De grão em grão: a política de redução de juros do BC
Reza o ditado que de grão em grão, a galinha enche o papo. Mas, e se não for assim? E se, de grão em grão, a galinha esquálida morrer de inanição? Eis o dilema que confronta o Banco Central com sua política de redução de juros a conta-gotas ante o estado de calamidade da economia […]
Da Redação
Publicado em 2 de dezembro de 2016 às 10h41.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h08.
Reza o ditado que de grão em grão, a galinha enche o papo. Mas, e se não for assim? E se, de grão em grão, a galinha esquálida morrer de inanição? Eis o dilema que confronta o Banco Central com sua política de redução de juros a conta-gotas ante o estado de calamidade da economia brasileira.
Soubemos essa semana que o PIB do terceiro trimestre caiu 0,8% em relação ao segundo trimestre, ou 4,4% no acumulado de quatro trimestres – a medida mais apropriada para parametrizar o estado da economia brasileira. O resultado divulgado pelo IBGE mostra nítido aprofundamento da recessão no terceiro trimestre de 2016, quando comparado ao desempenho da economia na primeira metade desse ano. Da demanda doméstica, nada sobrou: todos os itens sofreram quedas pelo sexto trimestre consecutivo.
O consumo das famílias, no acumulado de quatro trimestres, caiu 5,2%, o mesmo consumo das famílias que responde por mais de 60% do PIB brasileiro. O investimento teve queda de 13,5%, levando a taxa de investimento – a razão entre investimento e PIB – para minguados 16,5%. Se tais números não caracterizam PIB esquálido, não é possível saber o que o faria sê-lo.
O PIB esquálido, moribundo, tem sido a principal força motriz para a queda da inflação. Em doze meses, a variação dos preços continua bem acima do teto do regime de metas, mas claramente há uma tendência de queda que não será interrompida haja vista o estado lastimável da economia brasileira. Não será interrompida nem mesmo com a desvalorização mais acentuada do câmbio, que reage ao fôlego renovado da crise política, e às incertezas a respeito da política econômica de Donald Trump. Contudo, o Banco Central brasileiro, na retranca mais retranqueira, preferiu continuar a reduzir a taxa de juros em ritmo de pangaré. De 14,25% para 14% e agora para 13,75%.
É verdade que a Selic não reflete adequadamente o custo da dívida das empresas, abarrotadas de obrigações financeiras que as impede de investir. É também verdade que, faça o Banco Central o que fizer com os juros, o consumo das famílias não haverá de voltar tão cedo, dada a situação para lá de ruim do mercado de trabalho. No entanto, como tenho insistido há vários meses – seis, para ser mais exata, desde que o governo Temer assumiu as rédeas do País – a situação econômica é tão grave, tão fora de qualquer padrão histórico, que qualquer argumento para a cautela do BC ante a inflação ainda elevada, porém em queda inabalável, desmorona. Não se trata de defender a queda dos juros por razões “heterodoxas”, mas de fazê-lo como forma de evitar a aprofundamento ainda mais agudo da pior recessão que o País já sofreu.
Diz o BC no comunicado que seguiu a decisão de reduzir a Selic em 25 pontos base que “o possível fim do interregno benigno para as economias emergentes pode dificultar o processo de desinflação”, que “os sinais de pausa no processo de desinflação de alguns componentes do IPCA mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária persistem, o que pode sinalizar convergência mais lenta da inflação à meta”, e que “o processo de aprovação e implementação das reformas e ajustes necessários na economia é longo e envolve incertezas”. O primeiro ponto trata das novas incertezas que surgiram, inclusive com a eleição de donald Trump; o segundo, de características já conhecidas de nosso processo inflacionário – a inflação brasileira sempre foi mais resistente do que “o esperado” pelos modelos utilizados.
Tanto um, quanto outro, não condizem com a constatação do BC de que “as projeções de inflação de 2016, nos cenários de referência e mercado”, recuaram”, tampouco com a observação de que “as projeções para 2017 nos cenários de referência e mercado, situam-se em torno de 4,4% e 4,7%, respectivamente”, isto é, bem próximas da meta de 4,5%. Quanto ao terceiro ponto, o “processo longo de reformas que envolve incertezas”, trata-se de truísmo que não merece comentários.
Portanto, assim estamos. Com um governo que se vê cada vez mais asfixiado pelos escândalos que estouram à sua volta, com uma crise política e institucional que voltaram a ditar os rumos da economia, com reformas fiscais que, se aprovadas, não terão efeitos imediatos sobre o crescimento, com um Banco Central que ainda tateia as paredes sem saber muito bem qual o seu papel.
