos nos EUA, menos de um terço dos norte-americanos apoiam um regime tarifário generalizado.

Apoio ao governo dos EUA: há muito nas entrelinhas

Essa insatisfação dos cidadãos americanos cria uma fadiga mais profunda na relação do presidente com a população, fato que já se reflete em sua aprovação. Trump tem seu índice de aprovação no nível mais baixo desde seu retorno à Casa Branca, como aponta a mais recente pesquisa Reuters/Ipsos: cerca de 42% dos entrevistados aprovam o desempenho de Trump como presidente – contra 43% na pesquisa realizada três semanas antes, e 47% nas horas após sua posse em 20 de janeiro. Esse é o menor índice de aprovação no marco de 100 dias de governo de um presidente nos EUA nos últimos 70 anos.

Os resultados da pesquisa mostram a população particularmente desconfortável com as medidas do novo presidente e seus esforços para expandir seu poder. As dezenas de ordens executivas feitas nas primeiras semanas, usadas para ampliar sua influência sobre departamentos governamentais e sobre instituições privadas como universidades, por exemplo, tiveram repercussão bastante negativa. A perseguição aos imigrantes, forte bandeira do republicano, e que foi o grande foco inicial da administração trumpista, também gerou críticas. A mesma pesquisa Ipsos/Reuters já mostra uma queda importante na avaliação de como o presidente se sai nas questões de imigração que, mesmo sendo sua área de maior apoio, já não é a maioria: 45% dos entrevistados aprovaram o seu desempenho, mas 46% desaprovaram.

Na onda mais recente do estudo “What Worries the World” da Ipsos, sobre as preocupações dos cidadãos, “Inflação”, com 40% das menções, segue há muitos meses como a mais citada pelos norte-americanos, mas agora é seguida pela preocupação com “Corrupção”, citada por 30% dos entrevistados, e que cresce continuamente desde a posse do novo governo.

Eis que no meio de todo essa turbulência interna, no dia 2 de abril, Trump dá início aos aumentos de tarifas contra seus principais parceiros comerciais – com foco especial contra a China. Desenhava-se aí um cenário de caos e instabilidade, com quedas nas bolsas pelo mundo, idas e vindas das decisões de aumentos por parte de Trump, além, é claro, das medidas de retalhação dos países impactados.

No meio desse bombardeio, a população dos EUA começou a questionar os reais benefícios que tais medidas pragmaticamente poderiam trazer ao país. Outro levantamento Ipsos/Reuters mostra que 59% dos estadunidenses – incluindo um terço dos republicanos – dizem que os EUA estão perdendo a credibilidade no cenário global com as medidas. E os mesmos 59% percebem que a economia do país segue mal.

E entre os brasileiros, como está a avaliação do novo governo americano?

No Brasil, a percepção é igualmente crítica. De acordo com a pesquisa Ipsos-Ipec realizada em abril, quando questionados sobre o impacto geral do governo Trump, 50% dos brasileiros acreditam que as políticas de Trump prejudicam a economia do Brasil. Essa visão é particularmente acentuada entre os eleitores de Lula, alcançando 58%, mas sendo considerada prejudicial ao Brasil por 43% dos eleitores que votaram em Bolsonaro nas últimas eleições.

Aqui, conseguimos observar uma tendência clara de polarização e sociedade dividida que a Ipsos já vem acompanhando nas últimas décadas no tracking Ipsos Global Trends. A forma como as pessoas leem um determinado cenário segue sendo vista pela ótica de um filtro ideológico, que acentua (ou atenua) acontecimentos do momento em que vivemos.

Contudo, como já observamos em outros estudos, assim que os efeitos negativos começam a atingir diretamente as pessoas, esse viés ideológico tende a dar espaço a uma visão mais crítica da situação. E, neste caso específico, o impacto das tarifas já não se restringem apenas aos indicadores econômicos. A perspectiva de uma guerra comercial eleva custos de insumos básicos, desde alimentos até combustíveis, afetando diretamente as prateleiras dos supermercados. Tanto em solo estadunidense como nos países afetados pelos aumentos das tarifas – o que inclui o Brasil.

Geopoliticamente, as estratégias de Trump apontam para um retrocesso nos esforços de cooperação internacional, atingindo inclusive parceiros de longa data como Canadá e México. As reações destes parceiros, bem como da União Europeia e especialmente da China, mostram que este imbróglio ainda tem muitos capítulos pela frente.

Mas, uma coisa é certa: as políticas comerciais adotadas por cada país serão decisivas para entender quão danosas serão as ações de Trump no longo prazo. O apoio da população é também uma variável essencial para a manutenção do rumo – e, hoje, esse apoio se reduz pouco a pouco, mas constantemente nos EUA.

Para o Brasil, a solução requer não apenas observação, mas também ações estratégicas – que podem exigir do governo e das indústrias brasileiras uma aposta ainda maior em diversificação de parceiros comerciais, visando fortalecer o mercado interno, além de adotar uma diplomacia econômica proativa.

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