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Todos são iguais ou é possível classificar as pessoas?

As pessoas que costumam de dividir o mundo em categorias escolhem parâmetros que têm a ver com aquilo que, no fundo, é importante para elas

(Getty Images/Getty Images)
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Bibiana Guaraldi

Publicado em 18 de fevereiro de 2021 às 08h26.

Muitos anos atrás, em uma reunião de trabalho, ouvi uma proposta muito ruim. Meu advisor na época, o economista Luís Paulo Rosenberg, nem esperou que eu respondesse e já foi negando a oferta. “De jeito nenhum”, disse ele. “O mundo é dividido entre quem aceita e quem não aceita propostas indecorosas. E essa proposta é indecente”.

Naquele dia, ao sair do escritório de Rosenberg, pensei em duas coisas. Primeiro, refleti sobre minha frustração. Afinal, já tinha passado por um mês de negociações e nada havia sido resolvido (haveria um desfecho para este negócio em particular três semanas depois da reunião desalentadora). Depois, fiquei intrigado com a categoria que Rosenberg havia escolhido para dividir as pessoas.

Entre o escritório do advisor e minha casa, fiquei pensando em como eu dividiria as pessoas do mundo. Encontrei inúmeras categorias, das mais sérias (intelectuais e incultos, por exemplo) até as mais esdrúxulas (quem pausa as palmas durante o “parabéns a você” e quem mantém o ritmo até o final). Mas não consegui encontrar uma forma cabal de diferenciar os indivíduos e classificá-los por categorias.

Ontem à noite, no entanto, relembrei o episódio com Rosenberg por conta de uma discussão que presenciei nas redes sociais. Numa determinada plataforma, havia um debate sobre o politicamente correto. Para variar, uns detonando, outros defendendo e ninguém concordando com ninguém. A grande maioria das pessoas, no entanto, só assistia o debate e não se atrevia a manifestar suas opiniões. Foi aí que pensei: nas redes sociais, há dois tipos de participante, os que manifestam suas opiniões e aqueles que ficam em silêncio.

Entre comunistas e liberais ou conservadores e progressistas, há sempre aqueles que se jogam em uma batalha digital e acabam entretendo o outro grupo – o dos silenciosos. Mas por que eu encontrei, finalmente, uma forma plena de dividir a humanidade entre dois grupos? A razão é simples: porque as redes sociais têm, hoje, uma importância enorme para mim.

Não estou sozinho. Muitos, como eu, se informam e se divertem através das várias plataformas que estão à disposição. Passo boa parte de meu dia lendo posts, checando informações ou filtrando opiniões. É possível afirmar que gasto tanto tempo nas redes quanto na leitura dos veículos tradicionais, portais, livros e artigos.

Percebi, então, que as pessoas que costumam dividir o mundo em categorias escolhem parâmetros que têm a ver com aquilo que, no fundo, é importante para elas – e, às vezes, essa leitura não é tão óbvia. Tenho um amigo, por exemplo, que é um grande pensador e deve ter lido uma quantidade de livros muito superior à da média dos seres humanos normais. Para ele, seria natural utilizar a cultura como parâmetro para classificar os tipos de gente existente no mundo. Porém, ele é uma pessoa obcecada por elegância – e aqui não estamos falando de moda e sim de educação, porte ou altivez. É essa a régua que ele geralmente utiliza para classificar os espécimes da raça humana.

Há igualmente um contingente enorme que se preocupa em demasia com o peso alheio. Esse grupo decompõe a humanidade entre gordos e magros. Geralmente são pessoas magras ou que emagreceram momentaneamente que fazem comentários sobre a gordura dos outros. Mas os rechonchudos também podem adotar este tipo de divisão e, às vezes, incorrer em estereótipos para defender teses esdrúxulas. O escritor Nelson Rodrigues, que vivia às turras com a balança, fazia pouco dos esquálidos e era até ofensivo em suas opiniões. Na série “A Vida como Ela É…”, Rodrigues volta e meia escrevia a mesma frase em suas crônicas: “todo canalha é magro”. Características físicas, por sinal, são exemplos utilizadíssimos para se categorizar os indivíduos – a altura é uma delas. “Fulano é alto” ou “Sicrano é baixinho” são frases que escutamos adoidado ao longo de nossas vidas.

No mundo corporativo, temos pessoas obcecadas por sucesso ou por dinheiro. É bastante comum encontrar executivos e empresários que dividem as pessoas entre “winners” e “losers” exatamente como se estivessem em um filme americano de adolescentes. Ou que calibram o respeito aos outros de acordo com o dinheiro acumulado pelos interlocutores.

Curiosamente, quem é muito rico ou obteve grande sucesso na carreira geralmente não tem uma visão tão estreita sobre as pessoas. Esses indivíduos, que hoje não têm de provar nada a ninguém, apreciam os demais em relação àquilo que eles têm a oferecer de bom. Isso vale para uma conversa com um mecânico ou um sommelier, passando por um CEO internacional ou um economista estrangeiro. Não importa a origem, cultura, peso, altura ou grau de elegância. Salvo raríssimas exceções, todos indivíduos têm algo interessante a oferecer em uma conversa. E esse lado relevante geralmente surge quando nos despimos de preconceitos – ou desistimos de classificar mentalmente as outras pessoas.

