É hora de apostar no mercado chinês
Uma nova lei abrirá mais o mercado do país para firmas estrangeiras a partir de 2020. É uma ótima oportunidade para os brasileiros
Da Redação
Publicado em 30 de julho de 2019 às 16h17.
Última atualização em 29 de agosto de 2019 às 16h21.
Contam os chineses que, após o falecimento de Mao Tse Tung, o presidente Deng Xiaoping foi visitar uma cidade próxima a Hong Kong, na época colônia da Inglaterra, e de lá pôde avistar a grande quantidade de luzes que emanavam dela à noite. Seria um sinal do nível de desenvolvimento econômico.
Xiaoping teria, então, citado um conhecido provérbio chinês: “não importa se o gato é preto ou amarelo, desde que pegue o rato”. A frase, que na verdade foi ditada durante um discurso de Deng Xiaoping durante a Liga da Juventude Comunista da China, em 1962, era uma crítica ao modelo de produção socialista até então adotado pelo país.
Para Xiaoping, não importava o nome dado ao sistema político, econômico ou ideológico a ser implementado pela China, desde que o resultado almejado fosse alcançado: crescimento e robustez econômica. Dava-se início ao período de abertura econômica da China.
O país, então, planejou quais seriam os passos necessários para alcançar os resultados pretendidos e o Partido Comunista concluiu que a China não deveria reinventar a roda, mas tão somente estudar e replicar o que os países mais desenvolvidos fizeram para se tornarem desenvolvidos.
A Inglaterra havia sido a fábrica do mundo durante a primeira Revolução Industrial; os Estados Unidos foram os credores do mundo no período pós-guerra; e todos os países desenvolvidos, em algum momento, apostaram no desenvolvimento da infraestrutura necessária para manter seus níveis de produção elevados e, assim, atender às demandas internas e, também, às do restante do mundo.
A China, então, seguiu esses mesmos passos e teve resultados econômicos bastante positivos nas décadas seguintes. Mas o custo, assim como naqueles países que hoje são considerados desenvolvidos, foi significativamente elevado, especialmente no campo ambiental. A poluição nas grandes cidades chinesas chegou a níveis alarmantes, muito acima dos limites aceitos pela Organização Mundial da Saúde e semelhantes àqueles níveis experimentados pela Inglaterra da década de 50 (lembra da Great Smog?).
Assim como Deng Xiaoping foi um revisionista do sistema econômico chinês, que proporcionou a abertura econômica do país, Xi Jinping, o atual presidente, é visto como o restaurador da grandeza chinesa, o homem que vai guiar a China na implementação do que ficou conhecido como o Novo Sonho Chinês.
O Sonho é composto de diversas metas, sendo as mais audaciosas a de dobrar o PIB per capita de 2010 até 2020 e a de tornar a China a maior economia do mundo até 2049. A primeira meta foi alcançada já em 2018, quando o PIB per capita chegou em 9.776,35 dólares (em 2010 era 4.560,51 dólares) e a segunda deve ser alcançada 19 anos antes do previsto: o FMI projeta que a economia chinesa deva ultrapassar a dos Estados Unidos, atualmente com o maior PIB do planeta, já em 2030.
Para alcançar estas metas, a China tem investido em reformas políticas e econômicas, sendo a mais recente a revisão da Lei de Investimentos Estrangeiros, aprovada em 15 de março de 2019, durante a Segunda Sessão do 13º Congresso do Partido Comunista. A referida lei entrará em vigor já em janeiro de 2020 e substituirá outras três legislações que tratavam de participações de empresas estrangeiras no mercado chinês (a Sino-Foreign Equity Joint Ventures Law – EVJ, a Sino-foreign Contractual Joint Ventures Law – CJV e a Wholly Foreign Owned Enterprises Law – WFOE).
Com a nova lei, a China passa a dar às empresas investidas por estrangeiros o mesmo tratamento dado às empresas chinesas, desde que o setor de atuação não esteja elencado na Lista Negativa (lista com setores em que o investimento estrangeiro é restrito ou proibido). Trata-se, portanto, de uma clara demonstração do nível de comprometimento do governo chinês para atrair investidores estrangeiros para o país.
