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Por que Jerry Seinfeld dispensou US$ 25 milhões por Porsche que foi de Steve McQueen

Lenda do automobilismo, 917K quase se tornou carro mais valioso da marca alemã

 (Divulgação/Divulgação)

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Rodrigo Mora
Rodrigo Mora

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Publicado em 25 de janeiro de 2025 às 07h35.

Jerry Seinfeld recusou um lance de US$ 25 milhões por seu Porsche 917K 1969 no último sábado, 18, durante leilão da Mecum Auctions, em Kissimmee, na Flórida, nos Estados Unidos. Teria sido o carro da marca alemã mais caro já vendido, excedendo outros dois 917K leiloados recentemente: um arrematado em 2017 por US$ 14 milhões e outro que a RM Sotheby’s esperava liquidar em 2021 por pelo menos US$ 16 milhões, mas encalhou.

Atração principal do evento, o 917K do comediante chegou escoltado por seguranças e até um xerife. “Pouco antes de o carro entrar, todas as luzes se apagaram e um vídeo foi exibido nos telões, destacando o histórico do carro e a recente restauração”, conta João Siciliano, da Siciliano Company, especializada na importação e exportação de carros entre Brasil e EUA.

“Quando o leilão começou, os lances foram exclusivamente por telefone, com rumores de que o valor esperado seria de US$ 30 milhões. Durante sete minutos intensos, os lances subiram gradativamente. Mas, no final, o público ficou surpreso e incrédulo de que Seinfeld não aceitara os US$ 25 milhões”, relembra.

Dali o 917K foi para uma espécie de repescagem, onde uma nova tentativa de negociação acontece. “Talvez o Seinfeld tenha recusado os US$ 25 milhões como uma estratégia para elevar o valor do carro para um próximo leilão”, considera Siciliano.

Organizador do Circuito de Leilões, José Paulo Parra argumenta que “pode ter sido um teste, ou uma maneira de impulsionar o valor do carro para melhorar uma negociação privada paralela. Ou simplesmente o carro não atingiu de fato o valor de reserva. Quando o proprietário tem poder de fogo e não faz questão de vender, não abaixa. Já tive cliente que foi irredutível por causa de R$ 1.000”.

24 Horas de Le Mans e Hollywood  

Porsche 917K. (Divulgação/Divulgação)

Concebido para disputar o World Sportscar Championship, o 917 foi revelado no Salão de Genebra de 1969, e no mesmo ano venceu a corrida de estreia, os 1.000 km de Zeltweg, na Áustria. Munido de um descomunal motor de 4,5 litros, 12 cilindros e quase 600 cv, “era um verdadeiro pesadelo. A traseira ficava extremamente irregular a 350 km/h e até flutuava se você freasse com muita força. A 380 km/h, tinha que tirar o pé do acelerador", relembra Kurt Ahrens, um dos pilotos de teste do 917.

Foram construídos 65 exemplares, que variavam de carroceria de acordo com a pista da vez. Daí os sobrenomes, como LH, de “langheck”, cauda longa em alemão, e K, de “kurz”, ou curto, como o exemplar de Seinfeld. As ousadias tecnológicas contavam com a aprovação (e estímulo) de Ferdinand Piëch, neto de Ferdinand Porsche e então diretor de engenharia da empresa. No fim da carreira, em meados dos anos 1970, atingiria 1.200 cv.

 Mas a fama e a aura quase sobrenatural vieram por causa das 24 Horas de Le Mans.

 Em 1970, um 917K pilotado por Hans Herrmann e Richard Attwood entregou à Porsche sua primeira de 19 vitórias na corrida mais importante do mundo; no ano seguinte,

Helmut Marko (hoje o chefão da Red Bull na Fórmula 1) e Gijs van Lennep conquistaram o segundo triunfo do 917K na centenária prova de automobilismo. 

Quando saiu Le Mans, filme de 1971 estrelado por Steve McQueen no papel do piloto Michael Delaney, o 917 foi imortalizado através de três carros usados nas filmagens.

Aquele vendido em 2017, chassi número 24, foi usado como carro de teste da Porsche antes de ser vendido ao piloto suíço Jo Siffert, que o alugou para a Solar Productions, a produtora cinematográfica de McQueen. “De acordo com uma extensa pesquisa do famoso historiador Walter Näher, o 917-024 foi utilizado como câmera car durante a produção e também estrelou extensivamente durante o filme. Após sua passagem por Hollywood, permaneceu na coleção particular de Siffert até seu falecimento, tendo liderado seu cortejo fúnebre”, detalha a Gooding & Company, responsável pelo leilão.

O chassi 26, que a RM Sotheby’s não conseguiu vender, foi um dos oito exemplares do 917 a alinharem no grid das 24 Horas de Le Mans de 1970, além de ter “interpretado” o papel de vencedor na corrida do filme, segundo a casa de leilões.

A unidade que agora (ou ainda) pertence a Seinfeld foi comprada por McQueen e pilotada pelo ator no filme, que intercala sequências da corrida real com encenações. Depois do ator, o bólido passou pelas mãos de personalidades do automobilismo até estacionar na garagem do comediante, em 2001.

Morto em novembro de 1980, aos 50 anos, o “King of Cool” ainda exerce fascínio sobre grande parte do público masculino. É como se, ao obter um carro, um relógio ou qualquer item relacionado ao astro, o novo dono automaticamente tomasse um elixir que o levasse a dirigir como McQueen, andar como McQueen, falar como McQueen, seduzir como McQueen, rebelar-se como McQueen. 

Qualquer item que tenha pertencido, ou simplesmente sido tocado pelo ator, multiplica de valor. E quando três lendas – Porsche 917, Le Mans e Steve McQueen – se juntam, o efeito é um carro de corrida que não troca de dono nem por US$ 25 milhões.

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