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Paulo Guedes e o campo de distorção da realidade

Ontem, o ministro afirmou que a Febraban "é uma casa de lobby muito honrada, o lobby é muito justo", alfinetando seu inimigo político, Rogerio Marinho

Ministro Paulo Guedes (Divulgação/Divulgação)
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marianamartucci

Publicado em 30 de outubro de 2020 às 08h49.

Falar mal de banco sempre dá Ibope. Quando se consegue falar mal dos banqueiros e dos inimigos numa mesma frase, então, é a glória para certas figuras públicas. Foi o que fez o ministro Paulo Guedes ontem.

“A Febraban é uma casa de lobby muito honrada, o lobby é muito justo. Mas tem que estar escrito na testa, "lobby bancário", que é para todo mundo entender do que se trata. Inclusive financiando estudos que não tem nada a ver com a atividade de defesa das transações bancárias. É importante dizer isso. Financiando ministro gastador para ver se fura teto, para ver se derruba o outro lado”, alfinetou Guedes, ligando seu inimigo político, Rogerio Marinho, ministro do Desenvolvimento Regional, à entidade que defende os interesses das instituições financeiras.

O motivo da bronca é o apoio do órgão a um estudo do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Organização das Nações Unidas (que, de fato, existe). E o documento final do PNUD foi efetivamente oferecido à pasta de Marinho.

Mas há dois detalhes que Guedes providencialmente não mencionou para tornar mais venenosa a alfinetada no colega de Esplanada. O primeiro é que a Febraban não é o único patrocinador do programa da ONU. São diversos apoiadores, entre empresas privadas, associações de classe e até o Sistema S (coincidência ou não, a página da seção brasileira do programa que mostra os parceiros foi removida do site e não pode mais ser acessada).

Outro pormenor: o conteúdo do PNUD não foi apenas oferecido ao Ministério do Desenvolvimento Regional, mas também a três outras pastas, entre as quais a da Agricultura.

Ao agir dessa forma, Guedes mostra que compartilha com o falecido Steve Jobs pelo menos uma famosa característica do fundador da Apple: aquilo que seus colegas chamavam de “campo de distorção da realidade”. Essa idiossincrasia era a capacidade que Jobs tinha de convencer ele mesmo e os outros a acreditarem em determinadas coisas com base em uma visão bastante peculiar dos fatos.

Jobs utilizava esse método para unir sua equipe em torno de projetos quase impossíveis. Já Guedes distorce a realidade para desunir o governo e criar um desconforto em direção a Rogério Marinho.

As intenções do ministro da Economia podem até ser louváveis – ele está defendendo o teto de gastos, querendo segurar o déficit público. Na outra ponta desta equação, segundo Guedes, está Marinho, querendo turbinar os gastos estatais para estimular a economia, em um arroubo de irresponsabilidade fiscal. Mas, como diz o velho ditado, de boas intenções o inferno está cheio.

Guedes também colocou na conta da Febraban uma campanha anti-CPMF que rola por aí. Há pessoas respeitadas entre o empresariado que defendem um imposto nesses moldes. Mas há também uma enormidade de pessoas que são contra o tributo instantâneo. A razão é claramente o convívio com a antiga CPMF, que durou de 1997 a 2007.

Há centenas de milhares de pessoas que não querem o imposto sobre transações financeiras sem jamais ter ouvido uma só crítica dos bancos ou de sua associação. A nova CPMF é vista com má vontade por diversos economistas, políticos e empresários. Portanto, é obrigação do Ministério da Economia se comunicar melhor e iniciar um trabalho de convencimento de suas ideias – não colocar a culpa nos banqueiros e tentar impor a vontade do ministro da Economia. De qualquer forma, num outro arroubo de irritação, o ministro disse ao final do dia de ontem que não falaria mais em nova CPMF: “Do meu ponto de vista, esse imposto está morto”.

Muitos acham que a vida pública não é para qualquer um. Trata-se de um cotidiano totalmente diferente do mundo privado, no qual é preciso ouvir e catequizar, negociar e ceder. É necessário ter um espírito conciliador e de empatia. Até agora, o ministro mostrou que suas características não compõem exatamente um perfil diplomático e respeitoso. Ao falar grosso, o chefão da Economia não convence ninguém e apenas coleciona mais inimigos. Diante disso, é o caso de se perguntar: quem será que dura mais em Brasília, Paulo Guedes ou Rogério Marinho?

