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Centrão como modo de vida

Enquanto escrevo estas linhas, Rodrigo Maia e Rogério Rosso disputam o segundo turno da presidência da Câmara. Mais do que acenar para alguma direção, a votação para presidente da Câmara deve ter fortalecido algo que já sabíamos: a política brasileira, no que depender de si mesma, vai permanecer parada, inercial, até 2018. Vivemos o reinado […]

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO: na época do Plano Real, precisávamos de técnica; hoje, o caminho é claro mas exige justamente aquilo de que carecemos: poder de decisão / Mauricio Lima / Getty Images
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Da Redação

Publicado em 14 de julho de 2016 às 12h12.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 17h59.

Enquanto escrevo estas linhas, Rodrigo Maia e Rogério Rosso disputam o segundo turno da presidência da Câmara. Mais do que acenar para alguma direção, a votação para presidente da Câmara deve ter fortalecido algo que já sabíamos: a política brasileira, no que depender de si mesma, vai permanecer parada, inercial, até 2018. Vivemos o reinado do centrão. A saída de Cunha do cargo nos livrou de um personagem particularmente sórdido, mas nem de longe nos coloca em uma posição promissora.

De uma coisa não podemos reclamar, no entanto: nossa Câmara é representativa. Não da composição de cor e sexo da população, mas do nosso ethos, da primazia dos laços pessoais e sentimentais sobre qualquer pretensão ideológica. O homem cordial – que não é o homem gentil ou amável – é real e nos representa, seja nas dedicações calorosas no dia da votação do impeachment, seja no uso de “meninas” para convencer os deputados a votar no candidato à presidência desejado.

O fisiologismo, o colocar as próprias relações de poder antes da ideologia e do respeito institucional não é de todo o mal. Foi o que nos salvou dos piores excessos do resto do continente. Jamais tivemos nem uma revolução social e nem mesmo um populismo desenfreado como na Argentina, no Chile ou na Venezuela. Tampouco nossa ditadura militar da direita se aproximou dos horrores cometidos em nossos vizinhos. O desejo de obter e manter o poder é um poderoso aliado do status quo, seja ele qual for. Nada de mudanças bruscas ou radicais.

O problema é que alguns momentos demandam ações decididas. E o momento atual é um desses. A crise pela qual o país passa é inédita pela somatória de fatores: recessão, desemprego, inflação, crise fiscal e crise política. Em momentos passados, como às vésperas do Plano Real, a situação do Brasil era calamitosa. Mas lá o que precisávamos para sair da crise era conhecimento técnico para implantar um novo sistema monetário. Bastava colocar especialistas no lugar certo.

Agora, não. Não há nenhuma jogada técnica, nenhuma URV, que possa livrar o Estado do buraco fiscal em que ele se meteu, e que está na origem do resto. O caminho é claro, mas exige justamente aquilo de que carecemos: poder de decisão. O Estado brasileiro precisa de corte de gastos urgente, de preferência na casa dos 100 bilhões de reais. E, para isso, a cooperação do Parlamento com o Executivo é fundamental. Mesmo o teto de gasto proposto por Henrique Meirelles está longe de ser o suficiente (salvo a hipótese de um improvável crescimento alto para os próximos anos).

Nessas circunstâncias, debates sempre ignorados se tornam centrais: reforma previdenciária em primeiro lugar (especialmente do funcionalismo público), mas também desvinculação de gastos (gastar mais trabalha na direção oposta de gastar melhor, que é o que precisamos) e redução brutal da máquina estatal, a começar pelo corte de regalias de parlamentares e fim do salário de vereador. Enquanto isso, no mundo real, aprovamos 10% do PIB para a educação, reajuste generoso do Judiciário e os deputados se preocupam em garantir suas prerrogativas.

