Os empresários e Lula
Vinte anos atrás, Lula procurava afastar o fantasma que apavorava o empresariado. Hoje, curiosamente, existe uma tensão parecida no mercado financeiro
Da Redação
Publicado em 23 de junho de 2022 às 09h36.
Em outubro de 2002, conversei com um empresário que tinha participado de jantar na noite anterior com colegas e o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva . O dólar tinha batido, dias antes, a marca de R$ 3,95 (o equivalente, em dinheiro de hoje, a R$ 8,39) e o clima era de apreensão. Afinal, Lula mostrava-se favorito absoluto nas eleições presidenciais e existia um temor de que sua gestão fosse ruinosa para a iniciativa privada. Perguntei a ele qual foi o tom da conversa. Ele deu um sorriso maroto e disse: “Love is in the air (o amor está no ar)”.
Lula foi encantador e distribuiu sorrisos. Deixou implícito que nomearia um nome do qual todos gostariam para o Banco Central (de fato, escolheu Henrique Meirelles para o cargo) e reforçou o teor da Carta aos Brasileiros, se comprometendo a manter o tripé econômico que sustentava a estabilidade da moeda após o Plano Real.
Vinte anos atrás, Lula procurava afastar o fantasma que apavorava o empresariado: uma administração econômica à esquerda e contra a iniciativa privada. Hoje, curiosamente, existe uma tensão parecida no mercado financeiro, mesmo depois de os empresários terem vivido oito anos sob regência do ex-presidente.
O problema é que o discurso do candidato, em 2022, está bem mais radical do que em 2002. Neste meio tempo, tivemos seis anos de Dilma Rousseff, que foram marcados por um desmantelamento do tripé econômico, e a prisão de Lula no âmbito da Operação Lava-Jato. Isso provocou mudanças no comportamento do petista. Nos dias de hoje, as declarações públicas de Lula sugerem que ele faria uma administração mais parecida com a da sucessora do que com a própria.
Quando Geraldo Alckmin foi escolhido para compor a chapa com o ex-presidente, esperava-se que a plataforma de propostas para o novo governo caminhasse para o centro. O que se viu, no entanto, foi Alckmin em algumas situações que nada teriam a ver com sua vida passada. Uma delas foi ouvir, impávido, a execução da Internacional Socialista em evento de seu partido, o PSB. Depois, em encontro promovido pelas centrais sindicais, acompanhou Lula em um jogral no qual ele pedia apoio ao candidato esquerdista Gustavo Petro à presidência da Colômbia (que ganhou o pleito nesta semana). Diante disso, parece que – pelo menos neste estágio da campanha – o ex-governador não trouxe o discurso de Lula para o centro.
As chances de vitória do PT são altas e o mercado financeiro já trabalha fortemente com a possibilidade de Lula ser o presidente a partir de 2023. A maior parte do empresariado ainda resiste a absorver essa hipótese (até porque ainda faltam 100 dias para o primeiro turno). Porém, os mais pragmáticos já começam a se preparar para um governo petista, apesar das grandes dúvidas que pairam sobre o que realmente pensa o candidato do Partido dos Trabalhadores.
O programa de governo do PT, lançado há dois dias, resolveu algumas questões importantes para os eleitores moderados – como por exemplo, suavizar as menções à reforma trabalhista e enfatizar o apoio à liberdade de imprensa, sem mais falar em controle da mídia. Mas, como é um texto petista, temas como a revogação do teto de gastos e a oposição à privatização de estatais ficaram na peça final.
O clima de incerteza seria suavizado se Lula tivesse promovido encontros com empresários e banqueiros. Mas, tirando uma ou outra conversa particular, isso ainda não ocorreu. O caminho de alguns representantes da iniciativa privada tem sido o de Alckmin. Mas o ex-governador tem falado com poucos empresários, privilegiando o agronegócio (especialmente boi e soja).
Essa ponte deverá ser estabelecida em breve, segundo dirigentes do PT. Mas Lula aguarda um momento mais favorável, pois percebe que ainda existe um apoio dos empresários muito forte a Bolsonaro, especialmente em São Paulo. Por enquanto, as reuniões são realizadas individualmente e marcadas por seu ex-chefe de Gabinete, Gilberto Carvalho.
Neste momento, também há executivos e empresários que batem às portas de quem esteve no poder nos 14 anos de PT, em cargos importantes no Banco do Brasil, Caixa e BNDES – ou ex-secretários dos ministérios da Fazenda e Planejamento dessa época.
A ideia é que uma carta aos empresários seja redigida e seja divulgada até o próximo dia 15, mas ainda há resistências à iniciativa. Quem defende a publicação deste documento afirma que o tom deverá ser em torno do mote “reconstrução do país”, pedindo apoio do empresariado.
