Ventura: "Enquanto houver déficit, a estabilidade é relativa"
"O amanhã deixará ainda mais evidente a desvalia e onerosidade dos paternalistas arranjos estatais arcaicos"
institutomillenium
Publicado em 24 de janeiro de 2019 às 11h40.
Última atualização em 24 de janeiro de 2019 às 17h07.
Visando recompor o equilíbrio das contas públicas brasileiras, a Emenda Constitucional nº 19/1998 determinou a redução de pelo menos 20% das despesas com cargos em comissão e funções de confiança, bem como a exoneração dos servidores não estáveis (artigo 169, §3º, CF). Para o caso de insuficiência das referidas medidas, o legislador foi além, prevendo que “o servidor estável poderá perder o cargo, desde que o ato normativo motivado de cada um dos Poderes especifique a atividade funcional, o órgão ou unidade administrativa objeto da redução de pessoal” (artigo 169, §4º), fixando-se o critério de indenização “correspondente a um mês de remuneração por ano de serviço” (artigo 169, §5º). Portanto, o desequilíbrio das contas públicas é causa suficiente para a exoneração de servidores estáveis.
Todavia, uma causa suficiente não significa arbitrária ou incondicionada. O STF já decidiu que “a perda de cargo de servidor público estável deve atender aos requisitos constitucionais” (DJ 23.090.2005), devendo, em sua dimensão dinâmica, observar os ditames inerentes ao devido processo legal administrativo. Ao lado das garantias procedimentais gerais, há necessários requisitos de substância.
Leia mais de Sebastião Ventura
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Bolsonaro conseguirá?
Para bem regrar as hipóteses de perda de cargo público estável por excesso de despesa, a Lei nº 9.801/1999 expressamente determinou que a exoneração dever ser precedida de “ato normativo motivado” (artigo 2º, caput), de competência dos respectivos Chefes de cada um dos Poderes da União, Estados, Municípios e do Distrito Federal. Especialmente, para evitar perseguições políticas de ocasião, foi determinada a adoção de um “critério geral impessoal”, tendo como elemento definidor um dos seguintes parâmetros objetivos: a) menor tempo de serviço; b) maior remuneração; ou, c) menor idade. Por derradeiro, além da previsão do prazo de pagamento da indenização, a lei determinou que os cargos vagos pelas exonerações devem ser declarados extintos, sendo vedado a criação de funções iguais ou assemelhadas nos quatro anos subsequentes à extinção (artigo 4º, Lei nº 9.801/1999).
Em que pese a expressa permissão normativa, a exoneração de servidores estáveis traduz tema constitucional altamente sensível, para não dizer dramático. É de se lamentar que a incompetência governamental assombrosa tenha produzido um Estado inorgânico, pródigo e ineficiente. Infelizmente, fomos levados na contramão da História, deixando-nos ludibriar pela mentira política demagógica, populista e irresponsável. Agora, o problema está posto, exigindo respostas inadiáveis.
Em tempo, a Lei de Responsabilidade Fiscal foi categórica ao declarar que “a responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas” (artigo 1º, §1º, da LC nº 101/2000). Mais uma regra jurídica condenada ao pó. No Brasil, legislamos muito, mas o cumprimento da lei se dá a conta gotas.
+ Ouça! Gustavo Grisa: “É preciso trazer o princípio da flexibilidade para a gestão pública”
A hora exige ação, pois o futuro pressiona a realidade. A tecnologia é a antítese da burocracia, sendo os instrumentos de inteligência artificial um elemento acelerador da redundância burocrática. Portanto, o amanhã deixará ainda mais evidente a desvalia e onerosidade dos paternalistas arranjos estatais arcaicos.
Por tudo, temos que fazer uma nova inflexão sobre a base da administração pública, resgatando nossa capacidade de investimento estratégico de forma a garantir a competitividade do Brasil nos ágeis jogos do poder global. Não dá mais para fugir do enfrentamento dos fatos ou fingir que não é conosco. Chegamos a uma inescapável bifurcação institucional: de um lado, a possibilidade de um futuro promissor através de um novo e dinâmico paradigma de gestão pública; do outro, o cadafalso do déficit estrutural e certeza do retrocesso econômico-social.
Na frieza do papel, a escolha soa fácil. Resta saber se, como nação, queremos pagar o preço do progresso ou a conta do atraso.