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Muitos anos atrás, em uma reunião de trabalho, ouvi uma proposta muito ruim. Meu advisor na época, o economista Luís Paulo Rosenberg, nem esperou que eu respondesse e já foi negando a oferta. “De jeito nenhum”, disse ele. “O mundo é dividido entre quem aceita e quem não aceita propostas indecorosas. E essa proposta é indecente”.

Naquele dia, ao sair do escritório de Rosenberg, pensei em duas coisas. Primeiro, refleti sobre minha frustração. Afinal, já tinha passado por um mês de negociações e nada havia sido resolvido (haveria um desfecho para este negócio em particular três semanas depois da reunião desalentadora). Depois, fiquei intrigado com a categoria que Rosenberg havia escolhido para dividir as pessoas.

Entre o escritório do advisor e minha casa, fiquei pensando em como eu dividiria as pessoas do mundo. Encontrei inúmeras categorias, das mais sérias (intelectuais e incultos, por exemplo) até as mais esdrúxulas (quem pausa as palmas durante o “parabéns a você” e quem mantém o ritmo até o final). Mas não consegui encontrar uma forma cabal de diferenciar os indivíduos e classificá-los por categorias.

Ontem à noite, no entanto, relembrei o episódio com Rosenberg por conta de uma discussão que presenciei nas redes sociais. Numa determinada plataforma, havia um debate sobre o politicamente correto. Para variar, uns detonando, outros defendendo e ninguém concordando com ninguém. A grande maioria das pessoas, no entanto, só assistia o debate e não se atrevia a manifestar suas opiniões. Foi aí que pensei: nas redes sociais, há dois tipos de participante, os que manifestam suas opiniões e aqueles que ficam em silêncio.

Entre comunistas e liberais ou conservadores e progressistas, há sempre aqueles que se jogam em uma batalha digital e acabam entretendo o outro grupo – o dos silenciosos. Mas por que eu encontrei, finalmente, uma forma plena de dividir a humanidade entre dois grupos? A razão é simples: porque as redes sociais têm, hoje, uma importância enorme para mim.

Não estou sozinho. Muitos, como eu, se informam e se divertem através das várias plataformas que estão à disposição. Passo boa parte de meu dia lendo posts, checando informações ou filtrando opiniões. É possível afirmar que gasto tanto tempo nas redes quanto na leitura dos veículos tradicionais, portais, livros e artigos.

Percebi, então, que as pessoas que costumam dividir o mundo em categorias escolhem parâmetros que têm a ver com aquilo que, no fundo, é importante para elas – e, às vezes, essa leitura não é tão óbvia. Tenho um amigo, por exemplo, que é um grande pensador e deve ter lido uma quantidade de livros muito superior à da média dos seres humanos normais. Para ele, seria natural utilizar a cultura como parâmetro para classificar os tipos de gente existente no mundo. Porém, ele é uma pessoa obcecada por elegância – e aqui não estamos falando de moda e sim de educação, porte ou altivez. É essa a régua que ele geralmente utiliza para classificar os espécimes da raça humana.

Há igualmente um contingente enorme que se preocupa em demasia com o peso alheio. Esse grupo decompõe a humanidade entre gordos e magros. Geralmente são pessoas magras ou que emagreceram momentaneamente que fazem comentários sobre a gordura dos outros. Mas os rechonchudos também podem adotar este tipo de divisão e, às vezes, incorrer em estereótipos para defender teses esdrúxulas. O escritor Nelson Rodrigues, que vivia às turras com a balança, fazia pouco dos esquálidos e era até ofensivo em suas opiniões. Na série “A Vida como Ela É…”, Rodrigues volta e meia escrevia a mesma frase em suas crônicas: “todo canalha é magro”. Características físicas, por sinal, são exemplos utilizadíssimos para se categorizar os indivíduos – a altura é uma delas. “Fulano é alto” ou “Sicrano é baixinho” são frases que escutamos adoidado ao longo de nossas vidas.

No mundo corporativo, temos pessoas obcecadas por sucesso ou por dinheiro. É bastante comum encontrar executivos e empresários que dividem as pessoas entre “winners” e “losers” exatamente como se estivessem em um filme americano de adolescentes. Ou que calibram o respeito aos outros de acordo com o dinheiro acumulado pelos interlocutores.

Curiosamente, quem é muito rico ou obteve grande sucesso na carreira geralmente não tem uma visão tão estreita sobre as pessoas. Esses indivíduos, que hoje não têm de provar nada a ninguém, apreciam os demais em relação àquilo que eles têm a oferecer de bom. Isso vale para uma conversa com um mecânico ou um sommelier, passando por um CEO internacional ou um economista estrangeiro. Não importa a origem, cultura, peso, altura ou grau de elegância. Salvo raríssimas exceções, todos indivíduos têm algo interessante a oferecer em uma conversa. E esse lado relevante geralmente surge quando nos despimos de preconceitos – ou desistimos de classificar mentalmente as outras pessoas.

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