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Wagner Lenhart: "Estagnação pode levar ao fracasso. Promover mudanças é uma necessidade urgente"

Instituto Millenium entrevistou Wagner Lenhart, Diretor Institucional do Banco do Estado do Rio Grande do Sul S.A., o Banrisul

Wagner Lenhart (Divulgação/Divulgação)
Wagner Lenhart (Divulgação/Divulgação)

Apresentamos a seguir uma entrevista concedida por Wagner Lenhart, Diretor Institucional do Banco do Estado do Rio Grande do Sul S.A. - Banrisul. Lenhart possui uma vasta experiência na área de administração pública e direito, adquirida ao longo de uma carreira notável que incluiu cargos como Secretário Nacional de Gestão e Desempenho de Pessoal do Governo Federal, Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Gestão e da Secretaria Municipal de Desestatização e Parcerias da Prefeitura de São Paulo. Além disso, seu background acadêmico, com um mestrado em Direito pela UFRGS e um MBA em Gestão Empresarial pela ESPM, o destaca como uma voz autorizada em temas de administração pública.

Esta entrevista, conduzida pela equipe do Instituto Millenium, antecipa algumas das questões que Lenhart abordará como palestrante no 1º Fórum Liberdade e Democracia de Curitiba, no dia 7 de julho. Nesta conversa, Wagner Lenhart nos proporciona sua visão sobre os desafios de modernizar a administração pública no Brasil e oferece reflexões que estão intimamente relacionadas com a nossa área de pesquisa sobre Agilidade Institucional. Exploramos como as democracias liberais podem se adaptar para se tornarem mais ágeis e eficazes, à medida que enfrentam processos de tomada de decisão e implementação cada vez mais demorados e onerosos. Não perca esta discussão enriquecedora e lembre-se: você pode adquirir seu ingresso para o 1º Fórum Liberdade e Democracia de Curitiba em https://forumcwb.com.br/.

Instituto Millenium: No Brasil, frequentemente parece mais fácil bloquear mudanças do que implementar reformas necessárias. Enquanto isso pode ser útil em países desenvolvidos para evitar erros, em países em desenvolvimento isso pode limitar o próprio aprendizado com os erros. Diante disso, quais desafios você identifica que precisamos superar para diminuir a resistência de grupos que frequentemente bloqueiam mudanças que poderiam tornar o setor público mais eficaz?

Wagner Lenhart: Por um lado, é até compreensível a resistência dos governos em correr riscos e propor soluções inovadoras, dado o impacto direto que políticas públicas têm na população, bem como o escrutínio de eleitores, imprensa e órgãos de controle. No entanto, em um mundo em rápida mudança, a estagnação pode levar ao fracasso. Promover mudanças e reformas é uma necessidade urgente.

Os desafios para superar a resistência à mudança são múltiplos. Primeiramente, precisamos estabelecer incentivos adequados. O atual sistema de incentivos na administração pública brasileira é, muitas vezes, disfuncional e não alinha as expectativas e necessidades da população com as metas dos órgãos públicos e os incentivos individuais dos agentes.

Em segundo lugar, devemos aprender a testar. Muitas vezes, reformas não avançam por receio de errar, ou por se considerar que os riscos superam os possíveis ganhos. Para superar isso, precisamos de uma cultura de abertura a novas ideias, testar soluções privadas para problemas públicos e, sempre que possível, a criação de ambientes de teste controlados.

Em terceiro lugar, é necessário ser mais pragmático. Muitas vezes perdemos tempo com debates ideológicos que não resolvem os problemas reais. Precisamos focar nos dados e na realidade.

Por fim, é preciso neutralizar a pressão de grupos de interesse. Profissionais e grupos econômicos possuem meios de influenciar governos, e cabe aos órgãos estatais zelar pelos interesses da sociedade. A atuação do estado não pode ser determinada por uma minoria barulhenta e organizada, enquanto a maioria silenciosa arca com as consequências.

Instituto Millenium: O funcionamento do setor público no Brasil enfrenta inúmeros desafios. Portanto, escolher onde intervir é crucial para maximizar o impacto na eficiência do Estado. Quais áreas você acredita serem as mais promissoras para melhorar a capacidade do Estado brasileiro? E como devemos priorizar essas áreas?

Wagner Lenhart: Um dos principais setores para intervenção é, sem dúvida, a educação. Nossos resultados atuais estão distantes do que precisamos para construir um país mais justo e próspero. Nosso modelo educacional falha repetidamente em preparar nossas crianças para uma vida adulta produtiva e independente, e até mesmo aspectos básicos, como alfabetização e operações matemáticas, são um desafio.

Embora muitos falem sobre a prioridade da educação, poucos estão dispostos a enfrentar as questões mais difíceis e a confrontar os interesses estabelecidos. Precisamos de uma mudança profunda de paradigma. Precisamos buscar inovação, como o governo inglês, que estimula projetos educacionais inovadores, financia propostas de organizações privadas e mede rigorosamente os resultados dos alunos. Ou como Singapura, que, mesmo sendo um dos melhores sistemas educacionais do mundo, reconhece a necessidade de constante reinvenção.

