Política, ajuste e crescimento econômico
Como a instabilidade política afeta o crescimento econômico? Essa pergunta que instiga economistas e cientistas políticos há décadas motivou vasta literatura sobre as relações entre a solidez das instituições de diferentes países e a capacidade dessas economias de florescer, gerando estabilidade macroeconômica, aumentos de produtividade e do investimento, e reduções de desigualdade e da pobreza. […]
Da Redação
Publicado em 1 de julho de 2016 às 14h27.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h12.
Como a instabilidade política afeta o crescimento econômico? Essa pergunta que instiga economistas e cientistas políticos há décadas motivou vasta literatura sobre as relações entre a solidez das instituições de diferentes países e a capacidade dessas economias de florescer, gerando estabilidade macroeconômica, aumentos de produtividade e do investimento, e reduções de desigualdade e da pobreza. Os resultados não são uniformes. Em alguns estudos, há fortes evidências de que a instabilidade política causa uma redução do crescimento econômico. Em outros, a relação parece não existir. Parte do problema é a definição de “instabilidade política”.
O que é “instabilidade política”? Para quem vive no Brasil, hoje, a definição parece clara, estampada todos os dias nas páginas dos jornais. Alberto Alesina, renomado economista reconhecido por seus estudos sobre as relações entre política, instituições e economia, define a instabilidade política como a propensão para o colapso de um governo, isto é, as chances de que as lideranças de um país não consigam cumprir seus mandatos, seja porque há um golpe em regimes nos quais a democracia é imperfeita ou inexistente, ou uma perda constitucional de liderança política– impeachment no presidencialismo, votos de confiança no parlamentarismo – naqueles casos em que as democracias são mais maduras. Ao analisar, em 1992, a relação entre a instabilidade definida desse modo e o crescimento econômico, Alesina e seus coautores mostraram que em países e períodos com alta propensão de colapso dos governos, o crescimento é significativamente mais baixo. O efeito permanece mesmo quando a definição de instabilidade política é atenuada para mudanças de governo que não vêm acompanhadas de abruptas rupturas ideológicas. Ao longo dos anos posteriores, outros pesquisadores encontraram resultados semelhantes a partir dessa definição de instabilidade política.
O Brasil encaixa-se como uma luva no que diz a literatura acadêmica sobre o tema. Não é de hoje que assistimos economistas, cientistas políticos, jornalistas alertarem para as incertezas associadas à instabilidade política, e como essas incertezas abalam o investimento, o consumo, os pilares do crescimento econômico. Não bastasse isso, estamos também a testemunhar como a instabilidade política prejudica a capacidade de que governos consigam implantar os ajustes necessários para que a economia volte a crescer. O primeiro ano do segundo mandato de Dilma Rousseff mostrou a dificuldade de modo inequívoco. A interinidade de Michel Temer está a desvelar a mesma coisa. Embora o presidente em exercício e sua equipe econômica tenham prometido restaurar a sustentabilidade fiscal e a solvência das contas públicas com medidas como a adoção de teto para o crescimento dos gastos, reforma da previdência, entre outros anúncios, o cotidiano tem revelado algo muito diferente. Perguntada outro dia por jornalista estrangeiro perplexo onde estava a austeridade prometida, respondi: perdeu-se em meio às demandas políticas, como não poderia deixar de ser. Os mercados preferiram tirar férias da realidade até que o impeachment se resolva, mas os fatos inconvenientes são que, até agora, o governo Temer foi bem-sucedido apenas em gerar maiores custos para si. Estão aí a renegociação demasiadamente apressada das dívidas dos Estados, o aumento dos servidores públicos, e outros aumentos de gastos no curtíssimo prazo para mostrar que o que temos, por ora, é tentativa de comprar o ajuste de médio prazo piorando o quadro fiscal no curto prazo. Tal estratégia, reflexo da instabilidade política, não é alvissareira para o que virá após o impeachment. Por certo, a complacência do mercado brasileiro e dos analistas está com os dias contados.
O Brasil é emblemático do que pode vir a ocorrer no Reino Unido e sua atrapalhada decisão de deixar a União Europeia. Como nos trópicos, a instabilidade política tomou conta da ilha da rainha. O partido conservador está rachado, o Labour Party está rachado. Boris Johnson, ex-prefeito de Londres, um dos principais proponentes da campanha de saída da UE, e político mais cotado para assumir o cargo de David Cameron, anunciou que não pretende concorrer à vaga de primeiro-ministro. O vácuo político é inequívoco. As consequências econômicas, a julgar pelos estudos empíricos e pela experiência brasileira, não serão nada boas para o Reino Unido.
