Trump e as lições que vêm da Disney
Viajar a um grande complexo do entretenimento como a Disney World – como estou fazendo agora – é a chance de vivenciar na prática a diferença entre serviços privados e estatais, diferença que decorre dos diferentes incentivos dos dois setores. A posse de Donald Trump ocorrerá em poucos dias, e em meio à despedida um […]
Da Redação
Publicado em 12 de janeiro de 2017 às 18h35.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h27.
Viajar a um grande complexo do entretenimento como a Disney World – como estou fazendo agora – é a chance de vivenciar na prática a diferença entre serviços privados e estatais, diferença que decorre dos diferentes incentivos dos dois setores.
A posse de Donald Trump ocorrerá em poucos dias, e em meio à despedida um tanto melancólica de Obama, as instituições seguem funcionando normalmente, para o bem e para o mal. Nesses dias, tive contato direto com dois processos de averiguação e controle de passagem de pessoas: o controle de imigração na fronteira americana e a entrada nos parques da Disney.
Pode parecer esdrúxulo comparar as duas coisas, mas a função delas é similar. Restringir a entrada de pessoas a determinado espaço e garantir a segurança de quem está lá dentro. Em ambos, há o interesse de manter do lado de fora pessoas não autorizadas ou com más intenções. Ao mesmo tempo, há também o interesse de que pessoas cumpridoras das regras entrem. No caso do Disney, isso é seu próprio ganha-pão. Para os EUA, é de seu interesse que turistas entrem em seu território e consumam seus bens e serviços. Os turistas brasileiros, em particular, já foram designados como “walking stimulus packages” por uma empresa de lobby do setor do turismo.
Dito isso, é gritante a diferença na forma como conduzem essa função.
Na Disney, que faz controle não só de ingressos como também faz a vistoria de mochilas e bolsas (precaução redobrada depois do atentado em Ft. Lauderdale), a preocupação central é que os clientes passem por ali o mais rápido mais possível e que a experiência seja o menos desagradável possível. Por isso, o sistema já é todo automatizado, funcionários ajudam pessoas que estão com problemas e mesmo na hora de fazer valer regras contra o desejo dos visitantes (ex: não se pode entrar com bebida alcoólica de fora do parque), fazem-no com respeito e transparência.
Erros acontecem. No meu grupo, duas pessoas foram impedidas de entrar por um erro do sistema, e perderam mais de uma hora para resolvê-lo junto aos funcionários do parque. Para compensar a frustração, receberam passe expresso para filas nos brinquedos. A Disney sabe que a experiência do cliente é fundamental para garantir sua receita futura, e cada funcionário recebe treinamento – e é avaliado – para garantir o serviço de extrema qualidade voltado a essa experiência.
O mesmo não se pode dizer da Imigração. A fila, embora menor do que a dos parques, demora mais de uma hora para andar. A automatização – que poderia facilmente ser a regra para visitantes com visto e que já entraram e saíram dos EUA sem gerar problemas no passado – caminha a passos de tartaruga.
Os poucos funcionários presentes não estão lá para ajudar. Pelo contrário: seu mau humor e o poder discricionário de barrar a entrada de quem quer que seja fazem o visitante se sentir pisando em ovos, apto a ser barrado se desagradar a quem o avalia ou se violar, ainda que de forma não intencional, alguma das muitas e obscuras regras que imperam ali. Há poucos meses uma turista brasileira foi barrada por tirar uma selfie.
O sistema também comete erros, mas não há nenhuma preocupação em resolver os casos individuais. A pessoa que futuramente se vire com a burocracia para tirar um novo visto.
Nada disso é novidade ou surpresa. É o resultado esperado de um sistema no qual a receita está desvinculada do desempenho. Não existe nenhum incentivo para mudar, exceto – de vez em quando – a vontade política (e tudo indica que ela caminhará na direção oposta agora). O mesmo vale para o controle estatal da segurança em aeroportos americanos, um grande teatro de segurança que gera estorvo e perda de tempo para viajantes honestos, sem com isso impedir terroristas de cometer novos atentados.
