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Sobre a popularidade e a guinada populista de Bolsonaro

A guinada populista do presidente é um movimento que não foi antecipado por Huck, Doria e a esquerda

Bolsonaro, como Lula, é carismático e domina a língua do povo. Como o ex-presidente, adora o contato popular, o que em plena pandemia gerou críticas (Marcos Corrêa/PR/Divulgação)
JR

Janaína Ribeiro

Publicado em 31 de agosto de 2020 às 15h13.

O governador de São Paulo, João Doria , declarou poucos dias atrás, que a popularidade do presidente Jair Bolsonaro é resultante do programa de distribuição emergencial de recursos, o chamado coronavoucher. "A população brasileira é uma população pobre e se empobreceu ainda mais na pandemia. Quando você coloca um auxílio emergencial com R$ 600, isso muda a perspectiva de vida dessas pessoas.

Estamos falando de 90 milhões de pessoas recebendo R$ 600 por mês. Não estou dizendo que não mereçam receber, mas este gesto, sendo do governo federal, contribuiu para melhorar a avaliação do presidente da República", disse. Para o governador, este fenômeno é “sazonal” e deve passar assim que o programa de assistência acabar. Talvez Doria esteja usando seu “wishful thinking” para analisar o cenário político.

Bolsonaro começou a colher frutos em popularidade quando deixou de se estranhar diariamente com os poderes Executivo e Legislativo, aplainando a estrada de solavancos constantes pela qual transitava a administração federal. Aqui e ali, o presidente continua a disparar farpas contra a imprensa – mas esse tipo de discussão não parece gerar uma grande comoção entre os eleitores. Ao apaziguar ânimos e deixar de criar crises entre poderes, o Bolsonaro percebeu que seu cotidiano ficava mais fácil e que sua imagem melhorava junto ao público em geral.

Outro movimento importante, iniciado antes da pandemia, foi o aperfeiçoamento do Bolsa Família , com a introdução do décimo-terceiro salário. Esse upgrade assistencialista acabou por turbinar a importância do coronavoucher de R$ 600 e de seu sucedâneo de R$ 300 (ou qualquer que seja o valor aprovado pela equipe econômica). Todos os programas serão concentrados em uma só iniciativa, batizada de “ Renda Brasil ”. Com isso, o governo retira de cena um nome ligado ao PT (Bolsa Família) e passa a capitalizar sozinho o apoio popular a este tipo de iniciativa. Lembram-se do PSDB, que vivia dizendo (com alguma razão, diga-se) que o Bolsa Família havia sido criado na gestão de Fernando Henrique Cardoso? Talvez tenhamos militantes petistas, daqui a dois anos, tendo de reforçar que o Renda Brasil foi concebido sob a bandeira de Luiz Inácio Lula da Silva – pois, como sabemos, boa parte do eleitorado tem memória curta.

Bolsonaro, como Lula,é carismático e domina a língua do povo. Como o ex-presidente, adora o contato popular, o que em plena pandemia gerou críticas por parte de jornalistas e de autoridades sanitárias – até porque em muitas das aglomerações que causava o presidente não usava sem máscara de proteção. O resultado desta sequência de contatos físicos foi uma bola cantada: a contaminação pelo coronavírus.

Se Bolsonaro conseguir banir de seu discurso elementos de torpeza, como fazer apologia da tortura ou de torturadores, diminuir a importância das mortes geradas pelo coronavírus (algo que atinge familiares das vítimas da pandemia) ou minimizar os danos provocados à Floresta Amazônica, poderá ver sua popularidade crescer ainda mais. Mas essa possibilidade dificilmente ocorrerá, pois a agressividade politicamente incorreta é um elemento atávico à personalidade do presidente.