Não será fácil, porém, convencer o empresariado paulista, que abraçaram fortemente o antipetismo desde os anos Dilma, uma aversão que a Lava-Jato só fez aumentar. Lula terá de gastar todo seu carisma — que não é pouco — para reverter essa situação.
Em outubro de 2002, conversei com um empresário que tinha participado de jantar na noite anterior com colegas e o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva . O dólar tinha batido, dias antes, a marca de R$ 3,95 (o equivalente, em dinheiro de hoje, a R$ 8,39) e o clima era de apreensão. Afinal, Lula mostrava-se favorito absoluto nas eleições presidenciais e existia um temor de que sua gestão fosse ruinosa para a iniciativa privada. Perguntei a ele qual foi o tom da conversa. Ele deu um sorriso maroto e disse: “Love is in the air (o amor está no ar)”.
Lula foi encantador e distribuiu sorrisos. Deixou implícito que nomearia um nome do qual todos gostariam para o Banco Central (de fato, escolheu Henrique Meirelles para o cargo) e reforçou o teor da Carta aos Brasileiros, se comprometendo a manter o tripé econômico que sustentava a estabilidade da moeda após o Plano Real.
Vinte anos atrás, Lula procurava afastar o fantasma que apavorava o empresariado: uma administração econômica à esquerda e contra a iniciativa privada. Hoje, curiosamente, existe uma tensão parecida no mercado financeiro, mesmo depois de os empresários terem vivido oito anos sob regência do ex-presidente.
O problema é que o discurso do candidato, em 2022, está bem mais radical do que em 2002. Neste meio tempo, tivemos seis anos de Dilma Rousseff, que foram marcados por um desmantelamento do tripé econômico, e a prisão de Lula no âmbito da Operação Lava-Jato. Isso provocou mudanças no comportamento do petista. Nos dias de hoje, as declarações públicas de Lula sugerem que ele faria uma administração mais parecida com a da sucessora do que com a própria.
Quando Geraldo Alckmin foi escolhido para compor a chapa com o ex-presidente, esperava-se que a plataforma de propostas para o novo governo caminhasse para o centro. O que se viu, no entanto, foi Alckmin em algumas situações que nada teriam a ver com sua vida passada. Uma delas foi ouvir, impávido, a execução da Internacional Socialista em evento de seu partido, o PSB. Depois, em encontro promovido pelas centrais sindicais, acompanhou Lula em um jogral no qual ele pedia apoio ao candidato esquerdista Gustavo Petro à presidência da Colômbia (que ganhou o pleito nesta semana). Diante disso, parece que – pelo menos neste estágio da campanha – o ex-governador não trouxe o discurso de Lula para o centro.
As chances de vitória do PT são altas e o mercado financeiro já trabalha fortemente com a possibilidade de Lula ser o presidente a partir de 2023. A maior parte do empresariado ainda resiste a absorver essa hipótese (até porque ainda faltam 100 dias para o primeiro turno). Porém, os mais pragmáticos já começam a se preparar para um governo petista, apesar das grandes dúvidas que pairam sobre o que realmente pensa o candidato do Partido dos Trabalhadores.
O programa de governo do PT, lançado há dois dias, resolveu algumas questões importantes para os eleitores moderados – como por exemplo, suavizar as menções à reforma trabalhista e enfatizar o apoio à liberdade de imprensa, sem mais falar em controle da mídia. Mas, como é um texto petista, temas como a revogação do teto de gastos e a oposição à privatização de estatais ficaram na peça final.
O clima de incerteza seria suavizado se Lula tivesse promovido encontros com empresários e banqueiros. Mas, tirando uma ou outra conversa particular, isso ainda não ocorreu. O caminho de alguns representantes da iniciativa privada tem sido o de Alckmin. Mas o ex-governador tem falado com poucos empresários, privilegiando o agronegócio (especialmente boi e soja).
Essa ponte deverá ser estabelecida em breve, segundo dirigentes do PT. Mas Lula aguarda um momento mais favorável, pois percebe que ainda existe um apoio dos empresários muito forte a Bolsonaro, especialmente em São Paulo. Por enquanto, as reuniões são realizadas individualmente e marcadas por seu ex-chefe de Gabinete, Gilberto Carvalho.
Neste momento, também há executivos e empresários que batem às portas de quem esteve no poder nos 14 anos de PT, em cargos importantes no Banco do Brasil, Caixa e BNDES – ou ex-secretários dos ministérios da Fazenda e Planejamento dessa época.
A ideia é que uma carta aos empresários seja redigida e seja divulgada até o próximo dia 15, mas ainda há resistências à iniciativa. Quem defende a publicação deste documento afirma que o tom deverá ser em torno do mote “reconstrução do país”, pedindo apoio do empresariado.
Não será fácil, porém, convencer o empresariado paulista, que abraçaram fortemente o antipetismo desde os anos Dilma, uma aversão que a Lava-Jato só fez aumentar. Lula terá de gastar todo seu carisma — que não é pouco — para reverter essa situação.