De grão em grão, a galinha morre de inanição. Acho que devemos mudar o ditado.
Reza o ditado que de grão em grão, a galinha enche o papo. Mas, e se não for assim? E se, de grão em grão, a galinha esquálida morrer de inanição? Eis o dilema que confronta o Banco Central com sua política de redução de juros a conta-gotas ante o estado de calamidade da economia brasileira.
Soubemos essa semana que o PIB do terceiro trimestre caiu 0,8% em relação ao segundo trimestre, ou 4,4% no acumulado de quatro trimestres – a medida mais apropriada para parametrizar o estado da economia brasileira. O resultado divulgado pelo IBGE mostra nítido aprofundamento da recessão no terceiro trimestre de 2016, quando comparado ao desempenho da economia na primeira metade desse ano. Da demanda doméstica, nada sobrou: todos os itens sofreram quedas pelo sexto trimestre consecutivo.
O consumo das famílias, no acumulado de quatro trimestres, caiu 5,2%, o mesmo consumo das famílias que responde por mais de 60% do PIB brasileiro. O investimento teve queda de 13,5%, levando a taxa de investimento – a razão entre investimento e PIB – para minguados 16,5%. Se tais números não caracterizam PIB esquálido, não é possível saber o que o faria sê-lo.
O PIB esquálido, moribundo, tem sido a principal força motriz para a queda da inflação. Em doze meses, a variação dos preços continua bem acima do teto do regime de metas, mas claramente há uma tendência de queda que não será interrompida haja vista o estado lastimável da economia brasileira. Não será interrompida nem mesmo com a desvalorização mais acentuada do câmbio, que reage ao fôlego renovado da crise política, e às incertezas a respeito da política econômica de Donald Trump. Contudo, o Banco Central brasileiro, na retranca mais retranqueira, preferiu continuar a reduzir a taxa de juros em ritmo de pangaré. De 14,25% para 14% e agora para 13,75%.
É verdade que a Selic não reflete adequadamente o custo da dívida das empresas, abarrotadas de obrigações financeiras que as impede de investir. É também verdade que, faça o Banco Central o que fizer com os juros, o consumo das famílias não haverá de voltar tão cedo, dada a situação para lá de ruim do mercado de trabalho. No entanto, como tenho insistido há vários meses – seis, para ser mais exata, desde que o governo Temer assumiu as rédeas do País – a situação econômica é tão grave, tão fora de qualquer padrão histórico, que qualquer argumento para a cautela do BC ante a inflação ainda elevada, porém em queda inabalável, desmorona. Não se trata de defender a queda dos juros por razões “heterodoxas”, mas de fazê-lo como forma de evitar a aprofundamento ainda mais agudo da pior recessão que o País já sofreu.
Diz o BC no comunicado que seguiu a decisão de reduzir a Selic em 25 pontos base que “o possível fim do interregno benigno para as economias emergentes pode dificultar o processo de desinflação”, que “os sinais de pausa no processo de desinflação de alguns componentes do IPCA mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária persistem, o que pode sinalizar convergência mais lenta da inflação à meta”, e que “o processo de aprovação e implementação das reformas e ajustes necessários na economia é longo e envolve incertezas”. O primeiro ponto trata das novas incertezas que surgiram, inclusive com a eleição de donald Trump; o segundo, de características já conhecidas de nosso processo inflacionário – a inflação brasileira sempre foi mais resistente do que “o esperado” pelos modelos utilizados.
Tanto um, quanto outro, não condizem com a constatação do BC de que “as projeções de inflação de 2016, nos cenários de referência e mercado”, recuaram”, tampouco com a observação de que “as projeções para 2017 nos cenários de referência e mercado, situam-se em torno de 4,4% e 4,7%, respectivamente”, isto é, bem próximas da meta de 4,5%. Quanto ao terceiro ponto, o “processo longo de reformas que envolve incertezas”, trata-se de truísmo que não merece comentários.
Portanto, assim estamos. Com um governo que se vê cada vez mais asfixiado pelos escândalos que estouram à sua volta, com uma crise política e institucional que voltaram a ditar os rumos da economia, com reformas fiscais que, se aprovadas, não terão efeitos imediatos sobre o crescimento, com um Banco Central que ainda tateia as paredes sem saber muito bem qual o seu papel.
De grão em grão, a galinha morre de inanição. Acho que devemos mudar o ditado.