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Autonomia do BC é boa notícia, mas não estoure os fogos

Projeto aprovado nesta quarta-feira cria mandato fixo e estabelece regras rígidas para demissão de dirigentes do BC

Banco Central (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
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marianamartucci

Publicado em 12 de fevereiro de 2021 às 11h15.

A autonomia do Banco Central pode não ser a grande solução para os males do Brasil, mas há que se reconhecer que é um avanço positivo. Discutida há quase trinta anos, finalmente vingou.

Já imaginou um Bolsonaro desesperado, tendo já chutado a barraca no lado fiscal, detonado o teto de gastos, PIB ainda vacilante, popularidade em queda? Pode acontecer. E se acontecer, a tentação de interferir no lado monetário, ainda mais em 2022 - ano da reeleição - seria bem forte. Não é de todo inverossímil imaginar Bolsonaro pressionando Roberto Campos Neto para afrouxar as rédeas e injetar moeda na economia, a inflação que se dane. Isso aconteceria de fato? Não sei dizer. Mas o fato é que, sem a autonomia do BC em lei, isso poderia acontecer. Agora não pode mais.

Com o mandato fixo, e a necessidade da chancela do Senado para que o presidente demita o presidente do BC caso ele não cumpra a meta de inflação, o Brasil se blinda contra o risco do populismo monetário descarado, que sacrifica a estabilidade da moeda em nome de um super-aquecimento de curto prazo.

E com mandatos não-coincidentes com o Executivo, e nomeações escalonadas para a diretoria do BC, impede-se o outro risco, no qual aliás já caímos no passado: a nomeação de um presidente do BC alinhado aos desejos do Presidente da República, pronto a colocar em prática a sua visão econômica. Agora, não mais. Teremos mais estabilidade no BC, buscando sua missão própria de buscar estabilidade econômica (com objetivos acessórios como emprego, mas sem impactar a meta principal) mirando os objetivos dados pelo CMN.

Esse tipo de autonomia foi de fato perdida no Brasil no governo Dilma, quando Alexandre Tombini baixou os juros irresponsavelmente e levou ao estouro da meta de inflação (mesmo com ajudinha do governo nos preços administrados).

Qualquer medo de que essa autonomia - que nem de longe corresponde à total independência, posto que quem define a meta de inflação e o regime cambial é o próprio governo, bem como é o governo que nomeia e, se necessário, exonera presidente e diretoria - represente um poder maior do “mercado financeiro” sobre o BC é infundado. Não há mudança rigorosamente nenhuma no risco de captura institucional. E tampouco há motivos para temer que essa captura tenha ocorrido: foi, afinal, justamente nas duas últimas gestões - Goldfajn e Campos Neto -, com dois egressos de grandes bancos, que o Banco Central mais abaixou os juros. A Selic foi sendo consistentemente cortada dos 14,25% ao ano quando Goldfajn assumiu para os atuais 2%. Ué, os banqueiros não queriam juros altos para agradar aos rentistas?

Fala-se tanto, e com razão, dos riscos de ingerência política em uma agência como a Anvisa. Assistimos agora ao absurdo do Congresso querer estipular o tempo necessário para se aprovar uma vacina, e todos com razão condenam essa tentativa de interferência. A autonomia do Banco Central é tão importante quanto, e está agora mais firmemente instituída em lei, menos dependente da boa vontade do presidente da vez.

O que se pode argumentar com razão é que a autonomia do Banco Central, embora desejável, não é uma prioridade para o Brasil. Traz uma segurança a mais para uma instituição que, na prática, já vem trabalhando com boa autonomia. O grande desafio brasileiro de curto e médio prazo, afinal, não é monetário, e sim fiscal. É do desarranjo fiscal que vêm nossos maiores riscos inflacionários.

A autonomia do BB é uma entrega fácil para a Câmara presidida por Arthur Lira, aproveitando a pequena lua de mel da mudança das presidências. A primeira entrega real é a prometida reforma administrativa, que, ainda que desidratada, aumentará a racionalidade na contratação e gestão do funcionalismo público para os anos futuros. Depois disso, o futuro é incerto. Com a necessidade de cimentar as boas relações com o Centrão, popularidade em baixa e na sequência ano eleitoral, é improvável que vejamos algum corte de gastos muito relevante. E pensando em nossos temas de longo prazo - educação, ciência, infraestrutura, meio-ambiente - aí não é preciso nem criar esperanças; estão fora do radar. Então vamos celebrar a conquistada autonomia do BC. É o que tem pra hoje; e, talvez, pelos próximos dois anos.

