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Oposição: procura-se um líder

Nestes primeiros meses de Lula, vê-se uma oposição ainda comedida, embora o Congresso seja claramente dominado por políticos de centro e de direita

Marcos Pereira aponta que os governadores Romeu Zema, Tarcísio Freitas e Ratinho Júnior podem ocupar o vácuo deixado pelo ex-mandatário (Marcos Corrêa/PR/Flickr)
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Da Redação

Publicado em 13 de março de 2023 às 14h38.

Aluizio Falcão Filho

Há pessoas, na classe política, que foram talhadas para a oposição: argutas, combativas e com uma crítica sempre na ponta da língua. Foi o caso, por exemplo, da ex-primeira-dama dos Estados Unidos, Eleanor Roosevelt. Ela dizia: “Eu passei muitos anos da minha vida na oposição e prefiro desempenhar esse papel”. Estrela de um programa de rádio nos anos 1940, ela se opunha a determinadas medidas do governo de Franklin Delano Roosevelt, seu marido, e fazia questão de divulgar suas opiniões. Era comedida nessas alfinetadas. Mas, após a morte de FDR, passou a soltar o verbo em suas transmissões radiofônicas aos domingos à noite.

No Brasil, no entanto, o papel de opositor é algo raro. O Congresso, dominado pelo Centrão, parece estar sempre exercendo uma posição dúbia: apertar o governo para obter vantagens na forma de verbas ou cargos na administração pública. Não enxergamos, desde que Eduardo Cunha foi cassado, uma Câmara Federal que prima pelo antagonismo em relação ao Planalto.

No início do mandato de Jair Bolsonaro, ainda no calor da Operação Lava-Jato, a esquerda não teve muita força para combater o governo. Ganhou apenas fôlego ao final do governo, quando a economia diminuiu sua força e a inflação começou a crescer. Mesmo assim, os clamores oposicionistas só se incendiaram durante a campanha – e Luiz Inácio Lula da Silva venceu por uma margem bastante pequena.

Nestes primeiros meses de Lula, vê-se uma oposição ainda comedida, embora o Congresso seja claramente dominado por políticos de centro e de direita. Neste cenário, criou-se um vácuo político: os opositores não têm um líder definido.

Em tese, esse papel caberia a Bolsonaro. O candidato derrotado nas últimas eleições é aquele que tem o maior recall na cabeça dos eleitores para desempenhar essa função. Mas o ex-presidente se refugiou em Orlando, nos Estados Unidos, desde o dia 30 de dezembro. O presidente do Republicanos, Marcos Pereira, que estava na base do governo anterior, deu uma entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, na qual colocou o dedo na ferida. Perguntado se Bolsonaro era o líder da oposição, ele respondeu na lata: “Acho que não, porque se fosse líder da oposição, ele teria de fazer oposição aqui no Brasil. Ele é um turista nos Estados Unidos”. E sobre quem estaria liderando a oposição nos dias de hoje? “Eu acho que está vago. Você só faz oposição presente. Você tem de estar presente para fazer oposição”, afirmou Pereira.

Bolsonaro até poderia ter voltado antes ao Brasil, mas o escândalo sobre as jóias recebidas nos Emirados Árabes e trazidas de forma irregular ao país adiou o retorno. E, de adiamento em adiamento, o ex-presidente vai perdendo capital político (já desgastado pelo episódio dos presentes recebidos no Oriente Médio).

Marcos Pereira aponta que os governadores Romeu Zema, Tarcísio Freitas e Ratinho Júnior podem ocupar o vácuo deixado pelo ex-mandatário. Mas, pelo que se percebe, o governador de São Paulo está empenhado em fazer uma boa gestão em seu mandato – e, por isso, criou pontes em direção ao governo federal. Assim, partir diretamente para a oposição prejudicaria sua estratégia inicial. Além disso, Tarcísio assumiu o Palácio dos Bandeirantes pensando em disputar a reeleição e, somente depois, planejar voos mais altos.

Zema e Ratinho, porém, já estão nessa fase: ambos exercem seu segundo mandato pelos estados em que atuam politicamente. Dos dois, porém, Zema é quem está arriscando falar de temas nacionais e cutucar o PT. Neste fim de semana, por exemplo, o governador mineiro afirmou que não vai deixar o Movimento dos Sem-Terra atuar em seu estado. “Nós fazemos questão de dar paz para o homem do campo através de uma segurança reforçada e inibindo qualquer tipo de invasão. Cerca existe para ser respeitada. Aqui em Minas, não vamos tolerar invasão. O homem do campo precisa de segurança e paz para trabalhar”, disse.