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Falar mal de banco sempre dá Ibope. Quando se consegue falar mal dos banqueiros e dos inimigos numa mesma frase, então, é a glória para certas figuras públicas. Foi o que fez o ministro Paulo Guedes ontem.

“A Febraban é uma casa de lobby muito honrada, o lobby é muito justo. Mas tem que estar escrito na testa, "lobby bancário", que é para todo mundo entender do que se trata. Inclusive financiando estudos que não tem nada a ver com a atividade de defesa das transações bancárias. É importante dizer isso. Financiando ministro gastador para ver se fura teto, para ver se derruba o outro lado”, alfinetou Guedes, ligando seu inimigo político, Rogerio Marinho, ministro do Desenvolvimento Regional, à entidade que defende os interesses das instituições financeiras.

O motivo da bronca é o apoio do órgão a um estudo do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Organização das Nações Unidas (que, de fato, existe). E o documento final do PNUD foi efetivamente oferecido à pasta de Marinho.

Mas há dois detalhes que Guedes providencialmente não mencionou para tornar mais venenosa a alfinetada no colega de Esplanada. O primeiro é que a Febraban não é o único patrocinador do programa da ONU. São diversos apoiadores, entre empresas privadas, associações de classe e até o Sistema S (coincidência ou não, a página da seção brasileira do programa que mostra os parceiros foi removida do site e não pode mais ser acessada).

Outro pormenor: o conteúdo do PNUD não foi apenas oferecido ao Ministério do Desenvolvimento Regional, mas também a três outras pastas, entre as quais a da Agricultura.

Ao agir dessa forma, Guedes mostra que compartilha com o falecido Steve Jobs pelo menos uma famosa característica do fundador da Apple: aquilo que seus colegas chamavam de “campo de distorção da realidade”. Essa idiossincrasia era a capacidade que Jobs tinha de convencer ele mesmo e os outros a acreditarem em determinadas coisas com base em uma visão bastante peculiar dos fatos.

Jobs utilizava esse método para unir sua equipe em torno de projetos quase impossíveis. Já Guedes distorce a realidade para desunir o governo e criar um desconforto em direção a Rogério Marinho.

As intenções do ministro da Economia podem até ser louváveis – ele está defendendo o teto de gastos, querendo segurar o déficit público. Na outra ponta desta equação, segundo Guedes, está Marinho, querendo turbinar os gastos estatais para estimular a economia, em um arroubo de irresponsabilidade fiscal. Mas, como diz o velho ditado, de boas intenções o inferno está cheio.

Guedes também colocou na conta da Febraban uma campanha anti-CPMF que rola por aí. Há pessoas respeitadas entre o empresariado que defendem um imposto nesses moldes. Mas há também uma enormidade de pessoas que são contra o tributo instantâneo. A razão é claramente o convívio com a antiga CPMF, que durou de 1997 a 2007.

Há centenas de milhares de pessoas que não querem o imposto sobre transações financeiras sem jamais ter ouvido uma só crítica dos bancos ou de sua associação. A nova CPMF é vista com má vontade por diversos economistas, políticos e empresários. Portanto, é obrigação do Ministério da Economia se comunicar melhor e iniciar um trabalho de convencimento de suas ideias – não colocar a culpa nos banqueiros e tentar impor a vontade do ministro da Economia. De qualquer forma, num outro arroubo de irritação, o ministro disse ao final do dia de ontem que não falaria mais em nova CPMF: “Do meu ponto de vista, esse imposto está morto”.

Muitos acham que a vida pública não é para qualquer um. Trata-se de um cotidiano totalmente diferente do mundo privado, no qual é preciso ouvir e catequizar, negociar e ceder. É necessário ter um espírito conciliador e de empatia. Até agora, o ministro mostrou que suas características não compõem exatamente um perfil diplomático e respeitoso. Ao falar grosso, o chefão da Economia não convence ninguém e apenas coleciona mais inimigos. Diante disso, é o caso de se perguntar: quem será que dura mais em Brasília, Paulo Guedes ou Rogério Marinho?

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