No Brasil, o desafio é colossal e precisa ser urgentemente enfrentado. Mais do que simplesmente aumentar os investimentos, é necessário repensar nosso modelo, incentivar abordagens inovadoras, superar preconceitos ideológicos e interesses corporativos, adotar métodos apropriados de medição de resultados e estabelecer metas robustas, focadas principalmente nas crianças e em seu desenvolvimento.

Além disso, segurança, justiça, saúde e órgãos regulatórios também são áreas de alta sensibilidade e importância. Avanços na gestão e melhorias nas políticas públicas nesses setores têm grande potencial para impactar positivamente a vida das pessoas.

Instituto Millenium: Os servidores públicos são essenciais para qualquer mudança bem-sucedida. Contudo, muitas vezes, reformas são vistas por eles como ameaças aos seus interesses. Diante disso, como podemos alinhar os incentivos dos servidores públicos com os objetivos de melhorar a capacidade do Estado? Como poderíamos cultivar uma cultura de aprendizado constante e adaptação para tornar o serviço público mais dinâmico?

Wagner Lenhart: Os servidores públicos são, indiscutivelmente, fundamentais para a melhoria da capacidade do Estado. O capital humano é o ativo mais valioso de qualquer organização, o que não seria diferente na administração pública. Toda grande transformação no governo deve envolver os servidores públicos, e é por isso que a reforma administrativa é tão vital.

Não podemos pensar em um governo mais eficiente, que preste melhores serviços e atenda às necessidades da população, sem aprimorar profundamente o modelo de serviço público e a forma como o Estado brasileiro gerencia seu pessoal. Temos um capital humano incrível no serviço público, cheio de pessoas altamente qualificadas e engajadas que muitas vezes são limitadas por um sistema ultrapassado e disfuncional, especialmente no que se refere aos incentivos.

A gestão de pessoas no serviço público brasileiro tem sido historicamente negligenciada. A eficiência não se limita apenas à folha de pagamento e à negociação salarial com representação sindical. Trata-se também da aplicação de técnicas eficazes de recrutamento e seleção, gestão de desempenho, treinamento e desenvolvimento, e engajamento no ambiente de trabalho.

Para superar as resistências e viabilizar as mudanças necessárias, o primeiro passo é um amplo processo de comunicação e diálogo com os servidores públicos e a sociedade. Precisamos demonstrar claramente a necessidade de revisitar o modelo atual, instituído pela Constituição de 1988, em um contexto econômico e social diferente. O mundo está mudando rapidamente, e acompanhar esse ritmo não é uma opção, é uma necessidade para a sobrevivência.

Os servidores públicos precisam entender que um sistema incapaz de atender às expectativas da sociedade trará problemas graves e terá um impacto negativo sobre eles próprios. Muitos entes da federação já estão enfrentando dificuldades financeiras e, nestes casos, os servidores enfrentam situações de penúria, com congelamento de salários e novas contratações.

Os bons servidores merecem ser valorizados e reconhecidos, mas isso só será possível com um modelo atualizado, que traga agilidade e flexibilidade para o serviço público, recompense aqueles que se destacam e responsabilize aqueles que não cumprem suas obrigações. Esta é a mensagem que todos precisam compreender.

Instituto Millenium: Diante da necessidade de um Estado mais eficiente no Brasil, mas também da presença de um Estado caro e grande em muitos aspectos, como podemos reduzir ou qualificar o escopo de intervenção do governo sem comprometer sua capacidade de fornecer serviços públicos de maneira eficaz e de qualidade?

Wagner Lenhart: A reforma do Estado é um passo fundamental para torná-lo mais eficiente no Brasil. Primeiramente, precisamos atualizar o governo brasileiro para o século XXI, incorporando técnicas e métodos modernos de gestão que nos permitam enfrentar futuros desafios com competência. Isso abrange várias áreas de gestão: precisamos fazer reformas profundas na forma como gerenciamos pessoas, contratamos bens e serviços, estruturamos nossa organização, planejamos e acompanhamos metas e indicadores, e administramos nossos ativos.

Em segundo lugar, é essencial ter foco e ser capaz de definir prioridades. Os recursos são limitados, e é crucial saber onde devemos investir nosso tempo e dinheiro. Os líderes governamentais precisam aprender a dizer "não" e concentrar-se no que realmente terá um impacto positivo na vida das pessoas e resolverá seus problemas mais urgentes.

Em terceiro lugar, devemos abrir espaço para a inovação e soluções fora do convencional, incentivando indivíduos e organizações privadas a participarem, propor e implementar soluções para problemas públicos. Isso pode abranger uma variedade de áreas, como mobilidade urbana, saneamento básico, preservação ambiental, educação e saúde.