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O vereador de Caxias é exemplo de um Brasil que não deveria mais existir

Em todos os meus anos de vida nunca vi alguém se expressar de forma tão vil e intolerante como o vereador Sandro Fantinel, de Caxias do Sul

 (TV Câmara de Caxias do Sul/YouTube)
(TV Câmara de Caxias do Sul/YouTube)
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Money Report – Aluizio Falcão Filho

Publicado em 2 de março de 2023 às, 14h00.

Nasci em Recife e vim pequeno para São Paulo. Falo sem sotaque e conheço bem a história paulistana, em especial os bairros onde fui criado. Minha mãe, ao contrário, abria a boca e todos percebiam que ela não era daqui. Por isso, era alvo de alguns comentários jocosos por conta de sua origem. Quando adulto, muitas pessoas vinham falar comigo e, casualmente, soltavam uma estocada preconceituosa nos nordestinos. Diante disso, eu respondia sempre do mesmo jeito: “Você sabia que eu sou pernambucano?”. Diante dessa resposta, os interlocutores que transbordavam preconceito, ficavam muito sem graça. Alguns até arriscavam dizer que eu “nem parecia ser nordestino” – como se isso fosse um elogio.

Bem, em todos os meus anos de vida nunca vi alguém se expressar de forma tão vil e intolerante como o vereador Sandro Fantinel, de Caxias do Sul. Ele subiu à tribuna da Câmara para falar sobre o caso das vinícolas gaúchas que tinham trabalhadores baianos sob condições análogas à escravidão. O vereador, cujo sobrenome é o mesmo de um prosecco italiano, pediu aos produtores da região que “não contratassem mais aquela gente lá de cima” e que “a única cultura que os baianos têm é viver na praia tocando tambor”. Sugeriu ainda que, daqui para frente, os vinicultores só chamassem para trabalhar argentinos, que seriam “limpos, trabalhadores e corretos”. A mensagem subliminar, aqui, seria a de que os nordestinos seriam sujos, vagabundos e trapaceiros.

No livro “O Sol é para Todos” (“To Kill a Mockingbird”), de Harper Lee, um homem negro é preso e acusado de estupro pela filha de um fazendeiro. O advogado Atticus Finch (vivido no cinema por Gregory Peck, em um filme absolutamente fabuloso) é apontado para defendê-lo e acaba desbaratando a acusação, baseada apenas no preconceito.

Um dos personagens, Dolphus Raymond, comenta o julgamento da seguinte forma: “Chore pelo simples inferno que as pessoas causam a outras pessoas – sem nem mesmo pensar. Chore pelo inferno que os brancos oferecem aos negros, sem nem parar para pensar que eles também são gente”.

Esses agricultores foram submetidos a violências como espancamentos, choques elétricos, tiros de bala de borracha e ataques com spray de pimenta. Quando lembramos isso, podemos substituir, na frase do livro (em inglês, o título original quer dizer “a perda da inocência”), “negros” por “baianos” – e teremos um retrato perfeito do que ocorria na região.

Fazendeiros que açoitam pessoas como animais fazem parte de um grupo em extinção: gente que se sente impune e superior às classes baixas. É inadmissível que, em pleno Século 21, ocorra algo do gênero.

O Patriotas, diante das barbaridades proferidas, expulsou o vereador Fantinel de seus quadros. Agora, é a vez de a Justiça entrar em campo e dar o exemplo. Precisamos varrer de nosso país esse tipo de comportamento tóxico e abusivo. E banir o preconceito que nos assola como uma doença, como demonstra as atitudes desse vereador obtuso, intransigente e torpe.