Cristiano Ronaldo, Pogba e os riscos do marketing baseado em celebridades
Volta e meia, alguma coisa dava errado na estratégia de marketing – mas nunca algo como se viu nesta semana com as entrevistas promovidas pela UEFA
Da Redação
Publicado em 17 de junho de 2021 às 12h28.
Por Aluizio Falcão Filho
Desde que a publicidade começou a mostrar resultados concretos e catapultar vendas pelo mundo inteiro, uma fórmula vencedora passou a ser utilizada para promover produtos – o uso de celebridades em campanhas publicitárias. Com o crescimento da indústria cinematográfica, surgiram os primeiros casos de rostos que eram reconhecidos mundialmente e, assim, anúncios e comerciais de TV que poderiam ser utilizados em todo o planeta, com resultados significativos.
Passou o tempo e dois mercados se destacaram fortemente além do cinema, ganhando notoriedade mundial: a música e os esportes. Os astros musicais começaram a ganhar mais importância nos anos 1980. Um exemplo disso foi a utilização de Michael Jackson como garoto-propaganda da Pepsi na primeira metade dos anos 1980. Naquela época, a empresa percebeu que teria de investir em crianças e nos adolescentes para conquistar fatias importantes de mercado perante o arquirrival, a Coca-Cola.
Ao surfar na crescente popularidade de Jackson (e ajudada por uma estratégia equivocada do oponente em lançar uma Coca com sabor de Pepsi, a New Coke), a companhia então comandada por Roger Enrico conseguiu o que parecia impossível: liderou o mercado americano de refrigerantes. Por alguns meses, é verdade, mas conseguiu desbancar o inimigo do lugar mais alto do pódio.
Jackson, no entanto, sofreu um acidente ao gravar um comercial. Seu cabelo pegou fogo por conta dos fogos de artifício soltados próximos a ele no palco. Esse incidente acabou respingando na reputação do refrigerante. Anos mais tarde, a Pepsi contrataria Madonna para uma campanha de peso. Mas ela gravou um vídeo polêmico para a música “Like a Prayer” e criou outra discórdia para a marca.
A partir dos anos 1990, os grandes anunciantes foram investindo quantias cada vez mais superlativas no esporte. E, desta vez, com uma vantagem. Em vez de simplesmente contratar um atleta para emprestar sua imagem, os anunciantes começaram a patrocinar equipes e torneios. Com isso, conseguiam uma espécie de endosso indireto para seus produtos, com a vantagem de estar em um contexto maior de comunicação, inserido no calendário de competições internacionais.
Volta e meia, alguma coisa dava errado nesta estratégia – mas nunca algo como se viu nesta semana com as entrevistas coletivas promovidas pela UEFA durante a Eurocopa. Primeiro, Cristiano Ronaldo retirou duas garrafas de Coca-Cola do alcance das câmeras. Depois, levantou outro vasilhame, este com H2O, e disse: “Água”. Ontem, foi a vez de Pogba, em outra coletiva da UEFA, ter uma atitude semelhante: retirou uma garrafinha de Heineken zero álcool de sua frente, a escondendo embaixo da mesa.
Essas duas atitudes denotam os atletas mudaram seu comportamento, se compararmos com o de outros astros de tempos atrás. Eles sabem que são as estrelas dos eventos esportivos e nada recebem para promover, mesmo que indiretamente, produtos que têm contrato com a organização de disputas, partidas ou campeonatos. Por isso, criar esse tipo de saia justa é um protesto que tem o apoio de seus colegas de profissão.
Além disso, estamos em um momento no qual todos fazem questão de manifestar suas opiniões sobre tudo. No caso do futebolista português, ele já havia dado declarações segundo as quais criticava o consumo de álcool e de cigarros – e reclamava em especial do filho, que tinha o hábito de beber refrigerantes. Ou seja, era de se esperar que ele poderia fazer algo do gênero. Mas ninguém botou fé nisso.
Ou seja, CR7 manifestou sua opinião pessoal e externou suas críticas, algo que parece ser inédito na história do futebol mundial. Daqui para frente, porém, esse tipo de comportamento será cada vez mais comum. Especialmente quando lembramos que os jogadores que atuam na Europa são ricos, independentes e idolatrados. Dificilmente um dirigente esportivo os obrigará a endossar (ainda que indiretamente) um produto que não passaria por seus crivos pessoais.
De agora em diante, as decisões de patrocínio esportivo terão de atravessar um filtro importante – o do risco de uma crise de relações públicas, como foi o episódio da Coca-Cola e Cristiano Ronaldo, suficiente para que a empresa sofresse uma queda na cotação de suas ações nas bolsas de valores.
É literalmente impossível saber o que pode rolar em uma coletiva de imprensa. Portanto, uma estratégia deve ser desenhada para esse tipo de situação. A reação da Coca-Cola, que minimizou o assunto, foi tirada do manual de gerenciamento de crises. É a melhor saída? Talvez não. Nessas horas, o bom humor sempre é uma solução melhor – e abre espaço para uma volta por cima a ser magnificada pelas redes sociais. Mas, em uma corporação multibilionária, alguém tem coragem de deixar o manual de lado e investir em uma resposta bem-humorada? Talvez não.
