As invasões e as ocupações à direita e à esquerda
Acho ótimo que um grupo de cinquenta militantes de direita tenha invadido (ou seria “ocupado”) a Câmara dos Deputados em Brasília. As palavras de ordem incluíram pedidos de golpe militar, além de louvores aos nomes dos presidentes militares e do juiz Sergio Moro. Não sei se lhes ocorreu que, em um regime militar, no qual […]
Da Redação
Publicado em 17 de novembro de 2016 às 18h37.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h26.
Acho ótimo que um grupo de cinquenta militantes de direita tenha invadido (ou seria “ocupado”) a Câmara dos Deputados em Brasília. As palavras de ordem incluíram pedidos de golpe militar, além de louvores aos nomes dos presidentes militares e do juiz Sergio Moro. Não sei se lhes ocorreu que, em um regime militar, no qual a força bruta prevalece necessariamente sobre a ordem jurídica, um juiz como o Sergio Moro teria que ficar em seu canto, sem jamais sonhar em perseguir os corruptos ligados ao poder, como faz hoje em dia com tanta liberdade.
Concordo com a causa dos manifestantes? Evidentemente, nem um pouco. Só me dá alguma esperança pensar que os meios que eles utilizaram tornarão um pouco mais evidente a violência contida em todas as manifestações semelhantes, seja de que lado do espectro ideológico for.
Estamos caminhando rapidamente para uma situação em que qualquer discordância ou indignação com o poder público é, por si só, justificativa para invadir propriedade pública e interromper o funcionamento normal das instituições. Estudantes contra a reforma do ensino invadem escolas; sem-teto contra a PEC do Teto interditam vias arteriais da maior cidade do país; e agora cidadãos “revoltados” invadem o Congresso. Parece justo.
As opiniões públicas se dividem: no grande público, prevalece o repúdio às invasões estudantis e, ainda que não tenhamos pesquisas ainda, é provável que a invasão do Congresso e outros atos “anti-políticos” sejam recebidos de forma muito mais positiva. Já na elite intelectual e cultural, que é quem domina o discurso dos grandes meios de comunicação, as invasões estudantis são vistas com muita condescendência e a invasão do Congresso é um horrível prenúncio do fascismo que nos espreita.
Penso que, em uma sociedade séria, nenhum desses atos tem lugar. E o juízo acerca deles não pode ter nada a ver com as pautas defendidas (se de direita ou de esquerda, se progressista ou conservadora) e nem com a identidade dos manifestantes (se jovens ou velhos, estudantes ou aposentados). Não há nenhuma instância imparcial e objetiva para nos dizer quais causas têm ou não o direito de romper a ordem institucional do país. Há apenas a decisão fundamental: quem deve prevalecer, as regras do funcionamento da sociedade ou a vontade – isto é, a força – de alguns de seus membros?
A invasão de uma escola ou de um parlamento pode ter aspectos estéticos: os jovens que sonham uma nova realidade, os cidadãos indignados que dão um basta na esbórnia dos políticos. Fora do mundo da imaginação, são apenas uma instância de como as vontades particulares se sobrepõem à lei e à ordem.
Penso que ser capaz de colocar o bom funcionamento da sociedade antes das nossas paixões ideológicas – mesmo quando estas estão corretas – é um passo fundamental para que a sociedade funcione melhor para todos, que é a finalidade que toda ideologia supostamente prega. Sendo assim, a cena grotesca de cinquenta pessoas invadindo a Câmara pedindo intervenção militar serve para colocar em relevo o grotesco que é permitir que as opiniões de um punhado de pessoas prevaleça sobre as próprias bases da sociedade. Permissão que, quando as bandeiras ideológicas são outras (não melhores, apenas menos chocantes à opinião vigente), damos sem pensar duas vezes.
Acho ótimo que um grupo de cinquenta militantes de direita tenha invadido (ou seria “ocupado”) a Câmara dos Deputados em Brasília. As palavras de ordem incluíram pedidos de golpe militar, além de louvores aos nomes dos presidentes militares e do juiz Sergio Moro. Não sei se lhes ocorreu que, em um regime militar, no qual a força bruta prevalece necessariamente sobre a ordem jurídica, um juiz como o Sergio Moro teria que ficar em seu canto, sem jamais sonhar em perseguir os corruptos ligados ao poder, como faz hoje em dia com tanta liberdade.
Concordo com a causa dos manifestantes? Evidentemente, nem um pouco. Só me dá alguma esperança pensar que os meios que eles utilizaram tornarão um pouco mais evidente a violência contida em todas as manifestações semelhantes, seja de que lado do espectro ideológico for.
Estamos caminhando rapidamente para uma situação em que qualquer discordância ou indignação com o poder público é, por si só, justificativa para invadir propriedade pública e interromper o funcionamento normal das instituições. Estudantes contra a reforma do ensino invadem escolas; sem-teto contra a PEC do Teto interditam vias arteriais da maior cidade do país; e agora cidadãos “revoltados” invadem o Congresso. Parece justo.
As opiniões públicas se dividem: no grande público, prevalece o repúdio às invasões estudantis e, ainda que não tenhamos pesquisas ainda, é provável que a invasão do Congresso e outros atos “anti-políticos” sejam recebidos de forma muito mais positiva. Já na elite intelectual e cultural, que é quem domina o discurso dos grandes meios de comunicação, as invasões estudantis são vistas com muita condescendência e a invasão do Congresso é um horrível prenúncio do fascismo que nos espreita.
Penso que, em uma sociedade séria, nenhum desses atos tem lugar. E o juízo acerca deles não pode ter nada a ver com as pautas defendidas (se de direita ou de esquerda, se progressista ou conservadora) e nem com a identidade dos manifestantes (se jovens ou velhos, estudantes ou aposentados). Não há nenhuma instância imparcial e objetiva para nos dizer quais causas têm ou não o direito de romper a ordem institucional do país. Há apenas a decisão fundamental: quem deve prevalecer, as regras do funcionamento da sociedade ou a vontade – isto é, a força – de alguns de seus membros?
A invasão de uma escola ou de um parlamento pode ter aspectos estéticos: os jovens que sonham uma nova realidade, os cidadãos indignados que dão um basta na esbórnia dos políticos. Fora do mundo da imaginação, são apenas uma instância de como as vontades particulares se sobrepõem à lei e à ordem.
Penso que ser capaz de colocar o bom funcionamento da sociedade antes das nossas paixões ideológicas – mesmo quando estas estão corretas – é um passo fundamental para que a sociedade funcione melhor para todos, que é a finalidade que toda ideologia supostamente prega. Sendo assim, a cena grotesca de cinquenta pessoas invadindo a Câmara pedindo intervenção militar serve para colocar em relevo o grotesco que é permitir que as opiniões de um punhado de pessoas prevaleça sobre as próprias bases da sociedade. Permissão que, quando as bandeiras ideológicas são outras (não melhores, apenas menos chocantes à opinião vigente), damos sem pensar duas vezes.