“O problema do suicídio político é que você sobrevive para dele se arrepender”, disse Winston Churchill. Brasil e Reino Unido estão juntos nesse barco, à deriva.
Como a instabilidade política afeta o crescimento econômico? Essa pergunta que instiga economistas e cientistas políticos há décadas motivou vasta literatura sobre as relações entre a solidez das instituições de diferentes países e a capacidade dessas economias de florescer, gerando estabilidade macroeconômica, aumentos de produtividade e do investimento, e reduções de desigualdade e da pobreza. Os resultados não são uniformes. Em alguns estudos, há fortes evidências de que a instabilidade política causa uma redução do crescimento econômico. Em outros, a relação parece não existir. Parte do problema é a definição de “instabilidade política”.
O que é “instabilidade política”? Para quem vive no Brasil, hoje, a definição parece clara, estampada todos os dias nas páginas dos jornais. Alberto Alesina, renomado economista reconhecido por seus estudos sobre as relações entre política, instituições e economia, define a instabilidade política como a propensão para o colapso de um governo, isto é, as chances de que as lideranças de um país não consigam cumprir seus mandatos, seja porque há um golpe em regimes nos quais a democracia é imperfeita ou inexistente, ou uma perda constitucional de liderança política– impeachment no presidencialismo, votos de confiança no parlamentarismo – naqueles casos em que as democracias são mais maduras. Ao analisar, em 1992, a relação entre a instabilidade definida desse modo e o crescimento econômico, Alesina e seus coautores mostraram que em países e períodos com alta propensão de colapso dos governos, o crescimento é significativamente mais baixo. O efeito permanece mesmo quando a definição de instabilidade política é atenuada para mudanças de governo que não vêm acompanhadas de abruptas rupturas ideológicas. Ao longo dos anos posteriores, outros pesquisadores encontraram resultados semelhantes a partir dessa definição de instabilidade política.
O Brasil encaixa-se como uma luva no que diz a literatura acadêmica sobre o tema. Não é de hoje que assistimos economistas, cientistas políticos, jornalistas alertarem para as incertezas associadas à instabilidade política, e como essas incertezas abalam o investimento, o consumo, os pilares do crescimento econômico. Não bastasse isso, estamos também a testemunhar como a instabilidade política prejudica a capacidade de que governos consigam implantar os ajustes necessários para que a economia volte a crescer. O primeiro ano do segundo mandato de Dilma Rousseff mostrou a dificuldade de modo inequívoco. A interinidade de Michel Temer está a desvelar a mesma coisa. Embora o presidente em exercício e sua equipe econômica tenham prometido restaurar a sustentabilidade fiscal e a solvência das contas públicas com medidas como a adoção de teto para o crescimento dos gastos, reforma da previdência, entre outros anúncios, o cotidiano tem revelado algo muito diferente. Perguntada outro dia por jornalista estrangeiro perplexo onde estava a austeridade prometida, respondi: perdeu-se em meio às demandas políticas, como não poderia deixar de ser. Os mercados preferiram tirar férias da realidade até que o impeachment se resolva, mas os fatos inconvenientes são que, até agora, o governo Temer foi bem-sucedido apenas em gerar maiores custos para si. Estão aí a renegociação demasiadamente apressada das dívidas dos Estados, o aumento dos servidores públicos, e outros aumentos de gastos no curtíssimo prazo para mostrar que o que temos, por ora, é tentativa de comprar o ajuste de médio prazo piorando o quadro fiscal no curto prazo. Tal estratégia, reflexo da instabilidade política, não é alvissareira para o que virá após o impeachment. Por certo, a complacência do mercado brasileiro e dos analistas está com os dias contados.
O Brasil é emblemático do que pode vir a ocorrer no Reino Unido e sua atrapalhada decisão de deixar a União Europeia. Como nos trópicos, a instabilidade política tomou conta da ilha da rainha. O partido conservador está rachado, o Labour Party está rachado. Boris Johnson, ex-prefeito de Londres, um dos principais proponentes da campanha de saída da UE, e político mais cotado para assumir o cargo de David Cameron, anunciou que não pretende concorrer à vaga de primeiro-ministro. O vácuo político é inequívoco. As consequências econômicas, a julgar pelos estudos empíricos e pela experiência brasileira, não serão nada boas para o Reino Unido.
“O problema do suicídio político é que você sobrevive para dele se arrepender”, disse Winston Churchill. Brasil e Reino Unido estão juntos nesse barco, à deriva.