*Advogado especializado em Direito do Estado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Certificado pelo Programa de Negociação de Harvard para Senior Executives. Membro Diretor da Federasul/RS. Escreve sobre questões contemporâneas, envolvendo temas políticos, econômicos e constitucionais.
Visando recompor o equilíbrio das contas públicas brasileiras, a Emenda Constitucional nº 19/1998 determinou a redução de pelo menos 20% das despesas com cargos em comissão e funções de confiança, bem como a exoneração dos servidores não estáveis (artigo 169, §3º, CF). Para o caso de insuficiência das referidas medidas, o legislador foi além, prevendo que “o servidor estável poderá perder o cargo, desde que o ato normativo motivado de cada um dos Poderes especifique a atividade funcional, o órgão ou unidade administrativa objeto da redução de pessoal” (artigo 169, §4º), fixando-se o critério de indenização “correspondente a um mês de remuneração por ano de serviço” (artigo 169, §5º). Portanto, o desequilíbrio das contas públicas é causa suficiente para a exoneração de servidores estáveis.
Todavia, uma causa suficiente não significa arbitrária ou incondicionada. O STF já decidiu que “a perda de cargo de servidor público estável deve atender aos requisitos constitucionais” (DJ 23.090.2005), devendo, em sua dimensão dinâmica, observar os ditames inerentes ao devido processo legal administrativo. Ao lado das garantias procedimentais gerais, há necessários requisitos de substância.
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Para bem regrar as hipóteses de perda de cargo público estável por excesso de despesa, a Lei nº 9.801/1999 expressamente determinou que a exoneração dever ser precedida de “ato normativo motivado” (artigo 2º, caput), de competência dos respectivos Chefes de cada um dos Poderes da União, Estados, Municípios e do Distrito Federal. Especialmente, para evitar perseguições políticas de ocasião, foi determinada a adoção de um “critério geral impessoal”, tendo como elemento definidor um dos seguintes parâmetros objetivos: a) menor tempo de serviço; b) maior remuneração; ou, c) menor idade. Por derradeiro, além da previsão do prazo de pagamento da indenização, a lei determinou que os cargos vagos pelas exonerações devem ser declarados extintos, sendo vedado a criação de funções iguais ou assemelhadas nos quatro anos subsequentes à extinção (artigo 4º, Lei nº 9.801/1999).
Em que pese a expressa permissão normativa, a exoneração de servidores estáveis traduz tema constitucional altamente sensível, para não dizer dramático. É de se lamentar que a incompetência governamental assombrosa tenha produzido um Estado inorgânico, pródigo e ineficiente. Infelizmente, fomos levados na contramão da História, deixando-nos ludibriar pela mentira política demagógica, populista e irresponsável. Agora, o problema está posto, exigindo respostas inadiáveis.
Em tempo, a Lei de Responsabilidade Fiscal foi categórica ao declarar que “a responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas” (artigo 1º, §1º, da LC nº 101/2000). Mais uma regra jurídica condenada ao pó. No Brasil, legislamos muito, mas o cumprimento da lei se dá a conta gotas.
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A hora exige ação, pois o futuro pressiona a realidade. A tecnologia é a antítese da burocracia, sendo os instrumentos de inteligência artificial um elemento acelerador da redundância burocrática. Portanto, o amanhã deixará ainda mais evidente a desvalia e onerosidade dos paternalistas arranjos estatais arcaicos.
Por tudo, temos que fazer uma nova inflexão sobre a base da administração pública, resgatando nossa capacidade de investimento estratégico de forma a garantir a competitividade do Brasil nos ágeis jogos do poder global. Não dá mais para fugir do enfrentamento dos fatos ou fingir que não é conosco. Chegamos a uma inescapável bifurcação institucional: de um lado, a possibilidade de um futuro promissor através de um novo e dinâmico paradigma de gestão pública; do outro, o cadafalso do déficit estrutural e certeza do retrocesso econômico-social.
Na frieza do papel, a escolha soa fácil. Resta saber se, como nação, queremos pagar o preço do progresso ou a conta do atraso.
*Advogado especializado em Direito do Estado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Certificado pelo Programa de Negociação de Harvard para Senior Executives. Membro Diretor da Federasul/RS. Escreve sobre questões contemporâneas, envolvendo temas políticos, econômicos e constitucionais.