Em termos econômicos, a China já tinha características bastante atraentes para os investidores estrangeiros, afinal, trata-se do maior mercado consumidor do mundo, situado em uma região de nítida expansão econômica, como é a Ásia, e com custos operacionais e logísticos significativamente mais baixos que os suportados pelos brasileiros, por exemplo. Não é à toa que algumas empresas brasileiras, como Petrobras, Embraer, Vale, Embraco e Weg já estão por lá há muitos anos. Só em 2017, empresas brasileiras investiram 378 milhões de dólares na China.
De acordo com o relatório de Oportunidades de Comércio e Investimento na China para Setores Selecionados, publicado em 2015 e produzido em cooperação entre o Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) e a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), das 80 empresas brasileiras presentes no mercado chinês àquela época, 64% atuavam no setor de serviços, 21% no setor de manufatura e 15% no de transformação de recursos naturais.
Estes dados são especialmente relevantes quando se percebe que a China caminha para uma nova mudança de paradigma econômico, passando a investir pesado nos setores de inovação e tecnologia. O governo chinês, atento ao movimento global de entrada na chamada “Indústria 4.0”, ou “a quarta revolução industrial”, momento em que a tecnologia vai remodelar o mundo e a forma como vivemos, incluiu no projeto do Novo Sonho a transformação da China em uma potência científica e tecnológica.
A China deve, em breve, deixar de ser a fábrica do mundo, que utiliza mão-de-obra intensiva na fabricação de produtos de pouco valor agregado, para estar na dianteira da nova revolução industrial e, assim, colher os frutos reservados às superpotências. Trata-se de um bom momento para que empresas brasileiras, em especial as ligadas à tecnologia e inovação, invistam no mercado chinês, seja por meio do estabelecimento de unidades de produção no país, seja pela abertura de escritório de representação ou até mesmo pela realização de parcerias (joint ventures) com empresas chinesas.
O que o empresário brasileiro não pode fazer é ignorar o potencial desse mercado, que não para de crescer, afinal, diz o ditado popular, “quem chega primeiro, bebe água limpa”.
* Luiz Filipe Couto Dutra é advogado, sócio da área de direito societário e coordenador do China Desk do escritório Gico, Hadmann & Dutra Advogados. É professor de direito dos contratos do Centro Universitário UniCeub, em Brasília.
Contam os chineses que, após o falecimento de Mao Tse Tung, o presidente Deng Xiaoping foi visitar uma cidade próxima a Hong Kong, na época colônia da Inglaterra, e de lá pôde avistar a grande quantidade de luzes que emanavam dela à noite. Seria um sinal do nível de desenvolvimento econômico.
Xiaoping teria, então, citado um conhecido provérbio chinês: “não importa se o gato é preto ou amarelo, desde que pegue o rato”. A frase, que na verdade foi ditada durante um discurso de Deng Xiaoping durante a Liga da Juventude Comunista da China, em 1962, era uma crítica ao modelo de produção socialista até então adotado pelo país.
Para Xiaoping, não importava o nome dado ao sistema político, econômico ou ideológico a ser implementado pela China, desde que o resultado almejado fosse alcançado: crescimento e robustez econômica. Dava-se início ao período de abertura econômica da China.
O país, então, planejou quais seriam os passos necessários para alcançar os resultados pretendidos e o Partido Comunista concluiu que a China não deveria reinventar a roda, mas tão somente estudar e replicar o que os países mais desenvolvidos fizeram para se tornarem desenvolvidos.
A Inglaterra havia sido a fábrica do mundo durante a primeira Revolução Industrial; os Estados Unidos foram os credores do mundo no período pós-guerra; e todos os países desenvolvidos, em algum momento, apostaram no desenvolvimento da infraestrutura necessária para manter seus níveis de produção elevados e, assim, atender às demandas internas e, também, às do restante do mundo.
A China, então, seguiu esses mesmos passos e teve resultados econômicos bastante positivos nas décadas seguintes. Mas o custo, assim como naqueles países que hoje são considerados desenvolvidos, foi significativamente elevado, especialmente no campo ambiental. A poluição nas grandes cidades chinesas chegou a níveis alarmantes, muito acima dos limites aceitos pela Organização Mundial da Saúde e semelhantes àqueles níveis experimentados pela Inglaterra da década de 50 (lembra da Great Smog?).