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A autonomia do Banco Central pode não ser a grande solução para os males do Brasil, mas há que se reconhecer que é um avanço positivo. Discutida há quase trinta anos, finalmente vingou.

Já imaginou um Bolsonaro desesperado, tendo já chutado a barraca no lado fiscal, detonado o teto de gastos, PIB ainda vacilante, popularidade em queda? Pode acontecer. E se acontecer, a tentação de interferir no lado monetário, ainda mais em 2022 - ano da reeleição - seria bem forte. Não é de todo inverossímil imaginar Bolsonaro pressionando Roberto Campos Neto para afrouxar as rédeas e injetar moeda na economia, a inflação que se dane. Isso aconteceria de fato? Não sei dizer. Mas o fato é que, sem a autonomia do BC em lei, isso poderia acontecer. Agora não pode mais.

Com o mandato fixo, e a necessidade da chancela do Senado para que o presidente demita o presidente do BC caso ele não cumpra a meta de inflação, o Brasil se blinda contra o risco do populismo monetário descarado, que sacrifica a estabilidade da moeda em nome de um super-aquecimento de curto prazo.

E com mandatos não-coincidentes com o Executivo, e nomeações escalonadas para a diretoria do BC, impede-se o outro risco, no qual aliás já caímos no passado: a nomeação de um presidente do BC alinhado aos desejos do Presidente da República, pronto a colocar em prática a sua visão econômica. Agora, não mais. Teremos mais estabilidade no BC, buscando sua missão própria de buscar estabilidade econômica (com objetivos acessórios como emprego, mas sem impactar a meta principal) mirando os objetivos dados pelo CMN.

Esse tipo de autonomia foi de fato perdida no Brasil no governo Dilma, quando Alexandre Tombini baixou os juros irresponsavelmente e levou ao estouro da meta de inflação (mesmo com ajudinha do governo nos preços administrados).

Qualquer medo de que essa autonomia - que nem de longe corresponde à total independência, posto que quem define a meta de inflação e o regime cambial é o próprio governo, bem como é o governo que nomeia e, se necessário, exonera presidente e diretoria - represente um poder maior do “mercado financeiro” sobre o BC é infundado. Não há mudança rigorosamente nenhuma no risco de captura institucional. E tampouco há motivos para temer que essa captura tenha ocorrido: foi, afinal, justamente nas duas últimas gestões - Goldfajn e Campos Neto -, com dois egressos de grandes bancos, que o Banco Central mais abaixou os juros. A Selic foi sendo consistentemente cortada dos 14,25% ao ano quando Goldfajn assumiu para os atuais 2%. Ué, os banqueiros não queriam juros altos para agradar aos rentistas?

Fala-se tanto, e com razão, dos riscos de ingerência política em uma agência como a Anvisa. Assistimos agora ao absurdo do Congresso querer estipular o tempo necessário para se aprovar uma vacina, e todos com razão condenam essa tentativa de interferência. A autonomia do Banco Central é tão importante quanto, e está agora mais firmemente instituída em lei, menos dependente da boa vontade do presidente da vez.

O que se pode argumentar com razão é que a autonomia do Banco Central, embora desejável, não é uma prioridade para o Brasil. Traz uma segurança a mais para uma instituição que, na prática, já vem trabalhando com boa autonomia. O grande desafio brasileiro de curto e médio prazo, afinal, não é monetário, e sim fiscal. É do desarranjo fiscal que vêm nossos maiores riscos inflacionários.

A autonomia do BB é uma entrega fácil para a Câmara presidida por Arthur Lira, aproveitando a pequena lua de mel da mudança das presidências. A primeira entrega real é a prometida reforma administrativa, que, ainda que desidratada, aumentará a racionalidade na contratação e gestão do funcionalismo público para os anos futuros. Depois disso, o futuro é incerto. Com a necessidade de cimentar as boas relações com o Centrão, popularidade em baixa e na sequência ano eleitoral, é improvável que vejamos algum corte de gastos muito relevante. E pensando em nossos temas de longo prazo - educação, ciência, infraestrutura, meio-ambiente - aí não é preciso nem criar esperanças; estão fora do radar. Então vamos celebrar a conquistada autonomia do BC. É o que tem pra hoje; e, talvez, pelos próximos dois anos.

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