E Michele Bolsonaro? Se depender do presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, a ex-primeira-dama vai entrar com tudo na política. Para isso, ela está liderando o PL Mulher. Só que o escândalo das jóias a chamuscou politicamente. Mesmo assim, ela divulgou um vídeo no Dia Internacional da Mulher. Com bastante desinibição, ela mostrou que tem potencial, mas ficou muito na seara religiosa, aparentemente a temática na qual se sente confortável. Para entrar de vez no cenário político e liderar a oposição, no entanto, vai precisar de muito preparo, que só se acumula com o tempo. E, por enquanto, precisa enfrentar uma resistência doméstica – seu marido. Como disse Marcos Pereira sobre o futuro político de Michele, “entre o desejo e as condições, tem um caminho a ser percorrido”.

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No Brasil, no entanto, o papel de opositor é algo raro. O Congresso, dominado pelo Centrão, parece estar sempre exercendo uma posição dúbia: apertar o governo para obter vantagens na forma de verbas ou cargos na administração pública. Não enxergamos, desde que Eduardo Cunha foi cassado, uma Câmara Federal que prima pelo antagonismo em relação ao Planalto.

No início do mandato de Jair Bolsonaro, ainda no calor da Operação Lava-Jato, a esquerda não teve muita força para combater o governo. Ganhou apenas fôlego ao final do governo, quando a economia diminuiu sua força e a inflação começou a crescer. Mesmo assim, os clamores oposicionistas só se incendiaram durante a campanha – e Luiz Inácio Lula da Silva venceu por uma margem bastante pequena.

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Em tese, esse papel caberia a Bolsonaro. O candidato derrotado nas últimas eleições é aquele que tem o maior recall na cabeça dos eleitores para desempenhar essa função. Mas o ex-presidente se refugiou em Orlando, nos Estados Unidos, desde o dia 30 de dezembro. O presidente do Republicanos, Marcos Pereira, que estava na base do governo anterior, deu uma entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, na qual colocou o dedo na ferida. Perguntado se Bolsonaro era o líder da oposição, ele respondeu na lata: “Acho que não, porque se fosse líder da oposição, ele teria de fazer oposição aqui no Brasil. Ele é um turista nos Estados Unidos”. E sobre quem estaria liderando a oposição nos dias de hoje? “Eu acho que está vago. Você só faz oposição presente. Você tem de estar presente para fazer oposição”, afirmou Pereira.

Bolsonaro até poderia ter voltado antes ao Brasil, mas o escândalo sobre as jóias recebidas nos Emirados Árabes e trazidas de forma irregular ao país adiou o retorno. E, de adiamento em adiamento, o ex-presidente vai perdendo capital político (já desgastado pelo episódio dos presentes recebidos no Oriente Médio).

Marcos Pereira aponta que os governadores Romeu Zema, Tarcísio Freitas e Ratinho Júnior podem ocupar o vácuo deixado pelo ex-mandatário. Mas, pelo que se percebe, o governador de São Paulo está empenhado em fazer uma boa gestão em seu mandato – e, por isso, criou pontes em direção ao governo federal. Assim, partir diretamente para a oposição prejudicaria sua estratégia inicial. Além disso, Tarcísio assumiu o Palácio dos Bandeirantes pensando em disputar a reeleição e, somente depois, planejar voos mais altos.

Zema e Ratinho, porém, já estão nessa fase: ambos exercem seu segundo mandato pelos estados em que atuam politicamente. Dos dois, porém, Zema é quem está arriscando falar de temas nacionais e cutucar o PT. Neste fim de semana, por exemplo, o governador mineiro afirmou que não vai deixar o Movimento dos Sem-Terra atuar em seu estado. “Nós fazemos questão de dar paz para o homem do campo através de uma segurança reforçada e inibindo qualquer tipo de invasão. Cerca existe para ser respeitada. Aqui em Minas, não vamos tolerar invasão. O homem do campo precisa de segurança e paz para trabalhar”, disse.

E Michele Bolsonaro? Se depender do presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, a ex-primeira-dama vai entrar com tudo na política. Para isso, ela está liderando o PL Mulher. Só que o escândalo das jóias a chamuscou politicamente. Mesmo assim, ela divulgou um vídeo no Dia Internacional da Mulher. Com bastante desinibição, ela mostrou que tem potencial, mas ficou muito na seara religiosa, aparentemente a temática na qual se sente confortável. Para entrar de vez no cenário político e liderar a oposição, no entanto, vai precisar de muito preparo, que só se acumula com o tempo. E, por enquanto, precisa enfrentar uma resistência doméstica – seu marido. Como disse Marcos Pereira sobre o futuro político de Michele, “entre o desejo e as condições, tem um caminho a ser percorrido”.

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