E se Geraldo Alckmin não tivesse se candidatado à presidência?
Ingressamos em uma zona de conflitos que ainda não terminou
Publicado em 16 de dezembro de 2020 às, 10h50.
Quem analisava os números das redes sociais no primeiro semestre de 2018 percebia duas coisas. A primeira era o engajamento fortíssimo e a tração que a candidatura de Jair Bolsonaro ganhara desde abril. A segunda: o candidato Geraldo Alckmin estava empacado e não conseguia sair do lugar. A falta de envolvimento dos eleitores era impressionante, seja pelo pequeno número de seguidores ou pelo diminuto “buzz” em torno do nome do ex-governador (poucas buscas no Google e, o que é pior, número ínfimo de críticas ou elogios – ou seja, o eleitor simplesmente não tinha sequer interesse em comentar qualquer coisa sobre o candidato).
Entre abril e junho, algumas pessoas se aproximaram de Alckmin para demovê-lo de sua candidatura. Mas o governador foi em frente e teve um resultado pífio. Obteve 5 milhões de votos, contra 35 milhões obtidos por Aécio Neves na primeira etapa do pleito anterior. Quando Alckmin foi candidato em 2006, terminou o primeiro turno com 39,9 milhões de votos (no segundo, perdeu 2,4 milhões de sufrágios, convencendo apenas 37,5 milhões de eleitores).
A votação de Alckmin na arena nacional mostrou que o PT não foi o único a se machucar com o escândalo do Mensalão – Aécio e muitos tucanos também saíram chamuscados do processo e isso se manifestou em um emagrecimento eleitoral.
Mesmo enfrentando este cenário adverso, o então ex-governador poderia amealhar votos significativos se estivesse concorrendo à Câmara ou ao Senado. Haveria seguramente chances concretas de ocupar uma das cadeiras de senador ou obter um mandato de deputado federal com votação expressiva.
Mas Alckmin preferiu encarar uma eleição presidencial, motivado até por cientistas políticos que lhe eram simpatizantes. Esses analistas acreditavam em duas coisas. A primeira é que a dianteira de Jair Bolsonaro derreteria no segundo semestre. Além disso, que o Brasil entraria em uma fase na qual o centro e a ponderação seriam características importantes para o eleitor – e Geraldo Alckmin poderia personificar como ninguém essa tendência.
O que se observou, no entanto, foi o contrário. Ingressamos em uma zona de conflitos que ainda não terminou. Em 2018, essa briga foi representada pelo próprio Bolsonaro e Fernando Haddad, trazendo novamente a velha dicotomia direita versus esquerda.
Caso o governador tivesse sido convencido a não concorrer à presidência, onde ele estaria hoje? Seria certamente um senador ou um deputado com votação significativa. Ou seja, hoje, Alckmin teria votos o suficiente para pleitear a presidência em qualquer uma das casas, sucedendo a Davi Alcolumbre ou a Rodrigo Maia.
No entanto, o ex-governador está à margem do cenário político. Quando ocupava o Palácio dos Bandeirantes já era uma pessoa discreta. Agora, distante do poder, nem se fala. Mas talvez esse médico anestesista de Pindamonhangaba passe à história como um grande enigma. Como alguém que foi julgado com indiferença na última eleição presidencial conseguiu ser eleito tantas vezes para um cargo importante como o de governador de São Paulo?
Em 2018, no primeiro turno presidencial, Alckmin obteve pouco mais que 8 % dos votos válidos nas urnas paulistas, ficando atrás de Jair Bolsonaro, Fernando Haddad e Ciro Gomes. Na última eleição, ele evidentemente sofreu o desgaste de vários anos em frente à administração estadual e a acusações de corrupção junto ao seu partido, o PSDB, especialmente em relação à construção do Rodoanel.
Mesmo assim, era de se esperar uma performance melhor.
Qual será o caminho do ex-governador em 2022? Ele terá 70 anos durante as próximas eleições e, assim, precisa dar um tiro certeiro. João Doria afirmou que é contra a reeleição e quer concorrer contra Bolsonaro – mas, em política, esse tipo de declaração não se escreve na pedra. De início, há duas opções para Alckmin, ambas arriscadas: tentar ser o sucessor de Doria ou concorrer à vaga de senador que se abrirá, hoje nas mãos de José Serra. O caminho mais seguro, dessa forma, seria o de deputado federal, para o qual ele teria uma base eleitoral no interior extremamente sólida.
Para recuperar sua liderança nacional, no entanto, Alckmin deveria mostrar ao público quem ele é na esfera privada: um sujeito boa praça, que gosta de contar causos e com grande habilidade para costurar apoios. Esse personagem da vida real precisa tomar o lugar da imagem construída para consumo externo, que passou por tantas sessões de fonoaudiologia e de “media training” e perdeu a espontaneidade.
Conseguirá Alckmin reconstruir sua trajetória política aos 70 anos? Ele terá êxito em escapar das denúncias de corrupção que sacudem o PSDB (é importante salientar que o ex-governador depende totalmente de suas atuais fontes de renda como professor para sobreviver)? E o mais importante: ele vai ter condições de mostrar sua verdadeira personalidade ao eleitor, livrando-se da pecha de “picolé de chuchu”?
Com a palavra, Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho.