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“Só há um caminho para o crescimento: o aumento da produtividade do trabalho”

O autor do livro “Inflação e crises – o papel da moeda” (Elsevier, 2014), Affonso Celso Pastore, afirma que o “bônus demográfico”, isto é, o aumento da população mais jovem e ativa, está perto do fim e que a retomada do crescimento passará necessariamente pelo aumento da produtividade da mão de obra. O economista afirma ainda que não existe uma solução mágica para os problemas da economia brasileira. Para ele, o aquecimento da […] Leia mais

DR

Da Redação

Publicado em 10 de dezembro de 2014 às 07h43.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às 08h12.

O autor do livro “Inflação e crises – o papel da moeda” (Elsevier, 2014), Affonso Celso Pastore, afirma que o “bônus demográfico”, isto é, o aumento da população mais jovem e ativa, está perto do fim e que a retomada do crescimento passará necessariamente pelo aumento da produtividade da mão de obra.

O economista afirma ainda que não existe uma solução mágica para os problemas da economia brasileira. Para ele, o aquecimento da economia depende de um conjunto de fatores. “Metas para os superávits primários, metas de inflação e razoável grau de flutuação cambial seriam um bom começo”, pontua Pastore.

Ele lembra que as projeções mais otimistas apontam crescimento perto de 1% para 2015. Nesta entrevista, ele refuta o argumento de que o país parou de crescer por causa da crise internacional e fala ainda sobre a importância da independência do Banco Central.

Instituto Millenium: No livro “Inflação e crises – o papel da moeda”, o senhor descreve a evolução da política econômica brasileira desde a criação do Banco Central. Qual foi a reforma mais impactante nesse período? Affonso Celso Pastore: O Banco Central foi criado em 1966, mas era fraco, sem independência. Várias reformas foram realizadas em 1966, muitas delas visando criar condições para um maior controle fiscal. Por exemplo, foi feita uma reforma tributária que eliminou vários defeitos que existiam no regime anterior, e foram criados títulos indexados da dívida pública, que permitiam o financiamento não inflacionário dos déficits públicos. Mas, tanto antes da criação do Banco Central, como por muitos anos após, a política fiscal persistiu sendo expansionista, o que diante de um Banco Central fraco é a receita para inflações elevadas, e foi isso o que ocorreu até a reforma monetária do Plano Real, em 1994.

Imil: A independência do Banco Central foi muito debatida durante a campanha eleitoral de 2014. Qual é a importância do Banco Central autônomo para as políticas monetária e fiscal?
Pastore: A independência que é relevante para permitir o controle da inflação é a “independência no uso dos instrumentos”. Em outras palavras, os diretores do Banco Central têm que ter plena liberdade de elevar (ou reduzir) a taxa de juros na intensidade que for necessária para manter a inflação dentro da meta.

Imil: A política fiscal tem sido alvo de críticas recorrentes. Especialistas denunciam a falta de clareza e de transparência dos gastos públicos. O superávit primário tem sido alcançado através de “pedaladas fiscais”. O senhor acha que precisamos fazer um saneamento dos gastos da União? Como isso deve ser feito?
Pastore: Nos últimos anos a despesa do governo central tem crescido em relação ao PIB mais do que em qualquer período histórico. Ao lado disso, o governo tem renunciado a receitas mais do que em qualquer outro período histórico. Entre 2011 e 2014, os gastos primários cresceram mais de 2,5% em relação ao PIB, e o governo renunciou mais de 2% do PIB de receitas. Com isso, o superávit primário desapareceu e a dívida bruta retomou uma trajetória de elevação que não é sustentável. O governo terá que fazer opções, escolhendo gastos cujo crescimento será controlado e tributos que serão elevados. Gradualmente terá que retornar a
superávits primários mais elevados, no mínimo visando estabilizar a relação dívida/PIB.

Imil: Mesmo com o histórico de hiperinflação, o Brasil tem mantido a inflação no teto da meta. Como o senhor avalia essa situação?
Pastore: A inflação no teto da meta é um resultado muito ruim. Ela supera a inflação dos demais países emergentes e impõe custos ao país. O teto da meta não é um bom alvo.

Imil: As autoridades têm relacionado o baixo crescimento da economia à crise internacional e ao pessimismo dos empresários. Até que ponto esse é um argumento legítimo? Estamos vivendo, de fato, um momento de crise na economia mundial?
Pastore: Quando a crise internacional eclodiu, o Brasil estava preparado para enfrentá-la. A inflação estava abaixo da meta, o que permitia reduzir a taxa de juros; a dívida pública havia caído, o que permitia o uso de políticas fiscais contra cíclicas; e o sistema bancário havia sido saneado, o que permitia expandir o crédito. Tudo isso foi feito, e em grande parte devido a isso a recessão no Brasil foi branda e muito curta. Duraram apenas dois trimestres, contra sete nos Estados Unidos e cinco na Europa. No início de 2010, a economia brasileira já havia retornado ao pleno emprego no mercado de trabalho, e a produção industrial já havia retornado ao pico prévio. Não havia mais o efeito negativo da crise mundial. O que ocorreu daí em diante foi uma sucessão de erros como o abuso dos estímulos ao crédito e o crescimento dos gastos públicos que elevaram as incertezas e reduziram a taxa de investimentos.

