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Por que essa obsessão com o eleitorado evangélico?

Bolsonaro lidera entre os protestantes — mas perde entre os católicos

Bíblia (krisanapong detraphiphat/Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 3 de março de 2022 às 15h08.

Aluizio Falcão Filho

Saiu ontem uma pesquisa realizada pelo site Poder 360, sobre o eleitorado evangélico. Neste grupo, o presidente Jair Bolsonaro tem 48 % das intenções de voto, contra 27 % de Luiz Inácio Lula da Silva. Portanto, se dependesse apenas desses eleitores, Bolsonaro seria reconduzido ao cargo já no primeiro turno das eleições.

Os evangélicos, segundo o último censo do IBGE, somam 22 % da população brasileira, contra 64 % de católicos. Não se pode achar, portanto, que esta parcela sozinha possa definir um pleito. Diante disso, a pergunta é inevitável: por que essa obsessão com os seguidores das religiões pentecostais?

Há uma espécie de crença segundo a qual os evangélicos votam em bloco e, assim, poderiam decidir determinados pleitos. De fato, a chamada bancada evangélica, composta por pastores ou representantes de determinadas igrejas, foi uma das que mais cresceu nos últimos tempos, também surfando a onda conservadora que se observou no Brasil de 2014 para cá.

Nas eleições majoritárias, no entanto, não se pode dizer que exista uma unanimidade. Cerca de metade deste eleitorado vai de Bolsonaro; um quarto, de Lula; e, por fim, um quarto está dividido entre os demais candidatos, além de indecisos, brancos e nulos.

Conservadorismo
Há uma ilusão em achar que os evangélicos votam em massa no candidato apontado pelos líderes religiosos. Evidentemente, há casos do gênero. Mas essa visão não deixa de carregar um certo preconceito – o de que os protestantes não pensam por conta própria e precisam da orientação de outros para decidir em quem votar.

Bolsonaro tem a liderança neste segmento não porque é recomendado pelos pastores (o que, sem dúvida, ocorre com frequência). O presidente da República, com seus defeitos e qualidades, é o candidato mais conservador entre todos os que se apresentam ao eleitorado. E o evangélico é um conservador por natureza. O mandatário sabe disso e, volta e meia, corteja este público, citando versículos e parábolas.

Mas é preciso lembrar que num passado não muito longínquo, Lula era querido por vários pastores e foi o candidato mais votado entre os protestantes. Por isso, seu índice de intenções de votos ainda é considerável (27 %).

Entre os católicos, porém, esse quadro se inverte. Lula possui 44 % das intenções de voto e Bolsonaro 26 %. Como há mais católicos que evangélicos, a soma final favorece Lula, que lidera a pesquisa com 40 %, diante de 32 % amealhados pelo principal rival.

Católicos e protestantes
O que diferencia um eleitor católico de um eleitor protestante?

Em primeiro lugar, o grau de conservadorismo é, em média, maior entre os evangélicos. A pauta de costumes mais rígida costuma ter maior aderência entre os pentecostais do que entre os fiéis católicos. Além disso, temos de lembrar que no Brasil temos a figura do católico não praticante – aquele que se declara católico, mas não vai à Igreja ou leva sua vida segundo princípios religiosos. Essa parcela de brasileiros, que deve ser grande, não vota necessariamente de olho em questões relativas aos costumes. Mas os evangélicos fazem isso.

De maneira geral, católicos (especialmente aqueles que conversam raramente com um padre) são mais tolerantes que evangélicos. Dessa forma, têm mais condições de sufragar Lula, que sofreu várias acusações de corrupção e foi preso pela Operação Lava-Jato.

Por fim, os evangélicos têm certa predileção pelo Velho Testamento, que prega um Deus implacável e vingativo contra aqueles que desrespeitarem seus princípios. Já o Novo Testamento, que narra a epopeia de Jesus Cristo e o início da Igreja Católica, com o apóstolo Pedro, defende o entendimento e o perdão. Essa diferença é fundamental para entender a diferença de mentalidade entre os fiéis.

Igreja e Estado
A separação entre Igreja e Estado é um conceito fortemente difundido entre nós. Trata-se de uma ideia defendida por Thomas Jefferson pela primeira vez em 1802. Em uma carta à Associação Batista de Danbury, cidade de Conneticut, ele escreveu: “eu contemplo com reverência soberana que age de todo o povo americano, que declarou que sua legislatura deve ‘fazer nenhuma lei respeitando um estabelecimento da religião, ou proibindo o seu livre exercício’, assim, construindo um muro de separação entre Igreja e Estado”.

Ao misturarmos religião e política, podemos correr o risco de subtrair o aspecto laico do Estado. E adotar preceitos religiosos em vez de científicos para basear nossas decisões – ou mesmo a educação de nossos filhos. A religião – ou a busca pela espiritualidade – é algo importante para os seres humanos. Mas, evocada em momentos errados, pode tornar governos democráticos em regimes intolerantes e fiscalizadores.