Assim como Deng Xiaoping foi um revisionista do sistema econômico chinês, que proporcionou a abertura econômica do país, Xi Jinping, o atual presidente, é visto como o restaurador da grandeza chinesa, o homem que vai guiar a China na implementação do que ficou conhecido como o Novo Sonho Chinês.
O Sonho é composto de diversas metas, sendo as mais audaciosas a de dobrar o PIB per capita de 2010 até 2020 e a de tornar a China a maior economia do mundo até 2049. A primeira meta foi alcançada já em 2018, quando o PIB per capita chegou em 9.776,35 dólares (em 2010 era 4.560,51 dólares) e a segunda deve ser alcançada 19 anos antes do previsto: o FMI projeta que a economia chinesa deva ultrapassar a dos Estados Unidos, atualmente com o maior PIB do planeta, já em 2030.
Para alcançar estas metas, a China tem investido em reformas políticas e econômicas, sendo a mais recente a revisão da Lei de Investimentos Estrangeiros, aprovada em 15 de março de 2019, durante a Segunda Sessão do 13º Congresso do Partido Comunista. A referida lei entrará em vigor já em janeiro de 2020 e substituirá outras três legislações que tratavam de participações de empresas estrangeiras no mercado chinês (a Sino-Foreign Equity Joint Ventures Law – EVJ, a Sino-foreign Contractual Joint Ventures Law – CJV e a Wholly Foreign Owned Enterprises Law – WFOE).
Com a nova lei, a China passa a dar às empresas investidas por estrangeiros o mesmo tratamento dado às empresas chinesas, desde que o setor de atuação não esteja elencado na Lista Negativa (lista com setores em que o investimento estrangeiro é restrito ou proibido). Trata-se, portanto, de uma clara demonstração do nível de comprometimento do governo chinês para atrair investidores estrangeiros para o país.
Em termos econômicos, a China já tinha características bastante atraentes para os investidores estrangeiros, afinal, trata-se do maior mercado consumidor do mundo, situado em uma região de nítida expansão econômica, como é a Ásia, e com custos operacionais e logísticos significativamente mais baixos que os suportados pelos brasileiros, por exemplo. Não é à toa que algumas empresas brasileiras, como Petrobras, Embraer, Vale, Embraco e Weg já estão por lá há muitos anos. Só em 2017, empresas brasileiras investiram 378 milhões de dólares na China.
De acordo com o relatório de Oportunidades de Comércio e Investimento na China para Setores Selecionados, publicado em 2015 e produzido em cooperação entre o Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) e a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), das 80 empresas brasileiras presentes no mercado chinês àquela época, 64% atuavam no setor de serviços, 21% no setor de manufatura e 15% no de transformação de recursos naturais.
Estes dados são especialmente relevantes quando se percebe que a China caminha para uma nova mudança de paradigma econômico, passando a investir pesado nos setores de inovação e tecnologia. O governo chinês, atento ao movimento global de entrada na chamada “Indústria 4.0”, ou “a quarta revolução industrial”, momento em que a tecnologia vai remodelar o mundo e a forma como vivemos, incluiu no projeto do Novo Sonho a transformação da China em uma potência científica e tecnológica.
A China deve, em breve, deixar de ser a fábrica do mundo, que utiliza mão-de-obra intensiva na fabricação de produtos de pouco valor agregado, para estar na dianteira da nova revolução industrial e, assim, colher os frutos reservados às superpotências. Trata-se de um bom momento para que empresas brasileiras, em especial as ligadas à tecnologia e inovação, invistam no mercado chinês, seja por meio do estabelecimento de unidades de produção no país, seja pela abertura de escritório de representação ou até mesmo pela realização de parcerias (joint ventures) com empresas chinesas.
O que o empresário brasileiro não pode fazer é ignorar o potencial desse mercado, que não para de crescer, afinal, diz o ditado popular, “quem chega primeiro, bebe água limpa”.
* Luiz Filipe Couto Dutra é advogado, sócio da área de direito societário e coordenador do China Desk do escritório Gico, Hadmann & Dutra Advogados. É professor de direito dos contratos do Centro Universitário UniCeub, em Brasília.