Por que as redes sociais levam à radicalização?
O acesso que temos hoje a informação e as oportunidades de produzir e divulgar coisas boas nas redes estão aí à espera de quem saiba usá-las
Da Redação
Publicado em 14 de novembro de 2019 às 12h09.
As mudanças que a internet e, com ela, as redes sociais trouxeram à vida humana ainda estão sendo devidamente estudadas e descobertas. De saída, ressalto três aspectos: 1) a internet deu ao cidadão comum acesso fácil e barato a uma quantidade de informação inédita na história. 2) com as redes sociais, o cidadão comum ganhou acesso fácil e gratuito a um poder de difusão antes só possuído por grandes instituições (empresas, igrejas, Estados). Hoje, somos todos formadores de opinião em potencial. 3) nas redes sociais, estamos praticamente o tempo inteiro medindo e comparando nossas reputações e nossa capacidade de influenciar os outros (o número de curtidas, de compartilhamentos, de retweets).
Tudo isso muda o comportamento humano, mas não da maneira que esperávamos. Longe de ser uma “ágora dos tempos modernos”, um espaço de discussão, aproximação mútua, resolução de conflitos e fortalecimento da democracia, as redes sociais promovem a radicalização, o fanatismo, o histrionismo e o conflito. Quando isso é trazido para o campo da política, significa a aposta em candidaturas personalistas que encarnem a revolta contra o sistema. Fortalecem o populismo.
Quando falamos no risco de redes sociais deformarem a democracia, frequentemente faz-se referência a duas coisas: os algoritmos que determinam o que cada usuário recebe em sua timeline e o uso de ferramentas para “trapacear” as redes sociais, como posts impulsionados, perfis falsos e disparos automáticos em massa.
Cada um desses ítens é real e levanta preocupações legítimas, mas me parece que seu papel é mais de potencializar algumas tendências das redes sociais do que propriamente criá-las. De fato, Facebook (você ainda usa isso?) e Instagram têm algoritmos que determinam quais posts chegam a você e quais não chegam. Isso é uma necessidade, posto que seria impossível te mandar tudo. Via de regra, esses algoritmos te entregam aquilo que você gostará de ver, baseado no seu uso anterior das redes. Seu grande crime é entregar ao indivíduo o que ele quer.
Mas note: as duas redes sociais que estão mais em evidência no debate político atual, Whatsapp e Twitter, não fazem esse tipo de seleção de conteúdo por um algoritmo pouco transparente. Pelo contrário: no Whatsapp, chega a você tudo aquilo que foi mandado para você. E no Twitter você verá todos os posts das pessoas que você segue desfilando em seu feed.
Quanto a perfis falsos, disparos automáticos e outras maneiras de burlar as regras, eles sem dúvida existem. É fácil encontrar perfis no Twitter fazendo milhares de posts, publicando o mesmo exato conteúdo minuto a minuto sem parar durante horas, para subir uma hashtag (como foi o caso, esses dias, de #ImpeachmentGilmarMendes). Mas fora o efeito momentâneo de criar recordistas de menções artificiais, o fato é que o fanatismo e a raiva são fenômenos reais, partilhados por dezenas de milhares de usuários nas redes, e que o poder de compartilhar algo muitas vezes não tivesse como contrapartida um público grande e receptivo àquela mensagem, ele de nada valeria.
Os impactos das redes sociais na sociedade e na democracia não se devem a um macete ou outro; se deve à própria natureza humana. As pessoas se juntam em grupos por afinidades, interagem de forma intensa e durante todo o dia, e consomem e produzem informação que não passa por nenhum tipo de crivo institucional ou profissional. Com mais informação disponível, podem selecionar justo aquelas de que precisam para reforçar seus desejos e opiniões pré-estabelecidas. O convívio com quem pensa igual e a pressão por se sobressair levam, por si sós, à radicalização, a uma busca por pureza dentro dos valores que definem o grupo.
Vale tudo na cracolândia das redes, o que tem levado a desinformação potencialmente séria não apenas no âmbito da política mas mesmo no da ciência e da saúde, com curas falsas e crenças anti-científicas (como o ceticismo com vacinas) ganhando espaço.
Não adianta sonhar com um passado que não voltará. O poder nas mãos de grandes grupos também tinha severos defeitos que foram, felizmente, superados. O acesso que temos hoje a informação e as oportunidades de produzir e divulgar coisas boas nas redes estão aí à espera de quem saiba usá-las. Só não tenhamos ilusões: o contato direto e constante do povo com a política não leva a decisões ponderadas e à convivência, e sim ao radicalismo e ao conflito.
