Exame Logo

Vilão mundial, Putin tem admiradores à esquerda e à direita

O presidente russo recebe apoio velado e discreto nas redes

Vladimir Putin: "unidades militares que participaram das hostilidades ativas alcançaram o sucesso" (Sergei GUNEYEV / Sputnik/AFP)
DR

Da Redação

Publicado em 2 de março de 2022 às 14h03.

Aluizio Falcão Filho

O inimigo do meu inimigo é meu amigo. Quantas vezes não ouvimos essa frase? No lamentável episódio da invasão da Ucrânia, no entanto, essa lógica foi levada a extremos nunca vistos. Alguns extremistas de esquerda enxergaram no ataque de Vladimir Putin uma reação legítima à iniciativa de se colocar mísseis ao lado da Rússia. Outros indivíduos, colocados no lado oposto do espectro ideológico, acharam que a invasão só ocorreu porque Joe Biden é um presidente fraco. A unir esses dois extremos está a defesa (discreta ou explícita) de Putin e do estilo KGB de governar.

No ambiente online, houve uma saraivada de posts. O Partido da Causa Operária, por exemplo, defendeu a sanha expansionista e belicosa de Putin e escreveu em sua conta do Twitter: “Todo apoio à Rússia! Fora o imperialismo da Ucrânia!”. Mais explícito, impossível. O partido comunista português foi na mesma linha e responsabilizou os ucranianos por “constantes violações do cessar-fogo” e “sucessivas provocações”.

Quase que imediatamente após essa postagem, uma foto com três transsexuais começou a circular. Na legenda da imagem, a informação era a de que se tratava do Alto Comando Militar de Biden (um fake constrangedor – tanto que um dos representantes Força Aérea possuía a insígnia equivalente à de um cabo de Exército). Simultaneamente, uma ilustração com várias mulheres que ocupam o cargo de Ministra da Defesa de diversas nações era apresentada em contraposição ao um carrancudo titular desta pasta na Rússia. A ideia, claramente, era mostrar que os russos estariam melhor aparelhados para uma guerra, pois contavam com um homem mal-encarado no comando de suas Forças Armadas.

Sites conservadores

Artigos em sites conservadores surgiram para creditar aos democratas a invasão da Ucrânia, dadas as posições molengas de Bill Clinton, Barack Obama e do próprio Biden. Mas, convenientemente, esqueceram de George W. Bush, que engoliu a invasão do mesmo Putin à Georgia, onde até hoje tem duas grandes regiões com presença militar do antigo Exército Vermelho (em 2008, europeus e Estados Unidos negociaram um cessar fogo, mas a Rússia permaneceu ocupando as regiões da Ossétia do Sul e da Abecásia).

Putin desistiria da invasão se o presidente americano fosse Donald Trump? Se a OTAN e os EUA tivessem, sob Trump, insistido em colocar mísseis na Ucrânia, o presidente russo provavelmente agiria da mesma forma. Putin tem duas motivações: resgatar a importância mundial que a Rússia desfrutou quando era União Soviética e evitar que se colocasse uma bateria de poderio militar em seu quintal. A invasão da Ucrânia atende a esses dois motivos. Mas, se a OTAN não tivesse insistido em suas intenções armamentistas, talvez o conflito não fosse deflagrado neste momento.

Percebe-se também que Joe Biden é criticado pelos mais conservadores por lançar mão apenas de sanções econômicas. Ocorre que, desta vez, as medidas foram duríssimas, de uma forma nunca vista antes. Houve congelamento de reservas, banimento do país do sistema Swift de compensações internacionais e proibição de voos de companhias russas. Além disso, muitas multinacionais anunciaram que estavam de saída da Rússia – e a onda de cancelamentos chegou até ao esporte (dirigentes russos de times europeus foram forçados a renunciar e o Grande Prêmio de Sochi de Fórmula 1 foi cancelado; a equipe Haas, que era patrocinada por uma empresa russa e tinha um piloto da mesma nacionalidade, renunciou ao patrocínio e suspendeu o esportista).

Jogos de Guerra

Diante de ações tão severas, não se pode creditar fraqueza ao presidente americano. Fragilidade teria ocorrido se as medidas adotadas fossem as de praxe, como bloqueios econômicos que não funcionam ou reprimendas inofensivas nos organismos multilaterais. O que se produziu, no entanto, foi um “corner” econômico inédito. O intuito é sufocar o invasor. Os efeitos já começam a ser vistos. O dólar está em escassez no país e o rublo começa a faltar nos caixas eletrônicos. Os juros dispararam. Mas, apesar disso, o risco de um inflação crescente no país é alto. Qual é ameaça que paira sobre as economias europeias e a dos Estados Unidos em particular? Pode haver um efeito dominó a partir do default russo, o que seria um tiro no pé do Ocidente.

Putin irá sucumbir às pressões dos empresários ou irá dobrar sua aposta? O russo vem insinuando que poderia utilizar armas nucleares para acabar com o conflito. Biden não acredita nisso. “Americanos não devem temer guerra nuclear”, disse o presidente americano. Apertar o botão vermelho seria uma insanidade, pois levaria boa parte do planeta à devastação total. Como se viu no filme “Jogos de Guerra”, uma disputa dessas não tem vencedor. A frase de Joshua, o computador encarregado de gerenciar as armas nucleares americanas nesta película, é lapidar: “Que jogo estranho… A única jogada vencedora é não jogar”.

