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A barafunda jurídica em torno da LGPD aprovada pelo Senado

Ficara a dúvida para o Senado: se é para instaurar uma lei sem determinar os devidos castigos pela desobediência, para que implementá-la?

Senado: casa já havia tomado decisões controversas como votou o tabelamento de juros e do financiamento dos cartões de crédito (Adriano Machado/Reuters)
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felipegiacomelli

Publicado em 27 de agosto de 2020 às 08h52.

Os políticos brigam e quem fica de olho roxo é o empresariado. Anteontem, a Câmara havia resolvido que a implementação da Lei Geral de Proteção de Dados tinha sido adiada para janeiro de 2021. Os empresários, com a cabeça cheia em função da pandemia e seu cenário econômico adverso, suspiraram aliviados. Ontem, no entanto, o Senado votou a matéria, mostrando uma eficiência poucas vezes vista nos anais legislativos. E decidiu que a LGPD entrará em vigor a partir de uma sanção presidencial – mas, como diria minha filha de 12 anos, hashtag-só-que-não. Multas e punições serão aplicadas apenas em agosto de 2021. De todo o modo, vamos supor que a LGPD entre em vigor em até quinze dias, prazo que o presidente Jair Bolsonaro tem para sancionar a nova regra.

Se é para instaurar uma lei sem determinar os devidos castigos pela desobediência, para que implementá-la? Ou melhor, vamos retroceder algumas casas: por que refutar a decisão já tomada pela Câmara Federal?

Já faz um tempo que o Congresso está dividido. Deputados e senadores não falam a mesma língua e as duas casas legislativas tocam agendas diferentes. O Senado, por exemplo, votou o tabelamento de juros e do financiamento dos cartões de crédito. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, simplesmente engavetou a proposta, que jamais foi levada à pauta. Em relação ao veto presidencial que proibia aumentos do funcionalismo público, algo imprescindível para o Executivo fechar as contas públicas, os senadores chutaram o balde e deixaram a porta aberta para que o teto de gastos estatais fosse ultrapassado. A medida, no entanto, esbarrou na Câmara, que manteve a proibição presidencial.

Ontem, as casas parlamentares voltaram a mostrar que têm agendas distintas. Segundo observadores mais atentos do que se passa em Brasília, o Senado resolveu retaliar suas duas deliberações ignoradas pelos deputados, mudando uma decisão que estava totalmente alinhada com os anseios de empresários e executivos (apelou-se para uma questão técnica qualquer e a votação da Câmara foi para o espaço).

Para não criar revolta no mundo empresarial, porém, manteve-se o salvo-conduto até agosto do ano que vem. Esse compromisso será honrado até lá? Há vários empresários que se mostram preocupados com punições imediatas. Uma das maiores autoridades nacionais no assunto, o advogado Renato Opice Blum, acredita que a questão possa parar nos tribunais. “Organizações de defesa do consumidor, por exemplo, podem ter uma interpretação diferente do texto e ir à Justiça contra as empresas”, afirma o jurista.

Muitos especialistas em LGPD afirmam que se uma empresa está em compliance com série de regras de governança, a adaptação às novas regras será bastante fácil – e que há tempo de sobra para se adaptar ao cenário de proteção aos dados e informações.

Quantas empresas estão em conformidade com a nova lei? Há um ano, os experts arriscavam dizer que este índice estava em 15 % dos CNPJs nacionais. “Hoje, cerca de 25 % das companhias estão alinhadas com a lei”, diz Opice Blum. “Pode parecer um percentual baixo, mas, na Europa, quando o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados passou a valer, só uma em cada cinco empresas estava preparada para as novas regras”.

É de se esperar que a decisão do Senado seja contestada. Qualquer partido político pode encaminhar um questionamento ao Supremo Tribunal Federal e tentar invalidar a votação na Câmara Alta. Um dos pontos de discórdia está na ausência de um órgão regulador. A lei prevê a criação de uma Autoridade Nacional de Proteção de Dados – e, no papel, isso foi feito no dia de hoje. O Diário Oficial publicou pela manhã, em sua página 6, o decreto 10 474, que aprova a estrutura da ANPD. Na prática, entretanto, esse órgão ainda não tem equipe para exercer suas funções. Se houver uma queixa, por exemplo, amanhã, não haverá a quem encaminhar a querela. Na solução encontrada pelos deputados, a lei entraria em vigor apenas em janeiro, dando tempo ao Executivo para montar o arcabouço legal que uma mudança dessas necessita.