As mudanças que a internet e, com ela, as redes sociais trouxeram à vida humana ainda estão sendo devidamente estudadas e descobertas. De saída, ressalto três aspectos: 1) a internet deu ao cidadão comum acesso fácil e barato a uma quantidade de informação inédita na história. 2) com as redes sociais, o cidadão comum ganhou acesso fácil e gratuito a um poder de difusão antes só possuído por grandes instituições (empresas, igrejas, Estados). Hoje, somos todos formadores de opinião em potencial. 3) nas redes sociais, estamos praticamente o tempo inteiro medindo e comparando nossas reputações e nossa capacidade de influenciar os outros (o número de curtidas, de compartilhamentos, de retweets).
Tudo isso muda o comportamento humano, mas não da maneira que esperávamos. Longe de ser uma “ágora dos tempos modernos”, um espaço de discussão, aproximação mútua, resolução de conflitos e fortalecimento da democracia, as redes sociais promovem a radicalização, o fanatismo, o histrionismo e o conflito. Quando isso é trazido para o campo da política, significa a aposta em candidaturas personalistas que encarnem a revolta contra o sistema. Fortalecem o populismo.
Quando falamos no risco de redes sociais deformarem a democracia, frequentemente faz-se referência a duas coisas: os algoritmos que determinam o que cada usuário recebe em sua timeline e o uso de ferramentas para “trapacear” as redes sociais, como posts impulsionados, perfis falsos e disparos automáticos em massa.
Cada um desses ítens é real e levanta preocupações legítimas, mas me parece que seu papel é mais de potencializar algumas tendências das redes sociais do que propriamente criá-las. De fato, Facebook (você ainda usa isso?) e Instagram têm algoritmos que determinam quais posts chegam a você e quais não chegam. Isso é uma necessidade, posto que seria impossível te mandar tudo. Via de regra, esses algoritmos te entregam aquilo que você gostará de ver, baseado no seu uso anterior das redes. Seu grande crime é entregar ao indivíduo o que ele quer.
Mas note: as duas redes sociais que estão mais em evidência no debate político atual, Whatsapp e Twitter, não fazem esse tipo de seleção de conteúdo por um algoritmo pouco transparente. Pelo contrário: no Whatsapp, chega a você tudo aquilo que foi mandado para você. E no Twitter você verá todos os posts das pessoas que você segue desfilando em seu feed.
Quanto a perfis falsos, disparos automáticos e outras maneiras de burlar as regras, eles sem dúvida existem. É fácil encontrar perfis no Twitter fazendo milhares de posts, publicando o mesmo exato conteúdo minuto a minuto sem parar durante horas, para subir uma hashtag (como foi o caso, esses dias, de #ImpeachmentGilmarMendes). Mas fora o efeito momentâneo de criar recordistas de menções artificiais, o fato é que o fanatismo e a raiva são fenômenos reais, partilhados por dezenas de milhares de usuários nas redes, e que o poder de compartilhar algo muitas vezes não tivesse como contrapartida um público grande e receptivo àquela mensagem, ele de nada valeria.
Os impactos das redes sociais na sociedade e na democracia não se devem a um macete ou outro; se deve à própria natureza humana. As pessoas se juntam em grupos por afinidades, interagem de forma intensa e durante todo o dia, e consomem e produzem informação que não passa por nenhum tipo de crivo institucional ou profissional. Com mais informação disponível, podem selecionar justo aquelas de que precisam para reforçar seus desejos e opiniões pré-estabelecidas. O convívio com quem pensa igual e a pressão por se sobressair levam, por si sós, à radicalização, a uma busca por pureza dentro dos valores que definem o grupo.
Vale tudo na cracolândia das redes, o que tem levado a desinformação potencialmente séria não apenas no âmbito da política mas mesmo no da ciência e da saúde, com curas falsas e crenças anti-científicas (como o ceticismo com vacinas) ganhando espaço.
Não adianta sonhar com um passado que não voltará. O poder nas mãos de grandes grupos também tinha severos defeitos que foram, felizmente, superados. O acesso que temos hoje a informação e as oportunidades de produzir e divulgar coisas boas nas redes estão aí à espera de quem saiba usá-las. Só não tenhamos ilusões: o contato direto e constante do povo com a política não leva a decisões ponderadas e à convivência, e sim ao radicalismo e ao conflito.