Veja também

Aluizio Falcão Filho

O inimigo do meu inimigo é meu amigo. Quantas vezes não ouvimos essa frase? No lamentável episódio da invasão da Ucrânia, no entanto, essa lógica foi levada a extremos nunca vistos. Alguns extremistas de esquerda enxergaram no ataque de Vladimir Putin uma reação legítima à iniciativa de se colocar mísseis ao lado da Rússia. Outros indivíduos, colocados no lado oposto do espectro ideológico, acharam que a invasão só ocorreu porque Joe Biden é um presidente fraco. A unir esses dois extremos está a defesa (discreta ou explícita) de Putin e do estilo KGB de governar.

No ambiente online, houve uma saraivada de posts. O Partido da Causa Operária, por exemplo, defendeu a sanha expansionista e belicosa de Putin e escreveu em sua conta do Twitter: “Todo apoio à Rússia! Fora o imperialismo da Ucrânia!”. Mais explícito, impossível. O partido comunista português foi na mesma linha e responsabilizou os ucranianos por “constantes violações do cessar-fogo” e “sucessivas provocações”.

Quase que imediatamente após essa postagem, uma foto com três transsexuais começou a circular. Na legenda da imagem, a informação era a de que se tratava do Alto Comando Militar de Biden (um fake constrangedor – tanto que um dos representantes Força Aérea possuía a insígnia equivalente à de um cabo de Exército). Simultaneamente, uma ilustração com várias mulheres que ocupam o cargo de Ministra da Defesa de diversas nações era apresentada em contraposição ao um carrancudo titular desta pasta na Rússia. A ideia, claramente, era mostrar que os russos estariam melhor aparelhados para uma guerra, pois contavam com um homem mal-encarado no comando de suas Forças Armadas.

Sites conservadores

Artigos em sites conservadores surgiram para creditar aos democratas a invasão da Ucrânia, dadas as posições molengas de Bill Clinton, Barack Obama e do próprio Biden. Mas, convenientemente, esqueceram de George W. Bush, que engoliu a invasão do mesmo Putin à Georgia, onde até hoje tem duas grandes regiões com presença militar do antigo Exército Vermelho (em 2008, europeus e Estados Unidos negociaram um cessar fogo, mas a Rússia permaneceu ocupando as regiões da Ossétia do Sul e da Abecásia).

Putin desistiria da invasão se o presidente americano fosse Donald Trump? Se a OTAN e os EUA tivessem, sob Trump, insistido em colocar mísseis na Ucrânia, o presidente russo provavelmente agiria da mesma forma. Putin tem duas motivações: resgatar a importância mundial que a Rússia desfrutou quando era União Soviética e evitar que se colocasse uma bateria de poderio militar em seu quintal. A invasão da Ucrânia atende a esses dois motivos. Mas, se a OTAN não tivesse insistido em suas intenções armamentistas, talvez o conflito não fosse deflagrado neste momento.

Percebe-se também que Joe Biden é criticado pelos mais conservadores por lançar mão apenas de sanções econômicas. Ocorre que, desta vez, as medidas foram duríssimas, de uma forma nunca vista antes. Houve congelamento de reservas, banimento do país do sistema Swift de compensações internacionais e proibição de voos de companhias russas. Além disso, muitas multinacionais anunciaram que estavam de saída da Rússia – e a onda de cancelamentos chegou até ao esporte (dirigentes russos de times europeus foram forçados a renunciar e o Grande Prêmio de Sochi de Fórmula 1 foi cancelado; a equipe Haas, que era patrocinada por uma empresa russa e tinha um piloto da mesma nacionalidade, renunciou ao patrocínio e suspendeu o esportista).

Jogos de Guerra

Diante de ações tão severas, não se pode creditar fraqueza ao presidente americano. Fragilidade teria ocorrido se as medidas adotadas fossem as de praxe, como bloqueios econômicos que não funcionam ou reprimendas inofensivas nos organismos multilaterais. O que se produziu, no entanto, foi um “corner” econômico inédito. O intuito é sufocar o invasor. Os efeitos já começam a ser vistos. O dólar está em escassez no país e o rublo começa a faltar nos caixas eletrônicos. Os juros dispararam. Mas, apesar disso, o risco de um inflação crescente no país é alto. Qual é ameaça que paira sobre as economias europeias e a dos Estados Unidos em particular? Pode haver um efeito dominó a partir do default russo, o que seria um tiro no pé do Ocidente.

Putin irá sucumbir às pressões dos empresários ou irá dobrar sua aposta? O russo vem insinuando que poderia utilizar armas nucleares para acabar com o conflito. Biden não acredita nisso. “Americanos não devem temer guerra nuclear”, disse o presidente americano. Apertar o botão vermelho seria uma insanidade, pois levaria boa parte do planeta à devastação total. Como se viu no filme “Jogos de Guerra”, uma disputa dessas não tem vencedor. A frase de Joshua, o computador encarregado de gerenciar as armas nucleares americanas nesta película, é lapidar: “Que jogo estranho… A única jogada vencedora é não jogar”.

Acompanhe tudo sobre:GuerrasJoe BidenOtanRússiaUcrâniaVladimir Putin

Mais lidas

exame no whatsapp

Receba as noticias da Exame no seu WhatsApp

Inscreva-se