Por Aluizio Falcão Filho
Desde que a publicidade começou a mostrar resultados concretos e catapultar vendas pelo mundo inteiro, uma fórmula vencedora passou a ser utilizada para promover produtos – o uso de celebridades em campanhas publicitárias. Com o crescimento da indústria cinematográfica, surgiram os primeiros casos de rostos que eram reconhecidos mundialmente e, assim, anúncios e comerciais de TV que poderiam ser utilizados em todo o planeta, com resultados significativos.
Passou o tempo e dois mercados se destacaram fortemente além do cinema, ganhando notoriedade mundial: a música e os esportes. Os astros musicais começaram a ganhar mais importância nos anos 1980. Um exemplo disso foi a utilização de Michael Jackson como garoto-propaganda da Pepsi na primeira metade dos anos 1980. Naquela época, a empresa percebeu que teria de investir em crianças e nos adolescentes para conquistar fatias importantes de mercado perante o arquirrival, a Coca-Cola.
Ao surfar na crescente popularidade de Jackson (e ajudada por uma estratégia equivocada do oponente em lançar uma Coca com sabor de Pepsi, a New Coke), a companhia então comandada por Roger Enrico conseguiu o que parecia impossível: liderou o mercado americano de refrigerantes. Por alguns meses, é verdade, mas conseguiu desbancar o inimigo do lugar mais alto do pódio.
Jackson, no entanto, sofreu um acidente ao gravar um comercial. Seu cabelo pegou fogo por conta dos fogos de artifício soltados próximos a ele no palco. Esse incidente acabou respingando na reputação do refrigerante. Anos mais tarde, a Pepsi contrataria Madonna para uma campanha de peso. Mas ela gravou um vídeo polêmico para a música “Like a Prayer” e criou outra discórdia para a marca.
A partir dos anos 1990, os grandes anunciantes foram investindo quantias cada vez mais superlativas no esporte. E, desta vez, com uma vantagem. Em vez de simplesmente contratar um atleta para emprestar sua imagem, os anunciantes começaram a patrocinar equipes e torneios. Com isso, conseguiam uma espécie de endosso indireto para seus produtos, com a vantagem de estar em um contexto maior de comunicação, inserido no calendário de competições internacionais.
Volta e meia, alguma coisa dava errado nesta estratégia – mas nunca algo como se viu nesta semana com as entrevistas coletivas promovidas pela UEFA durante a Eurocopa. Primeiro, Cristiano Ronaldo retirou duas garrafas de Coca-Cola do alcance das câmeras. Depois, levantou outro vasilhame, este com H2O, e disse: “Água”. Ontem, foi a vez de Pogba, em outra coletiva da UEFA, ter uma atitude semelhante: retirou uma garrafinha de Heineken zero álcool de sua frente, a escondendo embaixo da mesa.
Essas duas atitudes denotam os atletas mudaram seu comportamento, se compararmos com o de outros astros de tempos atrás. Eles sabem que são as estrelas dos eventos esportivos e nada recebem para promover, mesmo que indiretamente, produtos que têm contrato com a organização de disputas, partidas ou campeonatos. Por isso, criar esse tipo de saia justa é um protesto que tem o apoio de seus colegas de profissão.
Além disso, estamos em um momento no qual todos fazem questão de manifestar suas opiniões sobre tudo. No caso do futebolista português, ele já havia dado declarações segundo as quais criticava o consumo de álcool e de cigarros – e reclamava em especial do filho, que tinha o hábito de beber refrigerantes. Ou seja, era de se esperar que ele poderia fazer algo do gênero. Mas ninguém botou fé nisso.
Ou seja, CR7 manifestou sua opinião pessoal e externou suas críticas, algo que parece ser inédito na história do futebol mundial. Daqui para frente, porém, esse tipo de comportamento será cada vez mais comum. Especialmente quando lembramos que os jogadores que atuam na Europa são ricos, independentes e idolatrados. Dificilmente um dirigente esportivo os obrigará a endossar (ainda que indiretamente) um produto que não passaria por seus crivos pessoais.
De agora em diante, as decisões de patrocínio esportivo terão de atravessar um filtro importante – o do risco de uma crise de relações públicas, como foi o episódio da Coca-Cola e Cristiano Ronaldo, suficiente para que a empresa sofresse uma queda na cotação de suas ações nas bolsas de valores.
É literalmente impossível saber o que pode rolar em uma coletiva de imprensa. Portanto, uma estratégia deve ser desenhada para esse tipo de situação. A reação da Coca-Cola, que minimizou o assunto, foi tirada do manual de gerenciamento de crises. É a melhor saída? Talvez não. Nessas horas, o bom humor sempre é uma solução melhor – e abre espaço para uma volta por cima a ser magnificada pelas redes sociais. Mas, em uma corporação multibilionária, alguém tem coragem de deixar o manual de lado e investir em uma resposta bem-humorada? Talvez não.