Em um campeonato de populismo, Bolsonaro ganha com facilidade de Doria, mas talvez tenha dificuldades com Luciano Huck , cujos esquetes de assistencialismo fazem sucesso na TV. Em sua versão candidato, Huck tem um discurso voltado contra as elites. Sua proposta para combater as desigualdades no país, por exemplo, é aumentar os impostos dos mais ricos. Em um artigo publicado no site do World Economic Forum, no início do ano, ele citou como intervenções necessárias à agenda brasileira “assegurar uma melhor captação de impostos, reduzindo subsídios aos mais ricos”. O nome desse jogo é passar a conta para os empresários, uma ladainha que se escuta desde os tempos de Getúlio Vargas. Um dos princípios do liberalismo, como se sabe, é a diminuição do Estado e a consequente redução de impostos. Portanto, Huck pode ser definido de várias formas, menos como liberal. Quem tiver interesse em conferir o artigo de Luciano Huck, é só clicar aqui:

O problema de Huck, ao investir nesta direção, é que no ano de 2022 o terreno do populismo poderá estar totalmente preenchido por Bolsonaro. Teoricamente, uma antítese ao presidente precisaria ter um foco contrário ao populismo. A dificuldade em utilizar essa estratégia é o fraco potencial de angariar votos. O risco de Doria, se pretender enveredar por este caminho mais racional, é oferecer ao eleitor uma candidatura nos moldes de Geraldo Alckmin. Por enquanto, ele permanece sozinho nessa estratégia. O governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel , está fora do jogo. Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, ainda não tem o mesmo cacife do colega paulista. E ainda não se tem ideia de como o nome de Ciro Gomes chegará em 2022 – ou quem será o representante do PT nas urnas.

A guinada populista do presidente é um movimento que não foi antecipado por Huck, Doria e a esquerda. O ritmo de viagens e de inaugurações mostra que, para Bolsonaro, o futuro já começou. Se levarmos em consideração que a economia sofreu sobremaneira com o coronavírus , o mandatário preferiu o caminho fácil dos investimentos estatais, do assistencialismo e da geração urgente de empregos. Resta saber como vai compatibilizar tudo isso com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Enquanto não se vê a solução para uma equação indigesta (gastar mais sem ultrapassar o teto de gastos), o presidente se entrega a uma agenda frenética de eventos, dando atenção ao Nordeste.

No fundo, Bolsonaro está seguindo a cartilha de Lula e faz o PT provar do próprio veneno. Conseguirá se manter nessa estrada até 2022? Façam suas apostas.

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O governador de São Paulo, João Doria , declarou poucos dias atrás, que a popularidade do presidente Jair Bolsonaro é resultante do programa de distribuição emergencial de recursos, o chamado coronavoucher. "A população brasileira é uma população pobre e se empobreceu ainda mais na pandemia. Quando você coloca um auxílio emergencial com R$ 600, isso muda a perspectiva de vida dessas pessoas.

Estamos falando de 90 milhões de pessoas recebendo R$ 600 por mês. Não estou dizendo que não mereçam receber, mas este gesto, sendo do governo federal, contribuiu para melhorar a avaliação do presidente da República", disse. Para o governador, este fenômeno é “sazonal” e deve passar assim que o programa de assistência acabar. Talvez Doria esteja usando seu “wishful thinking” para analisar o cenário político.

Bolsonaro começou a colher frutos em popularidade quando deixou de se estranhar diariamente com os poderes Executivo e Legislativo, aplainando a estrada de solavancos constantes pela qual transitava a administração federal. Aqui e ali, o presidente continua a disparar farpas contra a imprensa – mas esse tipo de discussão não parece gerar uma grande comoção entre os eleitores. Ao apaziguar ânimos e deixar de criar crises entre poderes, o Bolsonaro percebeu que seu cotidiano ficava mais fácil e que sua imagem melhorava junto ao público em geral.

