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Os caminhos políticos da direita

Conjunção de forças políticas que colocou Jair Bolsonaro no poder em 2018 dificilmente se repetirá no futuro, especialmente com o ex-presidente inelegível

Jair Bolsonaro e Tarcísio Gomes de Freitas: governador, claramente, ficou maior que o movimento que o lançou na política (Alan Santos/PR/Flickr)
Jair Bolsonaro e Tarcísio Gomes de Freitas: governador, claramente, ficou maior que o movimento que o lançou na política (Alan Santos/PR/Flickr)

Os jornais de domingo, em suas seções de opinião, traziam uma inusitada sintonia. Publicações como O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e O Globo costumam divergir em vários assuntos. Mas, ontem, os três veículos apostaram em um mesmo cenário político: daqui para frente, Jair Bolsonaro sofrerá um esvaziamento progressivo.

O Estadão chamou Bolsonaro de “nanico moral e político”. E disse que o ex-presidente “nunca foi capaz de articular politicamente setores e grupos da sociedade. […] Uma coisa é organizar motociatas ou ter muitos seguidores (e robôs) nas redes sociais. Outra, bem diferente, é exercer uma efetiva liderança política, congregando interesses por meio de ações políticas coordenadas”.

De fato, Bolsonaro mostrou-se incapaz de manter até correligionários e apoiadores de primeira hora ao seu lado. Foi brigando com vários políticos logo no início do mandato e saiu do partido que o elegeu, ficando sem sigla por um bom tempo. A própria negociação que o levou ao PL foi conturbada e, em um determinado momento, foi suspensa. No dia 14 de novembro de 2021, o PL soltou uma nota assinada por Valdemar Costa Neto que dizia: “Após intensa troca de mensagens na madrugada deste domingo, 14, com o Presidente Jair Bolsonaro, decidimos, de comum acordo, pelo adiamento da anunciada cerimônia de filiação”.

Já a Folha começou seu editorial de domingo assim: “Observou-se nos últimos dias uma reacomodação das forças na política brasileira. Abandonaram-se, ao menos por ora, o radicalismo estridente, a ideologia rasteira e o sectarismo infértil em favor de uma agenda promissora para o futuro. […] Talvez seria pouco alhures, mas não num Brasil após quatro anos de Jair Bolsonaro”.

Por fim, o Globo publicou as seguintes linhas, de autoria do jornalista Merval Pereira, sobre a atuação do ex-mandatário durante a votação da Reforma Tributária: “A orientação do ex-presidente Bolsonaro de fechar questão contra a proposta por partir de um governo petista assemelha-se à atitude do PT contra o Plano Real no governo Fernando Henrique”.

Pode-se argumentar que a imprensa não gosta de Bolsonaro – e isso, de maneira geral, é verdade.

Mas o que os três maiores jornais do país apontam em uníssono é inegável: que a conjunção de forças políticas que colocou Jair Bolsonaro no poder em 2018 dificilmente se repetirá no futuro, especialmente com o ex-presidente inelegível. Bolsonaro aglutinou em torno de si todo o sentimento antipetista que havia na época e pôde agir naturalmente, sem gerar grandes rejeições no centro e na direita.

O eleitorado, no entanto, mudou ao longo dos últimos anos, especialmente após a pandemia. E Bolsonaro se manteve igual. Essa foi uma das razões para que perdesse as eleições – por pouco, é verdade – para Luiz Inácio Lula da Silva. Até 2022, no entanto, não se enxergavam alternativas à direita no cenário polarizado. Hoje, existem pelo menos três alternativas de peso: os governadores Tarcísio de Freitas, Romeu Zema e Ratinho Jr.

Além disso, as forças políticas passaram a fugir dos radicalismos e a preferir o centro. O próprio Valdemar, ao rejeitar a pré-candidatura de Ricardo Salles à prefeitura de São Paulo em detrimento do apoio ao atual prefeito Ricardo Nunes, mostrou que prefere o caminho do meio, sem extremismos.

É neste contexto que Bolsonaro precisará reconstruir seu cacife se quiser de fato liderar a oposição nestes anos em que não terá um mandato e, portanto, maior dificuldade de se manter na ribalta política. Mas como é que alguém que fez uma carreira inteira em cima do conflito vai ter condições de agregar políticos moderados ao seu redor?

Talvez o ex-presidente esteja apto apenas a comandar apenas uma parcela da direita, justamente a mais exaltada e sintonizada com o conservadorismo de costumes. Aqueles mais pragmáticos ou liberais na economia podem encontrar outros nomes no tabuleiro político para apoiar. Se isso ocorrer, o bolsonarismo corre o risco de virar uma minoria barulhenta e sem muita representatividade.

O governador Tarcísio, que recentemente andou se estranhando com o grupo bolsonarista raiz, pode ser uma opção interessante para a direita, especialmente porque demonstrou nas urnas que é capaz de atrair moderados e centristas. Talvez esteja na hora de Tarcísio se desvencilhar das amarras do bolsonarismo e tentar um voo solo. Com as cutucadas que vem recebendo dos bolsonaristas, jamais será visto como um traidor, como foi o ex-governador João Doria em relação a Geraldo Alckmin.

O governador, claramente, ficou maior que o movimento que o lançou na política. Mesmo assim, esse afastamento não deverá ser rápido. Com Gilberto Kassab ao seu lado, Tarcísio vai promover um distanciamento lento e gradual, até que ninguém mais associe o seu nome ao do ex-presidente. Por acaso alguém se lembra que ele estreou no governo pelas mãos de Dilma Rousseff? E que coordenou o Programa de Parceria de Investimentos durante a gestão de Michel Temer?

Pois é.