Com o Fundão, o rabo balança o cachorro na política partidária
Obter a presidência sempre foi o sonho de qualquer dirigente partidário. Mas, desde 2018, muitas siglas parecem ter deixado essa ambição de lado
Publicado em 1 de junho de 2022 às, 14h39.
Aluizio Falcão Filho
Desde que a democracia foi reinstalada no Brasil, os partidos políticos quiseram eleger candidatos a presidente da República. Alguns partidos pequenos, inclusive, conseguiram fazê-lo – o PRN, com Fernando Collor, e o PSL, com Jair Bolsonaro. Entre essas duas eleições, no entanto, o PSDB ganhou duas vezes e o PT quatro (o MDB herdou o Planalto quando Dilma Rousseff sofreu o impeachment).
Obter a presidência sempre foi o sonho de qualquer dirigente partidário. Mas, desde 2018, muitas siglas parecem ter deixado essa ambição de lado. A razão para isso está na criação do Fundão Eleitoral, que distribui verbas para custear as eleições. O cálculo de distribuição deste fundo privilegia o número de deputados federais de cada partido (80 % da verba total é distribuída de acordo com esse critério). Por conta disso, as agremiações políticas resolveram inverter as prioridades e dar mais importância à campanha dos deputados que a de presidente. Na prática, o rabo está balançando o cachorro.
A ideia inicial, assim, é se aliar a algum candidato com grande volume de intenções de voto. Se isso não for possível, a ideia é encontrar um postulante neutro, que não respingue rejeições em quem se candidata à Câmara. Ou não lançar ninguém na corrida ao Planalto.
Na prática, esse foi o argumento produzido pelo PSDB e levado ao ex-governador João Doria para justificar o abandono à candidatura que venceu as prévias partidárias em novembro. Segundo os caciques tucanos, a rejeição de Doria poderia prejudicar a campanha dos deputados que buscam seu lugar no Parlamento – e que uma coligação com a senador Simone Tebet, seria melhor para todos.
Como se sabe, logo após a renúncia de Doria, o partido passou a cogitar uma candidatura própria, deixando o apoio a Tebet na geladeira. A própria senadora também viu sua candidatura começar a sofrer defecções, pois uma parte de seu partido vai apoiar o presidente Jair Bolsonaro.
O fato é que, por uma questão financeira, a prioridade total das siglas passou a ser a Câmara, tradicionalmente dominada pelos políticos do Centrão.
É aqui que se junta a fome com a vontade de comer. Afinal, nos últimos tempos, o Congresso vem ganhando protagonismo e liderando temas que seriam tradicionalmente propostos pelo Executivo – como ocorreu, por exemplo, nas discussões sobre a Reforma Trabalhista, que ainda não saiu do campo das ideias.
Recentemente, o presidente da Câmara, Arthur Lira, falou sobre o tema em um reunião de empresários em Nova York. Ele disse: “O centro tem feito a moderação que evita os extremos; lutamos para que os poderes se autocontenham. O Brasil continuará um país de centro direita, independente do resultado das eleições presidenciais. Teremos cerca de 300 parlamentares alinhados com essa corrente”.
Mas Lira foi adiante: “Na prática, a Constituição é parlamentarista. Em um país como o nosso, em que o presidente precisa de 70 milhões de votos, fica difícil votar matérias difíceis. Assim, com o parlamentarismo, o presidente escolheria o primeiro-ministro, que lidaria com essas questões, e ele sofreria um ônus menor”, disse.
Esse contexto, na prática, veio contribuir para que a polarização entre os candidatos Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva se exacerbasse. Vários partidos que poderiam fazer uma campanha presidencial séria resolveram se retirar da disputa e trabalhar apenas para tentar elevar sua presença no Parlamento. Ou lançar nomes que pouco podem interferir na disputa presidencial (a candidatura de Luciano Bivar pela União Brasil, se vingar, é um exemplo disso). Essa neutralidade pode até trazer resultados de curto prazo para os partidos. Mas, de outro, deve enfraquecer a imagem dessas siglas no médio e no longo prazo.
É tudo o que o Brasil não precisa: um número altíssimo de agremiações fracas, sem personalidade e sem ideologia.