Para variar, o Congresso novamente nos coloca diante de um cenário em que a insegurança jurídica se apresenta de forma abissal. Alguns políticos precisam entender de uma vez por todas que esse tipo de manobra pode até fustigar seus adversários – mas atingem severamente a economia do país e os empresários que precisam de um cenário estável para investir ou receber investimentos. Machucam o desenvolvimento e comprometem o futuro da Nação, sob desculpas esfarrapadas e um discurso demagógico que não leva a nada.

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Se é para instaurar uma lei sem determinar os devidos castigos pela desobediência, para que implementá-la? Ou melhor, vamos retroceder algumas casas: por que refutar a decisão já tomada pela Câmara Federal?

Já faz um tempo que o Congresso está dividido. Deputados e senadores não falam a mesma língua e as duas casas legislativas tocam agendas diferentes. O Senado, por exemplo, votou o tabelamento de juros e do financiamento dos cartões de crédito. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, simplesmente engavetou a proposta, que jamais foi levada à pauta. Em relação ao veto presidencial que proibia aumentos do funcionalismo público, algo imprescindível para o Executivo fechar as contas públicas, os senadores chutaram o balde e deixaram a porta aberta para que o teto de gastos estatais fosse ultrapassado. A medida, no entanto, esbarrou na Câmara, que manteve a proibição presidencial.

Ontem, as casas parlamentares voltaram a mostrar que têm agendas distintas. Segundo observadores mais atentos do que se passa em Brasília, o Senado resolveu retaliar suas duas deliberações ignoradas pelos deputados, mudando uma decisão que estava totalmente alinhada com os anseios de empresários e executivos (apelou-se para uma questão técnica qualquer e a votação da Câmara foi para o espaço).

Para não criar revolta no mundo empresarial, porém, manteve-se o salvo-conduto até agosto do ano que vem. Esse compromisso será honrado até lá? Há vários empresários que se mostram preocupados com punições imediatas. Uma das maiores autoridades nacionais no assunto, o advogado Renato Opice Blum, acredita que a questão possa parar nos tribunais. “Organizações de defesa do consumidor, por exemplo, podem ter uma interpretação diferente do texto e ir à Justiça contra as empresas”, afirma o jurista.

Muitos especialistas em LGPD afirmam que se uma empresa está em compliance com série de regras de governança, a adaptação às novas regras será bastante fácil – e que há tempo de sobra para se adaptar ao cenário de proteção aos dados e informações.

Quantas empresas estão em conformidade com a nova lei? Há um ano, os experts arriscavam dizer que este índice estava em 15 % dos CNPJs nacionais. “Hoje, cerca de 25 % das companhias estão alinhadas com a lei”, diz Opice Blum. “Pode parecer um percentual baixo, mas, na Europa, quando o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados passou a valer, só uma em cada cinco empresas estava preparada para as novas regras”.

É de se esperar que a decisão do Senado seja contestada. Qualquer partido político pode encaminhar um questionamento ao Supremo Tribunal Federal e tentar invalidar a votação na Câmara Alta. Um dos pontos de discórdia está na ausência de um órgão regulador. A lei prevê a criação de uma Autoridade Nacional de Proteção de Dados – e, no papel, isso foi feito no dia de hoje. O Diário Oficial publicou pela manhã, em sua página 6, o decreto 10 474, que aprova a estrutura da ANPD. Na prática, entretanto, esse órgão ainda não tem equipe para exercer suas funções. Se houver uma queixa, por exemplo, amanhã, não haverá a quem encaminhar a querela. Na solução encontrada pelos deputados, a lei entraria em vigor apenas em janeiro, dando tempo ao Executivo para montar o arcabouço legal que uma mudança dessas necessita.

Para variar, o Congresso novamente nos coloca diante de um cenário em que a insegurança jurídica se apresenta de forma abissal. Alguns políticos precisam entender de uma vez por todas que esse tipo de manobra pode até fustigar seus adversários – mas atingem severamente a economia do país e os empresários que precisam de um cenário estável para investir ou receber investimentos. Machucam o desenvolvimento e comprometem o futuro da Nação, sob desculpas esfarrapadas e um discurso demagógico que não leva a nada.

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