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Você está intoxicado até a medula de tanto alarmismo? Eis aqui um detox

Responda rápido: se você estivesse no mesmíssimo lugar que Bolsonaro, você acha que sairia muito melhor do que ele se saiu?

Presidente Jair Bolsonaro (Ueslei Marcelino/Reuters)
Presidente Jair Bolsonaro (Ueslei Marcelino/Reuters)
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Mario Rosa

Publicado em 15 de dezembro de 2020 às, 13h48.

Última atualização em 15 de dezembro de 2020 às, 13h49.

Responda rápido: se você estivesse no mesmíssimo lugar do presidente Bolsonaro no meio da maior pandemia do século, da maior crise econômica mundial em décadas, navegando num mar revolto, sem instrumentos e enfrentando uma tempestade no breu profundo, você acha que sairia muito melhor do que ele se saiu? E aqui não se trata de responder colocando simpatias ou antipatias como lente para chegar ao veredito. Você acha que sinceramente que alguém se sairia muitíssimo melhor? Segundo a última pesquisa Datafolha, destruído ele não está. É isso não é pouca coisa.

O fato é que chegamos ao fim deste ano sombrio e trágico para milhares de famílias brasileiras. Mas, quando olhamos o cenário político, vemos as mesmas picuinhas de sempre. E talvez não muito mais do que isso. E essa anormal normalidade da política é, sim, uma proeza nada desprezível do atual governo, goste-se dele ou não.

Vejamos o que aconteceu nos Estados Unidos, a maior democracia do mundo, em que Donald Trump teve o desconsolo de encarar uma reeleição justamente quando colidiu com a mesma pandemia e com os mesmos efeitos econômicos catastróficos da Covid 19 e, embora tenha eleito assembleias estaduais país afora, tenha reduzido a distância de assento na câmara baixa do Congresso e tenha carregado nas costas a eleição de um Senado que ainda pode ser republicano, acabou sucumbindo diante de tantas calamidades.

Aqui, o presidente Bolsonaro fez um cavalo de pau e confirmou uma velha mandinga da política brasileira. Mandou o dogmatismo econômico às favas e sua equipe ultra liberal entrará para a história como a que patrocinou o maior plano assistencial de todos os tempos no país. Como disse certa vez o ex-presidente José Sarney, um presidente não governa o tempo que governa. As circunstâncias podem ser determinantes para definir movimentos que, na teoria, seriam inimagináveis de serem praticados por quem os praticou.

A diferença é que a teoria é feita de linhas retas e a história contém essa variável, a do cavalo de pau.

Não foi Lula, o “sapo barbudo” radical do passado, que já antes de assumir convocou um ex-deputado tucano e ex-presidente mundial de um banco americano para ser o chefe de seu banco central? O presidente mais poderoso do regime militar, Ernesto Geisel, não foi o mesmo que começou a desmonta-lo, quando acabou com o AI-5, o ato que oficializava a ditardura?

O que tudo isso significa? Que 2020 na política poderia terminar muito pior e isso seria muito daninho para a economia e para os negócios. E não foi pior porque políticos são como bambu: dobram no limite de não quebrar. Alguns chamam isso de oportunismo, incoerência, etc, mas há algo de virtuoso nessa flexibilidade também.

Não vou ser negacionista e dizer que estamos no paraíso em Brasília, mas, considerando o tamanho do abalo, nossas instituições e nosso tecido social suportou melhor na prática do que muitos poderiam imaginar na teoria. Por que eu ressalto tudo isso? Porque já há muito alarmismo para você se intoxicar por aí. Considere um detox.