Os desafios do candidato Moro
Moro terá de lidar com a rejeição de bolsonaristas (já que abandonou o governo atirando) e de petistas
Da Redação
Publicado em 8 de novembro de 2021 às 08h28.
Aluizio Falcão Filho
Durante a Operação Lava-Jato, muitos críticos do então juiz Sergio Moro acreditavam que seu trabalho na época tinha duas motivações políticas. Uma seria minar o legado do Partido dos Trabalhadores e, em especial, o capital eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A outra seria pavimentar o caminho para buscar o caminho das urnas. Moro sempre rechaçou essas críticas e se apresentava como um magistrado neutro e com foco no combate à corrupção.
Quando aceitou o convite do presidente Jair Bolsonaro para ocupar o ministério da Justiça, algumas vozes voltaram a se levantar para reclamar de sua atuação na Lava-Jato, questionando sua imparcialidade. Afinal, ele se juntava ao Ministério de quem mais havia se beneficiado dos resultados de todo o processo – incluindo a prisão de Lula, em abril de 2018. Mas, novamente, essas acusações foram solenemente ignoradas pela chamada Opinião Pública. Houve, ao contrário, uma reação positiva da sociedade à indicação do juiz ao cargo de ministro.
Em junho de 2019, com a divulgação das mensagens da Vaza-Jato, porém, percebeu-se que a autoproclamada neutralidade ia até a página dois. Mas, diga-se de passagem, isso já era sabido pela população. Muito da fama amealhada por Moro deve ser creditada à percepção popular de que o ex-juiz estava trabalhando em total alinhamento com a promotoria e a Polícia Federal. Revelados os bastidores da operação através de mensagens trocadas com a Força-Tarefa, sua popularidade sofreu um pouco, mas manteve-se firme.
Daqui a dois dias, no entanto, Sergio Moro vai anunciar sua filiação oficial ao Podemos e sua candidatura à presidência da República. Portanto, fará aquilo que sempre negou: disputar eleições, aproveitando a notoriedade que ganhou como paladino da corrupção.
O candidato Moro tem alguns desafios diante de si. Um deles é o de afastar a imagem de um candidato monotemático, uma espécie de Marina Silva da corrupção. O ex-ministro sabe que esse é um de seus problemas. Tanto é que, na última quarta-feira, mandou pelo Twitter uma mensagem de cunho econômico: “Aumentar o Auxílio Brasil e o Bolsa Família é ótimo. Furar o teto de gastos, aumentar os juros e a inflação, dar calote em professores, tudo isso é péssimo. É preciso ter responsabilidade fiscal”.
Mais adiante, foi em frente em um artigo assinado na revista Crusoé. ” Sepultada a Lava Jato pelo atual governo, a próxima vítima parece ser o Plano Real. […] Ampliar programas de transferência de renda, considerando o cenário econômico, é positivo, mas isso poderia ser feito sem arrebentar o teto de gastos. O país, sobretudo os mais pobres, pagarão um preço caro pelo populismo do governo federal”.
As críticas de Moro repetem quase que palavra por palavra o que dizem os especialistas do mercado financeiro – mas, mesmo assim, ainda não são suficientes para tornar o ex-ministro em alguém que detenha plenos conhecimentos de Economia (mas, é importante ressaltar, o presidente Bolsonaro é igualmente um ignorante em questões econômicas, assim como Lula e Dilma Rousseff).
Outro grande problema: Moro não foi neutro como juiz. Será neutro como presidente? Sua atuação, é verdade, botou muitos corruptos na cadeia. Mas viu-se que ele e os promotores da Lava-Jato, em alguns casos, partiam de suspeitas sem provas e buscavam condenações sem respeitar os princípios básicos do Estado de Direito. Antes que assumisse a pasta da Justiça, tive a oportunidade de perguntar a ele, em um evento privado, se não teria havido exageros durante a operação. Sua resposta foi a de que essa era “uma queixa dos advogados” e que “não havia nenhum inocente na cadeia”. Hoje, no entanto, é possível ver que certas atitudes dos integrantes da operação ultrapassaram os limites do bom senso, causando questionamentos técnicos que deram a oportunidade ao Supremo Tribunal Federal de anular os processos que tinham Lula como réu, zerando o todo o jogo.
Na época da operação, viu-se que foram feitas investigações a partir de suposições e não de suspeitas levantadas nas oitivas. Como seria, então, uma presidência de Moro? Haveria uma caça às bruxas, baseada em seus instintos de paladino?
Aparentemente, trata-se de uma candidatura irreversível. Mas Moro terá de lidar com a rejeição de bolsonaristas (já que abandonou o governo atirando) e de petistas. Em um segundo turno contra Bolsonaro, não poderia contar com os simpatizantes do PT. Contra Lula, teria dificuldades em receber votos dos apoiadores do atual presidente. Ou seja, seria uma parada dura para vencer a segunda etapa do pleito.
É por isso que muitos enxergam que, na prática, Moro talvez esteja utilizando o atual interesse midiático como forma de alavancar uma eventual candidatura ao Senado. É possível? Sim. Mas, para que isso ocorra, o ex-juiz teria de ser envolvido por uma grande lufada de pragmatismo. Ele seria capaz desta atitude de desprendimento? Seu comportamento durante a Lava-Jato e seu tempo na Esplanada mostram que ele não tem exatamente um grande jogo de cintura.
