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Renovar a política não é negar a política

O sonho do jovem, do novo, permanece — agora talvez ele tenha um teor ideológico mais acentuado

CONGRESSO: O deputado que tem uma ideia clara e a defende custe o que custar, também é problemático / Ueslei Marcelino | Reuters (Ueslei Marcelino/Reuters)
CONGRESSO: O deputado que tem uma ideia clara e a defende custe o que custar, também é problemático / Ueslei Marcelino | Reuters (Ueslei Marcelino/Reuters)
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Joel Pinheiro da Fonseca

Publicado em 21 de dezembro de 2017 às, 09h43.

Os brasileiros querem – na verdade, sempre quiseram – o novo. Aquilo que se opõe ao jeito lento, ineficiente e corrupto que as coisas são feitas na nossa política; que se opõe ao antigo, que é visto como ruim. Queremos novidades, o que há de mais moderno e que nos faça pensar na Europa, nos Estados Unidos. Em 89, era um caçador de marajás que andava de jet-ski.

O jet-ski envelheceu mal. Mas o sonho do jovem, do novo, permanece. Agora talvez ele tenha um teor ideológico mais acentuado, para a esquerda ou para a direita, mas ainda preservando a característica essencial de se contrapor à velha política nacional. Uma pessoa que não seja de conchavos, mas de convicções. Que não seja mole e volúvel, mas rígido naquilo que é correto.

Uma coisa me dá esperança nos muitos movimentos de renovação da política que pipocam pelo país: eles procuram candidatos de pontos variados do espectro ideológico. É sinal de que “renovação” não é apenas um codinome para impor a própria agenda, custe o que custar. É uma preocupação mais ampla com a qualidade dos políticos, independente de seus posicionamentos. Ainda assim, penso que junto da ideia de renovação estamos valorizando características que, sozinhas, ficam aquém do que se espera de um bom político, e que a tal da “velha política” também tem algumas virtudes a ensinar.

Suspeito que, para muita gente, renovar a política seja um jeito mais bonito de negar a política. Afinal, política é a possibilidade de resolver conflitos por meio de palavras: ou seja, de negociação. E aí necessariamente estamos falando de saber ser flexível, de ceder, de fazer acordos. De pensar tanto nos interesses pessoais e partidários (afinal, o Estado é e sempre será o âmbito da luta pelo poder) quanto no bem comum, isto é, nas mudanças que se quer para o país.

Nós vamos longe demais na direção do fisiologismo. Muitos deputados estão ali pensando apenas no benefício seu e de seu partido, sem em nenhum momento discutir a sério os méritos de um projeto. São pessoas com quem é impossível ter uma conversa produtiva sobre o país. Mas o suposto contrário disso, o do deputado que tem uma ideia clara e a defende custe o que custar, também é problemático.

Assim, penso em dois tipos de político que prejudicam o país: 1) o fisiológico perfeito: aquele incapaz de discutir qualquer proposta honestamente, pensando sempre e apenas no cálculo político e nos interesses pessoais seus e de seu partido. 2) o ideológico perfeito: aquele incapaz de negociar e de ceder, que encara a conciliação como uma coisa ruim, que bate o pé em cima de suas pautas e está no Congresso só para fazer gritaria e agradar seu eleitorado.

Conforme o Brasil fique mais politizado, e que o voto ideológico ganhe espaço, será possível para alguns deputados sustentar seu mandato agradando a ideologia de seu eleitorado. Defenderá sempre suas posições, será voto vencido, não conquistará grandes vitórias. Será uma pedra inútil dentro do Congresso, mas amado pela fração do eleitorado que partilha aquela ideologia, e que vê nele seu paladino.

O que queremos: alguém que consiga equilibrar algum interesse pessoal e partidário, alguma prioridade ideológica e que esteja disposto a negociar também em cima dessa agenda. Se tivermos mais políticos assim, na direita e na esquerda, o Brasil estará melhor.