O que explica o fenômeno Bolsonaro?
Os processos que correm contra o deputado Jair Bolsonaro, e que podem tirá-lo da corrida presidencial, parecem mais um arremedo inventado por seus desafetos. Claro que foi com a cooperação dele: 11 anos (!) depois de ter sido chamado de estuprador pela deputada Maria do Rosário (isso sim, possivelmente um crime), ele respondeu a ela […]
Da Redação
Publicado em 27 de julho de 2017 às 12h35.
Os processos que correm contra o deputado Jair Bolsonaro, e que podem tirá-lo da corrida presidencial, parecem mais um arremedo inventado por seus desafetos. Claro que foi com a cooperação dele: 11 anos (!) depois de ter sido chamado de estuprador pela deputada Maria do Rosário (isso sim, possivelmente um crime), ele respondeu a ela em 2014, dizendo que ela não merecia ser estuprada (subentendido aí um comentário depreciativo à beleza dela). Podemos lamentar a boçalidade da ofensa, ainda mais no plenário do Câmara, mas tirar daí algum tipo de apologia ao estupro é absurdo.
Querem tirar Bolsonaro na tecnicalidade, por um crime fictício e sem vítima (diferente, por exemplo, de propinas que desviam recursos e realmente prejudicam a sociedade), talvez por não saberem como lidar com ele. Como lidar com o fenômeno de milhares de fãs que o seguem e de seus bons números nas pesquisas de opinião. É muito cedo para fazer qualquer previsão, e é bem provável que, aparecendo o nome forte e sério da direita para derrotar Lula, o balão de ar da candidatura Bolsonaro murche. Ele também deve saber que uma vitória presidencial é improvável, e deve considerar seriamente se não seria melhor garantir a vaga de Deputado e desistir da corrida no Executivo. Seja como for, o resultado dele até agora é surpreendente.
Eu considero Bolsonaro, em termos pessoais, uma das piores opções imagináveis para ocupar a presidência. Não tem nenhum conhecimento relevante, seus discursos são pura demagogia, ele apela a desejos violentos do eleitorado, é leniente com violência contra homossexuais, seu jeito errático não inspira nenhuma confiança, sua carreira na Câmara (26 anos) é – desconsiderados os showzinhos de boçalidade – desprovida de qualquer realização.
Dito isso, ficar indignado ou horrorizado ante o fenômeno Bolsonaro é a pior reação possível. Primeiro porque isso o beneficia; ele ganha votos em chocar as sensibilidades, isso é parte de seu apelo. E segundo porque esse escândalo, essa tentativa de se mostrar moralmente superior a Bolsonaro ou seus eleitores, impede o tipo de comunicação frutífera que pode mostrar, com bons motivos, que ele é uma má opção.
Acredito que o sucesso atual de Bolsonaro venha de duas fontes. A primeira é a reação ao politicamente correto e ao feminismo. É incrível o número de jovens do ensino médio que, cansados com o policiamento do pensar e do falar, do uso hipócrita e falacioso de supostas “lutas” de minorias para justificar qualquer cretinice, veem no Bolsonaro um herói de sua resistência pessoal. Cada grosseria colegial dita pelo Bolsonaro é uma desforra pelos pequenos silenciamentos pelos quais o jovem médio passa no dia a dia. Associar-se a ele é ter uma resposta à altura, um modo de se autoafirmar. Talvez isso explique as festas de aniversário e até casamentos que têm Bolsonaro como tema (sim…).
Trocar a eficácia política e seriedade na busca de soluções por esse tipo de representação simbólica é um dos vícios da nossa época. A resposta a isso é a seriedade pessoal. Mostrar que política não é – nem deveria ser – esse teatro adolescente, mas que pede, ao contrário, temperamentos adultos, maduros, capazes de fazer o trabalho sério que os problemas do Brasil precisam. “Mitar” e “lacrar” nas redes pode ser gostoso; mas ter um país que funcione é muito melhor.
O segundo motivo é mais direto: segurança pública. Brasileiros de todas as classes sociais estão – com razão – sentindo medo de sair às ruas. A violência é onipresente e o crime parece compensar. Educação, oportunidades econômicas e intervenções urbanas (como mais iluminação) podem ter um papel para reduzir a criminalidade, mas nada pode substituir o trabalho essencial da polícia e da Justiça: pegar criminosos e puni-los. Enquanto nenhum candidato sério falar desses temas sem medo – propor caminhos para, por exemplo, aumentar a taxa de resolução de homicídios, que hoje está em menos 5% –, votos continuarão a ir para soluções demagógicas e indiscriminadamente violentas que, ademais, não funcionam.
Polícia que executa suspeitos, justiçamentos populares, nada disso tem lugar numa sociedade civilizada. Mas uma população acuada pelo crime irá celebrar a vingança contra criminosos (ou supostos criminosos) enquanto não tiver soluções concretas para a segurança pública. Mais importante do que leis draconianas para acabar com a vida de criminosos condenados é implementar políticas que de fato aumentem as condenações.
