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Vergonha desnecessária sobre a OCDE

A não inclusão do Brasil entre os apoiados pelos EUA para a OCDE é uma humilhação ao governo brasileiro, que ficou cantando essa suposta vitória diplomática

BOLSONARO: ao encontrar com Trump recentemente na ONU, o presidente brasileiro chegou a declarar “I love you.”, no que não foi correspondido / REUTERS/Lucas Jackson
BOLSONARO: ao encontrar com Trump recentemente na ONU, o presidente brasileiro chegou a declarar “I love you.”, no que não foi correspondido / REUTERS/Lucas Jackson
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Joel Pinheiro da Fonseca

Publicado em 11 de outubro de 2019 às, 14h52.

Última atualização em 11 de outubro de 2019 às, 20h26.

A application para entrar na OCDE foi feita pelo Brasil em 2017, ainda no governo Temer. Era parte de uma reorientação da política externa brasileira, tirando-nos do equívoco que foi o alinhamento com o bolivarianismo latino-americano e a política de fechamento econômico. Foi ali também que se retomaram os projetos do acordo de salvaguardas tecnológicas com os EUA (base de Alcântara) e do acordo UE-Mercosul. O Brasil reemergia para o mundo com a sua melhor característica: o pragmatismo em busca do interesse próprio, negociando com todos e sempre buscando a paz e as soluções diplomáticas.

Nada impediria o governo americano de incluir o Brasil nos países cuja candidatura ele apoia para ingresso na OCDE (conforme a carta do secretário de Estado americano que vazou à imprensa, de 28 de agosto, apenas Argentina e Romênia). Nada impede que, no futuro, ele venha a fazê-lo. No presente, no entanto, ele não o fez. Integrantes do governo, especialmente o assessor de política externa do presidente, Filipe Martins, já vieram a público minimizar o fato. Supostamente, essa demora americana já estava nos planos (que o governo teria convenientemente esquecido de mencionar antes…) No entanto, o ministro Onyx Lorenzoni e integrantes do Ministério da Economia já deram vazão à sua frustração.

Para o governo brasileiro, que ficou meses cantando essa suposta vitória diplomática, é uma humilhação. E mostra a fraqueza e inconsistente da tal política externa “nacionalista” ou “anti-globalista” adotada por Bolsonaro. Um suposto nacionalismo que, desde o início, consistiu na bajulação do governo Trump. Lembremos que, ainda em janeiro, nosso chanceler veio a público oferecer uma base militar americana em solo brasileiro. Não faltaram elogios e ofertas ao governo americano. Ao encontrar com Trump recentemente na ONU, Bolsonaro chegou a declarar “I love you.”, no que não foi correspondido.

E nossa relação com o resto do mundo? Essa só piora. O governo Bolsonaro reverteu nossa política altiva e pragmática para dar um novo norte fortemente ideológico. Começamos comprando brigas e criando mal-estar com parceiros como China e países árabes. Mais recentemente, o desmatamento e queimadas na Amazônia serviram como motivo para queimar nossa relação com a França, pela conduta vergonhosa do governo brasileiro, com demais países europeus.

Assim, ficamos sem alternativa: ou tentamos nos colar aos EUA, ou seremos párias mundiais. Trump sabe disso. E portanto sabe que pode nos fazer de gato e sapato que a única reação do governo Bolsonaro será sorrir e pedir mais.

Não sou contrário a diversas das medidas tomadas pelo governo com relação aos EUA: o acordo da base de Alcântara trará ganhos para o Brasil, aceitar turistas americanos sem necessidade de visto também. São medidas que, acima de tudo, nos beneficiam. O problema está em tudo que estamos perdendo com o resto do mundo; lembrando que, se quisermos mesmo entrar na OCDE, precisaremos também do voto da França e outros. A retórica nacionalista e “antiglobalista” do governo enfraquece nossa posição no mundo e faz, domesticamente, promessas grandiloquentes que estão fadadas a fracassar. O acordo com a UE, como sabemos, está na berlinda.

Todo valor que é repetido com muita estridência costuma esconder uma conduta que o contradiz. O tão propalado “nacionalismo” do governo Bolsonaro significa subserviência ao governo Trump, a começar pela escolha do filho desqualificado – e loucamente apaixonado pelos EUA – para embaixador.

Até agora, os “amigos” de Bolsonaro não têm se dado muito bem. Macri vislumbra uma derrota quase certa na Argentina, Netanyahu é incapaz de formar uma coalização em Israel. Se Trump for derrotado ano que vem – ou se perder o mandato antes -, o Brasil estará realmente abandonado no mundo. Enquanto isso não acontece, seguimos sendo o cachorrinho de Trump, implorando por migalhas que ele, mesmo assim, reluta em dar.