Por enquanto, é uma candidatura que levanta mais perguntas que certezas – mas, sem dúvida, vai gerar grande agitação nas redes sociais e na imprensa.
Aluizio Falcão Filho
Durante a Operação Lava-Jato, muitos críticos do então juiz Sergio Moro acreditavam que seu trabalho na época tinha duas motivações políticas. Uma seria minar o legado do Partido dos Trabalhadores e, em especial, o capital eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A outra seria pavimentar o caminho para buscar o caminho das urnas. Moro sempre rechaçou essas críticas e se apresentava como um magistrado neutro e com foco no combate à corrupção.
Quando aceitou o convite do presidente Jair Bolsonaro para ocupar o ministério da Justiça, algumas vozes voltaram a se levantar para reclamar de sua atuação na Lava-Jato, questionando sua imparcialidade. Afinal, ele se juntava ao Ministério de quem mais havia se beneficiado dos resultados de todo o processo – incluindo a prisão de Lula, em abril de 2018. Mas, novamente, essas acusações foram solenemente ignoradas pela chamada Opinião Pública. Houve, ao contrário, uma reação positiva da sociedade à indicação do juiz ao cargo de ministro.
Em junho de 2019, com a divulgação das mensagens da Vaza-Jato, porém, percebeu-se que a autoproclamada neutralidade ia até a página dois. Mas, diga-se de passagem, isso já era sabido pela população. Muito da fama amealhada por Moro deve ser creditada à percepção popular de que o ex-juiz estava trabalhando em total alinhamento com a promotoria e a Polícia Federal. Revelados os bastidores da operação através de mensagens trocadas com a Força-Tarefa, sua popularidade sofreu um pouco, mas manteve-se firme.
Daqui a dois dias, no entanto, Sergio Moro vai anunciar sua filiação oficial ao Podemos e sua candidatura à presidência da República. Portanto, fará aquilo que sempre negou: disputar eleições, aproveitando a notoriedade que ganhou como paladino da corrupção.
O candidato Moro tem alguns desafios diante de si. Um deles é o de afastar a imagem de um candidato monotemático, uma espécie de Marina Silva da corrupção. O ex-ministro sabe que esse é um de seus problemas. Tanto é que, na última quarta-feira, mandou pelo Twitter uma mensagem de cunho econômico: “Aumentar o Auxílio Brasil e o Bolsa Família é ótimo. Furar o teto de gastos, aumentar os juros e a inflação, dar calote em professores, tudo isso é péssimo. É preciso ter responsabilidade fiscal”.
Mais adiante, foi em frente em um artigo assinado na revista Crusoé. ” Sepultada a Lava Jato pelo atual governo, a próxima vítima parece ser o Plano Real. […] Ampliar programas de transferência de renda, considerando o cenário econômico, é positivo, mas isso poderia ser feito sem arrebentar o teto de gastos. O país, sobretudo os mais pobres, pagarão um preço caro pelo populismo do governo federal”.
As críticas de Moro repetem quase que palavra por palavra o que dizem os especialistas do mercado financeiro – mas, mesmo assim, ainda não são suficientes para tornar o ex-ministro em alguém que detenha plenos conhecimentos de Economia (mas, é importante ressaltar, o presidente Bolsonaro é igualmente um ignorante em questões econômicas, assim como Lula e Dilma Rousseff).
Outro grande problema: Moro não foi neutro como juiz. Será neutro como presidente? Sua atuação, é verdade, botou muitos corruptos na cadeia. Mas viu-se que ele e os promotores da Lava-Jato, em alguns casos, partiam de suspeitas sem provas e buscavam condenações sem respeitar os princípios básicos do Estado de Direito. Antes que assumisse a pasta da Justiça, tive a oportunidade de perguntar a ele, em um evento privado, se não teria havido exageros durante a operação. Sua resposta foi a de que essa era “uma queixa dos advogados” e que “não havia nenhum inocente na cadeia”. Hoje, no entanto, é possível ver que certas atitudes dos integrantes da operação ultrapassaram os limites do bom senso, causando questionamentos técnicos que deram a oportunidade ao Supremo Tribunal Federal de anular os processos que tinham Lula como réu, zerando o todo o jogo.
Na época da operação, viu-se que foram feitas investigações a partir de suposições e não de suspeitas levantadas nas oitivas. Como seria, então, uma presidência de Moro? Haveria uma caça às bruxas, baseada em seus instintos de paladino?
Aparentemente, trata-se de uma candidatura irreversível. Mas Moro terá de lidar com a rejeição de bolsonaristas (já que abandonou o governo atirando) e de petistas. Em um segundo turno contra Bolsonaro, não poderia contar com os simpatizantes do PT. Contra Lula, teria dificuldades em receber votos dos apoiadores do atual presidente. Ou seja, seria uma parada dura para vencer a segunda etapa do pleito.
É por isso que muitos enxergam que, na prática, Moro talvez esteja utilizando o atual interesse midiático como forma de alavancar uma eventual candidatura ao Senado. É possível? Sim. Mas, para que isso ocorra, o ex-juiz teria de ser envolvido por uma grande lufada de pragmatismo. Ele seria capaz desta atitude de desprendimento? Seu comportamento durante a Lava-Jato e seu tempo na Esplanada mostram que ele não tem exatamente um grande jogo de cintura.
Por enquanto, é uma candidatura que levanta mais perguntas que certezas – mas, sem dúvida, vai gerar grande agitação nas redes sociais e na imprensa.