Quando podemos duvidar do resultado de uma pesquisa?
83% dos entrevistados do Datafolha declararam “checar se a informação é verdadeira antes de compartilhar”
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Publicado em 3 de junho de 2024 às 14h26.
Uma pesquisa divulgada ontem pelo Datafolha me chamou a atenção. O tema era “Opinião sobre Mídia e Política” e apontou que os veículos de imprensa desfrutam de um índice de confiança maior que o das redes sociais. Até aí, tudo bem. Em um mundo infectado diariamente pelas fake news, o jornalismo ainda pode ser um bastião da verdade em meio a um oceano de notícias falsas.
Mas há dois itens no estudo que desafiam o senso comum. O primeiro diz respeito ao compartilhamento de informações políticas. Cerca de 80% dizem buscar “mais informações quando desconfiam de notícias nas redes sociais e aplicativos”. Já 83% dos entrevistados declararam “checar se a informação é verdadeira antes de compartilhar”.
Ora, se quatro quintos da população que habita o universo digital checassem frequentemente aquilo que é dividido nas redes, provavelmente não haveria tantos fakes transitando pela internet, certo? Portanto, alguma coisa parece estar errada aqui.
Evidentemente, o problema não é com a metodologia do Datafolha. O instituto tem como matéria-prima as entrevistas colhidas durante a enquete e a chance de tê-las compilado de maneira correta é de 100%. A suposta adversidade está justamente nas respostas dos entrevistados. Toda vez que uma pesquisa mexe com a autoimagem de um entrevistado, o resultado pode ganhar algum nível de distorção.
Assim, se admitisse que repassa notícias sem checar, um determinado indivíduo estaria reconhecendo que age de forma irresponsável e colaboraria para a desinformação alheia. Mesmo que a pesquisa seja anônima, o respondente confessará um comportamento inadequado a alguém – o entrevistador. E é aqui que mora o perigo.
Esse estudo da Datafolha é parecido com vários que li quando era diretor de redação da revista Época. Quando os entrevistados eram estimulados a dizer que tipo de matéria gostariam de ler na publicação, declaravam que desejavam reportagens extensas sobre os grandes problemas brasileiros, especialmente aqueles de cunho político e econômico. Mas quando fazíamos a checagem daquilo que eles se recordavam de ter lido na última edição da revista, as matérias extensas sobre esses desafios político-econômicos do país eram praticamente ignoradas em detrimento de alguma nota sobre celebridades como Britney Spears ou Juliana Paes.
Ou seja, no fundo, as pessoas queriam se apresentar como cidadãos que se preocupavam com temas profundos para o futuro do Brasil. Na prática, porém, não exerciam esse interesse quando tinham a oportunidade.
Imagino quais seriam as estatísticas se os pesquisadores fossem a campo com um polígrafo. Tenho certeza de que os números compilados seriam bem diferentes daqueles obtidos pelo estudo divulgado ontem.
Uma pesquisa divulgada ontem pelo Datafolha me chamou a atenção. O tema era “Opinião sobre Mídia e Política” e apontou que os veículos de imprensa desfrutam de um índice de confiança maior que o das redes sociais. Até aí, tudo bem. Em um mundo infectado diariamente pelas fake news, o jornalismo ainda pode ser um bastião da verdade em meio a um oceano de notícias falsas.
Mas há dois itens no estudo que desafiam o senso comum. O primeiro diz respeito ao compartilhamento de informações políticas. Cerca de 80% dizem buscar “mais informações quando desconfiam de notícias nas redes sociais e aplicativos”. Já 83% dos entrevistados declararam “checar se a informação é verdadeira antes de compartilhar”.
Ora, se quatro quintos da população que habita o universo digital checassem frequentemente aquilo que é dividido nas redes, provavelmente não haveria tantos fakes transitando pela internet, certo? Portanto, alguma coisa parece estar errada aqui.
Evidentemente, o problema não é com a metodologia do Datafolha. O instituto tem como matéria-prima as entrevistas colhidas durante a enquete e a chance de tê-las compilado de maneira correta é de 100%. A suposta adversidade está justamente nas respostas dos entrevistados. Toda vez que uma pesquisa mexe com a autoimagem de um entrevistado, o resultado pode ganhar algum nível de distorção.
Assim, se admitisse que repassa notícias sem checar, um determinado indivíduo estaria reconhecendo que age de forma irresponsável e colaboraria para a desinformação alheia. Mesmo que a pesquisa seja anônima, o respondente confessará um comportamento inadequado a alguém – o entrevistador. E é aqui que mora o perigo.
Esse estudo da Datafolha é parecido com vários que li quando era diretor de redação da revista Época. Quando os entrevistados eram estimulados a dizer que tipo de matéria gostariam de ler na publicação, declaravam que desejavam reportagens extensas sobre os grandes problemas brasileiros, especialmente aqueles de cunho político e econômico. Mas quando fazíamos a checagem daquilo que eles se recordavam de ter lido na última edição da revista, as matérias extensas sobre esses desafios político-econômicos do país eram praticamente ignoradas em detrimento de alguma nota sobre celebridades como Britney Spears ou Juliana Paes.
Ou seja, no fundo, as pessoas queriam se apresentar como cidadãos que se preocupavam com temas profundos para o futuro do Brasil. Na prática, porém, não exerciam esse interesse quando tinham a oportunidade.
Imagino quais seriam as estatísticas se os pesquisadores fossem a campo com um polígrafo. Tenho certeza de que os números compilados seriam bem diferentes daqueles obtidos pelo estudo divulgado ontem.