Há grandes tragédias que são fruto de grandes erros, e há aquelas que são fruto da incapacidade de agir quando o navio começa a afundar. Esta é a política brasileira neste momento. O mais fácil para os deputados é seguir empurrando com a barriga enquanto se preocupam com as investigações do Judiciário. Deixaremos a grande escolha nacional para 2018. Mas se nossos representantes não têm a capacidade de tomar uma decisão difícil quando o momento exige, será que a população por eles tão bem representada terá essa maturidade? Ou então estaremos fadados a oscilar entre milagres e décadas perdidas e a inflação voltará a ser nosso habitat natural.

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Enquanto escrevo estas linhas, Rodrigo Maia e Rogério Rosso disputam o segundo turno da presidência da Câmara. Mais do que acenar para alguma direção, a votação para presidente da Câmara deve ter fortalecido algo que já sabíamos: a política brasileira, no que depender de si mesma, vai permanecer parada, inercial, até 2018. Vivemos o reinado do centrão. A saída de Cunha do cargo nos livrou de um personagem particularmente sórdido, mas nem de longe nos coloca em uma posição promissora.

De uma coisa não podemos reclamar, no entanto: nossa Câmara é representativa. Não da composição de cor e sexo da população, mas do nosso ethos, da primazia dos laços pessoais e sentimentais sobre qualquer pretensão ideológica. O homem cordial – que não é o homem gentil ou amável – é real e nos representa, seja nas dedicações calorosas no dia da votação do impeachment, seja no uso de “meninas” para convencer os deputados a votar no candidato à presidência desejado.

O fisiologismo, o colocar as próprias relações de poder antes da ideologia e do respeito institucional não é de todo o mal. Foi o que nos salvou dos piores excessos do resto do continente. Jamais tivemos nem uma revolução social e nem mesmo um populismo desenfreado como na Argentina, no Chile ou na Venezuela. Tampouco nossa ditadura militar da direita se aproximou dos horrores cometidos em nossos vizinhos. O desejo de obter e manter o poder é um poderoso aliado do status quo, seja ele qual for. Nada de mudanças bruscas ou radicais.

O problema é que alguns momentos demandam ações decididas. E o momento atual é um desses. A crise pela qual o país passa é inédita pela somatória de fatores: recessão, desemprego, inflação, crise fiscal e crise política. Em momentos passados, como às vésperas do Plano Real, a situação do Brasil era calamitosa. Mas lá o que precisávamos para sair da crise era conhecimento técnico para implantar um novo sistema monetário. Bastava colocar especialistas no lugar certo.

Agora, não. Não há nenhuma jogada técnica, nenhuma URV, que possa livrar o Estado do buraco fiscal em que ele se meteu, e que está na origem do resto. O caminho é claro, mas exige justamente aquilo de que carecemos: poder de decisão. O Estado brasileiro precisa de corte de gastos urgente, de preferência na casa dos 100 bilhões de reais. E, para isso, a cooperação do Parlamento com o Executivo é fundamental. Mesmo o teto de gasto proposto por Henrique Meirelles está longe de ser o suficiente (salvo a hipótese de um improvável crescimento alto para os próximos anos).

Nessas circunstâncias, debates sempre ignorados se tornam centrais: reforma previdenciária em primeiro lugar (especialmente do funcionalismo público), mas também desvinculação de gastos (gastar mais trabalha na direção oposta de gastar melhor, que é o que precisamos) e redução brutal da máquina estatal, a começar pelo corte de regalias de parlamentares e fim do salário de vereador. Enquanto isso, no mundo real, aprovamos 10% do PIB para a educação, reajuste generoso do Judiciário e os deputados se preocupam em garantir suas prerrogativas.

Há grandes tragédias que são fruto de grandes erros, e há aquelas que são fruto da incapacidade de agir quando o navio começa a afundar. Esta é a política brasileira neste momento. O mais fácil para os deputados é seguir empurrando com a barriga enquanto se preocupam com as investigações do Judiciário. Deixaremos a grande escolha nacional para 2018. Mas se nossos representantes não têm a capacidade de tomar uma decisão difícil quando o momento exige, será que a população por eles tão bem representada terá essa maturidade? Ou então estaremos fadados a oscilar entre milagres e décadas perdidas e a inflação voltará a ser nosso habitat natural.

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