A eleição ainda está distante e há muito tempo para Bolsonaro se esvaziar. Isso só acontecerá, contudo, se as alternativas a ele entenderem e lidarem com os motivos compreensíveis que alimentam seu atual sucesso.
Os processos que correm contra o deputado Jair Bolsonaro, e que podem tirá-lo da corrida presidencial, parecem mais um arremedo inventado por seus desafetos. Claro que foi com a cooperação dele: 11 anos (!) depois de ter sido chamado de estuprador pela deputada Maria do Rosário (isso sim, possivelmente um crime), ele respondeu a ela em 2014, dizendo que ela não merecia ser estuprada (subentendido aí um comentário depreciativo à beleza dela). Podemos lamentar a boçalidade da ofensa, ainda mais no plenário do Câmara, mas tirar daí algum tipo de apologia ao estupro é absurdo.
Querem tirar Bolsonaro na tecnicalidade, por um crime fictício e sem vítima (diferente, por exemplo, de propinas que desviam recursos e realmente prejudicam a sociedade), talvez por não saberem como lidar com ele. Como lidar com o fenômeno de milhares de fãs que o seguem e de seus bons números nas pesquisas de opinião. É muito cedo para fazer qualquer previsão, e é bem provável que, aparecendo o nome forte e sério da direita para derrotar Lula, o balão de ar da candidatura Bolsonaro murche. Ele também deve saber que uma vitória presidencial é improvável, e deve considerar seriamente se não seria melhor garantir a vaga de Deputado e desistir da corrida no Executivo. Seja como for, o resultado dele até agora é surpreendente.
Eu considero Bolsonaro, em termos pessoais, uma das piores opções imagináveis para ocupar a presidência. Não tem nenhum conhecimento relevante, seus discursos são pura demagogia, ele apela a desejos violentos do eleitorado, é leniente com violência contra homossexuais, seu jeito errático não inspira nenhuma confiança, sua carreira na Câmara (26 anos) é – desconsiderados os showzinhos de boçalidade – desprovida de qualquer realização.
Dito isso, ficar indignado ou horrorizado ante o fenômeno Bolsonaro é a pior reação possível. Primeiro porque isso o beneficia; ele ganha votos em chocar as sensibilidades, isso é parte de seu apelo. E segundo porque esse escândalo, essa tentativa de se mostrar moralmente superior a Bolsonaro ou seus eleitores, impede o tipo de comunicação frutífera que pode mostrar, com bons motivos, que ele é uma má opção.
Acredito que o sucesso atual de Bolsonaro venha de duas fontes. A primeira é a reação ao politicamente correto e ao feminismo. É incrível o número de jovens do ensino médio que, cansados com o policiamento do pensar e do falar, do uso hipócrita e falacioso de supostas “lutas” de minorias para justificar qualquer cretinice, veem no Bolsonaro um herói de sua resistência pessoal. Cada grosseria colegial dita pelo Bolsonaro é uma desforra pelos pequenos silenciamentos pelos quais o jovem médio passa no dia a dia. Associar-se a ele é ter uma resposta à altura, um modo de se autoafirmar. Talvez isso explique as festas de aniversário e até casamentos que têm Bolsonaro como tema (sim…).
Trocar a eficácia política e seriedade na busca de soluções por esse tipo de representação simbólica é um dos vícios da nossa época. A resposta a isso é a seriedade pessoal. Mostrar que política não é – nem deveria ser – esse teatro adolescente, mas que pede, ao contrário, temperamentos adultos, maduros, capazes de fazer o trabalho sério que os problemas do Brasil precisam. “Mitar” e “lacrar” nas redes pode ser gostoso; mas ter um país que funcione é muito melhor.
O segundo motivo é mais direto: segurança pública. Brasileiros de todas as classes sociais estão – com razão – sentindo medo de sair às ruas. A violência é onipresente e o crime parece compensar. Educação, oportunidades econômicas e intervenções urbanas (como mais iluminação) podem ter um papel para reduzir a criminalidade, mas nada pode substituir o trabalho essencial da polícia e da Justiça: pegar criminosos e puni-los. Enquanto nenhum candidato sério falar desses temas sem medo – propor caminhos para, por exemplo, aumentar a taxa de resolução de homicídios, que hoje está em menos 5% –, votos continuarão a ir para soluções demagógicas e indiscriminadamente violentas que, ademais, não funcionam.
Polícia que executa suspeitos, justiçamentos populares, nada disso tem lugar numa sociedade civilizada. Mas uma população acuada pelo crime irá celebrar a vingança contra criminosos (ou supostos criminosos) enquanto não tiver soluções concretas para a segurança pública. Mais importante do que leis draconianas para acabar com a vida de criminosos condenados é implementar políticas que de fato aumentem as condenações.
A eleição ainda está distante e há muito tempo para Bolsonaro se esvaziar. Isso só acontecerá, contudo, se as alternativas a ele entenderem e lidarem com os motivos compreensíveis que alimentam seu atual sucesso.