Outro movimento importante, iniciado antes da pandemia, foi o aperfeiçoamento do Bolsa Família , com a introdução do décimo-terceiro salário. Esse upgrade assistencialista acabou por turbinar a importância do coronavoucher de R$ 600 e de seu sucedâneo de R$ 300 (ou qualquer que seja o valor aprovado pela equipe econômica). Todos os programas serão concentrados em uma só iniciativa, batizada de “ Renda Brasil ”. Com isso, o governo retira de cena um nome ligado ao PT (Bolsa Família) e passa a capitalizar sozinho o apoio popular a este tipo de iniciativa. Lembram-se do PSDB, que vivia dizendo (com alguma razão, diga-se) que o Bolsa Família havia sido criado na gestão de Fernando Henrique Cardoso? Talvez tenhamos militantes petistas, daqui a dois anos, tendo de reforçar que o Renda Brasil foi concebido sob a bandeira de Luiz Inácio Lula da Silva – pois, como sabemos, boa parte do eleitorado tem memória curta.

Bolsonaro, como Lula,é carismático e domina a língua do povo. Como o ex-presidente, adora o contato popular, o que em plena pandemia gerou críticas por parte de jornalistas e de autoridades sanitárias – até porque em muitas das aglomerações que causava o presidente não usava sem máscara de proteção. O resultado desta sequência de contatos físicos foi uma bola cantada: a contaminação pelo coronavírus.

Se Bolsonaro conseguir banir de seu discurso elementos de torpeza, como fazer apologia da tortura ou de torturadores, diminuir a importância das mortes geradas pelo coronavírus (algo que atinge familiares das vítimas da pandemia) ou minimizar os danos provocados à Floresta Amazônica, poderá ver sua popularidade crescer ainda mais. Mas essa possibilidade dificilmente ocorrerá, pois a agressividade politicamente incorreta é um elemento atávico à personalidade do presidente.

Em um campeonato de populismo, Bolsonaro ganha com facilidade de Doria, mas talvez tenha dificuldades com Luciano Huck , cujos esquetes de assistencialismo fazem sucesso na TV. Em sua versão candidato, Huck tem um discurso voltado contra as elites. Sua proposta para combater as desigualdades no país, por exemplo, é aumentar os impostos dos mais ricos. Em um artigo publicado no site do World Economic Forum, no início do ano, ele citou como intervenções necessárias à agenda brasileira “assegurar uma melhor captação de impostos, reduzindo subsídios aos mais ricos”. O nome desse jogo é passar a conta para os empresários, uma ladainha que se escuta desde os tempos de Getúlio Vargas. Um dos princípios do liberalismo, como se sabe, é a diminuição do Estado e a consequente redução de impostos. Portanto, Huck pode ser definido de várias formas, menos como liberal. Quem tiver interesse em conferir o artigo de Luciano Huck, é só clicar aqui:

O problema de Huck, ao investir nesta direção, é que no ano de 2022 o terreno do populismo poderá estar totalmente preenchido por Bolsonaro. Teoricamente, uma antítese ao presidente precisaria ter um foco contrário ao populismo. A dificuldade em utilizar essa estratégia é o fraco potencial de angariar votos. O risco de Doria, se pretender enveredar por este caminho mais racional, é oferecer ao eleitor uma candidatura nos moldes de Geraldo Alckmin. Por enquanto, ele permanece sozinho nessa estratégia. O governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel , está fora do jogo. Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, ainda não tem o mesmo cacife do colega paulista. E ainda não se tem ideia de como o nome de Ciro Gomes chegará em 2022 – ou quem será o representante do PT nas urnas.

A guinada populista do presidente é um movimento que não foi antecipado por Huck, Doria e a esquerda. O ritmo de viagens e de inaugurações mostra que, para Bolsonaro, o futuro já começou. Se levarmos em consideração que a economia sofreu sobremaneira com o coronavírus , o mandatário preferiu o caminho fácil dos investimentos estatais, do assistencialismo e da geração urgente de empregos. Resta saber como vai compatibilizar tudo isso com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Enquanto não se vê a solução para uma equação indigesta (gastar mais sem ultrapassar o teto de gastos), o presidente se entrega a uma agenda frenética de eventos, dando atenção ao Nordeste.

No fundo, Bolsonaro está seguindo a cartilha de Lula e faz o PT provar do próprio veneno. Conseguirá se manter nessa estrada até 2022? Façam suas apostas.

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