Não dá para viver sem segurança ou algum controle de fronteiras, e essas são atividades que devem continuar nas mãos do Estado pelo futuro. A comparação com a norma do mercado, contudo, é ilustrativa. E nos lembra o quanto a sociedade se beneficia ao caminhar na direção de mais contratos voluntários e concorrência e se distanciar de um modelo em que um único agente toma conta de tudo e cuja receita está desvinculada de seu resultado.
Viajar a um grande complexo do entretenimento como a Disney World – como estou fazendo agora – é a chance de vivenciar na prática a diferença entre serviços privados e estatais, diferença que decorre dos diferentes incentivos dos dois setores.
A posse de Donald Trump ocorrerá em poucos dias, e em meio à despedida um tanto melancólica de Obama, as instituições seguem funcionando normalmente, para o bem e para o mal. Nesses dias, tive contato direto com dois processos de averiguação e controle de passagem de pessoas: o controle de imigração na fronteira americana e a entrada nos parques da Disney.
Pode parecer esdrúxulo comparar as duas coisas, mas a função delas é similar. Restringir a entrada de pessoas a determinado espaço e garantir a segurança de quem está lá dentro. Em ambos, há o interesse de manter do lado de fora pessoas não autorizadas ou com más intenções. Ao mesmo tempo, há também o interesse de que pessoas cumpridoras das regras entrem. No caso do Disney, isso é seu próprio ganha-pão. Para os EUA, é de seu interesse que turistas entrem em seu território e consumam seus bens e serviços. Os turistas brasileiros, em particular, já foram designados como “walking stimulus packages” por uma empresa de lobby do setor do turismo.
Dito isso, é gritante a diferença na forma como conduzem essa função.
Na Disney, que faz controle não só de ingressos como também faz a vistoria de mochilas e bolsas (precaução redobrada depois do atentado em Ft. Lauderdale), a preocupação central é que os clientes passem por ali o mais rápido mais possível e que a experiência seja o menos desagradável possível. Por isso, o sistema já é todo automatizado, funcionários ajudam pessoas que estão com problemas e mesmo na hora de fazer valer regras contra o desejo dos visitantes (ex: não se pode entrar com bebida alcoólica de fora do parque), fazem-no com respeito e transparência.
Erros acontecem. No meu grupo, duas pessoas foram impedidas de entrar por um erro do sistema, e perderam mais de uma hora para resolvê-lo junto aos funcionários do parque. Para compensar a frustração, receberam passe expresso para filas nos brinquedos. A Disney sabe que a experiência do cliente é fundamental para garantir sua receita futura, e cada funcionário recebe treinamento – e é avaliado – para garantir o serviço de extrema qualidade voltado a essa experiência.
O mesmo não se pode dizer da Imigração. A fila, embora menor do que a dos parques, demora mais de uma hora para andar. A automatização – que poderia facilmente ser a regra para visitantes com visto e que já entraram e saíram dos EUA sem gerar problemas no passado – caminha a passos de tartaruga.
Os poucos funcionários presentes não estão lá para ajudar. Pelo contrário: seu mau humor e o poder discricionário de barrar a entrada de quem quer que seja fazem o visitante se sentir pisando em ovos, apto a ser barrado se desagradar a quem o avalia ou se violar, ainda que de forma não intencional, alguma das muitas e obscuras regras que imperam ali. Há poucos meses uma turista brasileira foi barrada por tirar uma selfie.
O sistema também comete erros, mas não há nenhuma preocupação em resolver os casos individuais. A pessoa que futuramente se vire com a burocracia para tirar um novo visto.
Nada disso é novidade ou surpresa. É o resultado esperado de um sistema no qual a receita está desvinculada do desempenho. Não existe nenhum incentivo para mudar, exceto – de vez em quando – a vontade política (e tudo indica que ela caminhará na direção oposta agora). O mesmo vale para o controle estatal da segurança em aeroportos americanos, um grande teatro de segurança que gera estorvo e perda de tempo para viajantes honestos, sem com isso impedir terroristas de cometer novos atentados.
Não dá para viver sem segurança ou algum controle de fronteiras, e essas são atividades que devem continuar nas mãos do Estado pelo futuro. A comparação com a norma do mercado, contudo, é ilustrativa. E nos lembra o quanto a sociedade se beneficia ao caminhar na direção de mais contratos voluntários e concorrência e se distanciar de um modelo em que um único agente toma conta de tudo e cuja receita está desvinculada de seu resultado.