Bruno Covas é o herdeiro político de Alckmin?
A discrição dos dois é notável e o estilo de montar equipes homogêneas é bastante parecido
Publicado em 17 de novembro de 2020 às, 08h10.
Última atualização em 17 de novembro de 2020 às, 08h11.
Ambos são comedidos e raramente abordam eleitores espontaneamente. Têm suas carreiras indelevelmente ligadas a Mario Covas. Foram deputados federais com boa votação e cumpriram mandatos discretos. Há várias semelhanças entre Bruno Covas e Geraldo Alckmin. Por isso, talvez o prefeito seja o verdadeiro herdeiro político de Alckmin e não o governador João Doria, como muitos pensam.
A discrição dos dois é notável e o estilo de montar equipes homogêneas é bastante parecido. Essa aversão aos holofotes, por sinal, foi um dos fatores que levaram Alckmin à derrota quando disputou a prefeitura. Ele era tão desconhecido do grande público que, ao chegar na produtora onde gravaria sua propaganda eleitoral, a recepcionista não sabia de quem se tratava e perguntou com quem ele gostaria de falar. Depois de mencionar o nome do responsável pela gravação, a moça perguntou quem era ele. Até nessa hora, o ex-governador manteve o comedimento: “Ora, o candidato”.
Bruno Covas segue uma trilha parecida. Tanto que seu nome era desconhecido da maioria dos paulistanos até o início da pandemia. Já fazia um ano e meio que João Doria deixara a prefeitura, mas seu sucessor não buscou uma ribalta para trombetear sua administração. Como Alckmin, preferiu ficar na quietude.
O estilo de governar também tem suas semelhanças. Os dois ouvem muito a equipe e tomam suas decisões apenas depois de ouvir assessores e secretários. Mas são dados a rompantes nos quais tomam medidas autorais, como é comum em quem ocupa posições de destaque no poder público.
Pode-se dizer que atuação parlamentar de ambos também tenha sido pautada pela discrição e que os dois desembarcaram em Brasília muito novos. Covas tinha 34 anos quando conquistou seu primeiro mandato. Já Alckmin estava com 35 anos.
Como se não bastasse, a trajetória de ambos está marcada pelo governador João Doria. O prefeito era vice do atual governador. E o ex-governador foi quem patrocinou a entrada de Doria na política, furando a fila de candidatos em potencial do PSDB, que esperavam pacientemente a sua vez para encabeçar a chapa municipal.
Covas e Alckmin também enfrentaram tragédias pessoais que atraíram o apoio da sociedade. O ex-governador perdeu um filho em acidente de helicóptero. Já o prefeito recebeu a solidariedade de uma multidão de paulistanos quando se soube que era tinha câncer na cárdia, entre o estômago e o esôfago.
Por conta do jeito controlado, os dois são constantemente subestimados. Mas Alckmin, apesar de suas derrotas (duas concorrendo a prefeito e duas a presidente), foi três vezes governador de São Paulo, o que o torna, ao lado de Adhemar de Barros, o político que mais ocupou esse cargo. Covas, de forma quase silenciosa, está no segundo turno e tem enormes chances de reeleição.
Há, no entanto, algumas diferenças.
Alckmin exalta a modéstia e fala com didatismo. Já Covas usa um tom altivo ao se manifestar e parece não ter muita paciência para explicar as coisas. No item vestuário, também há uma distância enorme entre os dois. Enquanto o ex-governador faz a linha “tiozão”, com calças de cós alto e corte largo, daquelas que fizeram sucesso nos anos 1980 e 1990, o prefeito é adepto do guarda-roupa moderno, com calças justas, blazers casuais e sapatênis. Quando apresentados a alguém novo, Covas é mais solto que Alckmin. Mas o ex-governador é um exímio narrador de causos da política paulista e mineira, os quais conta sem cerimônia depois de um certo convívio com o interlocutor. Em um determinado momento do passado, adorava contar histórias de seu tio-avô, o ex-vice-presidente da República José Maria Alkmin.
Certa vez, o ex-ministro Nelson Jobim definiu o estilo de Geraldo Alckmin fazer política, dizendo que o ex-governador jogava parado. Todos se movimentavam freneticamente e ele, com calma, ia esperando o momento certo para agir. Talvez Bruno Covas tenha aprendido em silêncio esta preciosa lição. E, caso seja reeleito em 29 de novembro, poderá – se não houver percalços em seu caminho – cogitar voos maiores, como o governo do estado, reeditando a saga de seu avô, também prefeito da capital e governador.