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Aluizio Falcão Filho

Saiu ontem uma pesquisa realizada pelo site Poder 360, sobre o eleitorado evangélico. Neste grupo, o presidente Jair Bolsonaro tem 48 % das intenções de voto, contra 27 % de Luiz Inácio Lula da Silva. Portanto, se dependesse apenas desses eleitores, Bolsonaro seria reconduzido ao cargo já no primeiro turno das eleições.

Os evangélicos, segundo o último censo do IBGE, somam 22 % da população brasileira, contra 64 % de católicos. Não se pode achar, portanto, que esta parcela sozinha possa definir um pleito. Diante disso, a pergunta é inevitável: por que essa obsessão com os seguidores das religiões pentecostais?

Há uma espécie de crença segundo a qual os evangélicos votam em bloco e, assim, poderiam decidir determinados pleitos. De fato, a chamada bancada evangélica, composta por pastores ou representantes de determinadas igrejas, foi uma das que mais cresceu nos últimos tempos, também surfando a onda conservadora que se observou no Brasil de 2014 para cá.

Nas eleições majoritárias, no entanto, não se pode dizer que exista uma unanimidade. Cerca de metade deste eleitorado vai de Bolsonaro; um quarto, de Lula; e, por fim, um quarto está dividido entre os demais candidatos, além de indecisos, brancos e nulos.

Conservadorismo
Há uma ilusão em achar que os evangélicos votam em massa no candidato apontado pelos líderes religiosos. Evidentemente, há casos do gênero. Mas essa visão não deixa de carregar um certo preconceito – o de que os protestantes não pensam por conta própria e precisam da orientação de outros para decidir em quem votar.

Bolsonaro tem a liderança neste segmento não porque é recomendado pelos pastores (o que, sem dúvida, ocorre com frequência). O presidente da República, com seus defeitos e qualidades, é o candidato mais conservador entre todos os que se apresentam ao eleitorado. E o evangélico é um conservador por natureza. O mandatário sabe disso e, volta e meia, corteja este público, citando versículos e parábolas.

Mas é preciso lembrar que num passado não muito longínquo, Lula era querido por vários pastores e foi o candidato mais votado entre os protestantes. Por isso, seu índice de intenções de votos ainda é considerável (27 %).

Entre os católicos, porém, esse quadro se inverte. Lula possui 44 % das intenções de voto e Bolsonaro 26 %. Como há mais católicos que evangélicos, a soma final favorece Lula, que lidera a pesquisa com 40 %, diante de 32 % amealhados pelo principal rival.

Católicos e protestantes
O que diferencia um eleitor católico de um eleitor protestante?

Em primeiro lugar, o grau de conservadorismo é, em média, maior entre os evangélicos. A pauta de costumes mais rígida costuma ter maior aderência entre os pentecostais do que entre os fiéis católicos. Além disso, temos de lembrar que no Brasil temos a figura do católico não praticante – aquele que se declara católico, mas não vai à Igreja ou leva sua vida segundo princípios religiosos. Essa parcela de brasileiros, que deve ser grande, não vota necessariamente de olho em questões relativas aos costumes. Mas os evangélicos fazem isso.

De maneira geral, católicos (especialmente aqueles que conversam raramente com um padre) são mais tolerantes que evangélicos. Dessa forma, têm mais condições de sufragar Lula, que sofreu várias acusações de corrupção e foi preso pela Operação Lava-Jato.

Por fim, os evangélicos têm certa predileção pelo Velho Testamento, que prega um Deus implacável e vingativo contra aqueles que desrespeitarem seus princípios. Já o Novo Testamento, que narra a epopeia de Jesus Cristo e o início da Igreja Católica, com o apóstolo Pedro, defende o entendimento e o perdão. Essa diferença é fundamental para entender a diferença de mentalidade entre os fiéis.

Igreja e Estado
A separação entre Igreja e Estado é um conceito fortemente difundido entre nós. Trata-se de uma ideia defendida por Thomas Jefferson pela primeira vez em 1802. Em uma carta à Associação Batista de Danbury, cidade de Conneticut, ele escreveu: “eu contemplo com reverência soberana que age de todo o povo americano, que declarou que sua legislatura deve ‘fazer nenhuma lei respeitando um estabelecimento da religião, ou proibindo o seu livre exercício’, assim, construindo um muro de separação entre Igreja e Estado”.

Ao misturarmos religião e política, podemos correr o risco de subtrair o aspecto laico do Estado. E adotar preceitos religiosos em vez de científicos para basear nossas decisões – ou mesmo a educação de nossos filhos. A religião – ou a busca pela espiritualidade – é algo importante para os seres humanos. Mas, evocada em momentos errados, pode tornar governos democráticos em regimes intolerantes e fiscalizadores.

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