Imil: Economistas, empresários e cidadãos parecem concordar com a necessidade de mudanças nos rumos da economia. Quais as prioridades?
Pastore: Não há uma “bala de prata”. O Brasil teria que retornar a práticas mais sadias de política econômica. O retorno ao “tripé” da política macroeconômica com metas para os superávits primários, metas de inflação e razoável grau de flutuação cambial seriam um bom começo.

Imil: As expectativas para 2015 não são muito positivas. Além do baixo crescimento e da inflação alta, amargaremos a crise energética. Qual é a sua expectativa para o próximo ano?
Pastore: O Banco Central coleta as expectativas junto aos participantes do mercado e o consenso é de um crescimento próximo de 1% em 2015. Infelizmente, esta pode ser uma estimativa otimista.

Imil: A pirâmide demográfica está em um momento positivo para a economia, com o aumento da população ativa. O senhor acha que o governo soube aproveitar o bônus demográfico ou estamos deixando a oportunidade passar?
Pastore: No passado havia abundância de mão de obra no Brasil. Nos anos 1950 e 1960, a população crescia a uma taxa de 2,5% ao ano, ou mais, e o grosso da população brasileira estava no interior, em atividades agrícolas. Atualmente a população cresce abaixo de 1% ao ano e o grosso da população já migrou para as cidades. Se o “bônus demográfico” ainda não se encerrou está muito próximo de terminar. Daqui para frente só há um caminho para o crescimento: o aumento da produtividade do trabalho. Isso requer mais capital por trabalhador e mais intensidade no capital humano.

O autor do livro “Inflação e crises – o papel da moeda” (Elsevier, 2014), Affonso Celso Pastore, afirma que o “bônus demográfico”, isto é, o aumento da população mais jovem e ativa, está perto do fim e que a retomada do crescimento passará necessariamente pelo aumento da produtividade da mão de obra.

O economista afirma ainda que não existe uma solução mágica para os problemas da economia brasileira. Para ele, o aquecimento da economia depende de um conjunto de fatores. “Metas para os superávits primários, metas de inflação e razoável grau de flutuação cambial seriam um bom começo”, pontua Pastore.

Ele lembra que as projeções mais otimistas apontam crescimento perto de 1% para 2015. Nesta entrevista, ele refuta o argumento de que o país parou de crescer por causa da crise internacional e fala ainda sobre a importância da independência do Banco Central.

Instituto Millenium: No livro “Inflação e crises – o papel da moeda”, o senhor descreve a evolução da política econômica brasileira desde a criação do Banco Central. Qual foi a reforma mais impactante nesse período? Affonso Celso Pastore: O Banco Central foi criado em 1966, mas era fraco, sem independência. Várias reformas foram realizadas em 1966, muitas delas visando criar condições para um maior controle fiscal. Por exemplo, foi feita uma reforma tributária que eliminou vários defeitos que existiam no regime anterior, e foram criados títulos indexados da dívida pública, que permitiam o financiamento não inflacionário dos déficits públicos. Mas, tanto antes da criação do Banco Central, como por muitos anos após, a política fiscal persistiu sendo expansionista, o que diante de um Banco Central fraco é a receita para inflações elevadas, e foi isso o que ocorreu até a reforma monetária do Plano Real, em 1994.

Imil: A independência do Banco Central foi muito debatida durante a campanha eleitoral de 2014. Qual é a importância do Banco Central autônomo para as políticas monetária e fiscal?
Pastore: A independência que é relevante para permitir o controle da inflação é a “independência no uso dos instrumentos”. Em outras palavras, os diretores do Banco Central têm que ter plena liberdade de elevar (ou reduzir) a taxa de juros na intensidade que for necessária para manter a inflação dentro da meta.

Imil: A política fiscal tem sido alvo de críticas recorrentes. Especialistas denunciam a falta de clareza e de transparência dos gastos públicos. O superávit primário tem sido alcançado através de “pedaladas fiscais”. O senhor acha que precisamos fazer um saneamento dos gastos da União? Como isso deve ser feito?
Pastore: Nos últimos anos a despesa do governo central tem crescido em relação ao PIB mais do que em qualquer período histórico. Ao lado disso, o governo tem renunciado a receitas mais do que em qualquer outro período histórico. Entre 2011 e 2014, os gastos primários cresceram mais de 2,5% em relação ao PIB, e o governo renunciou mais de 2% do PIB de receitas. Com isso, o superávit primário desapareceu e a dívida bruta retomou uma trajetória de elevação que não é sustentável. O governo terá que fazer opções, escolhendo gastos cujo crescimento será controlado e tributos que serão elevados. Gradualmente terá que retornar a
superávits primários mais elevados, no mínimo visando estabilizar a relação dívida/PIB.

Imil: Mesmo com o histórico de hiperinflação, o Brasil tem mantido a inflação no teto da meta. Como o senhor avalia essa situação?
Pastore: A inflação no teto da meta é um resultado muito ruim. Ela supera a inflação dos demais países emergentes e impõe custos ao país. O teto da meta não é um bom alvo.

Imil: As autoridades têm relacionado o baixo crescimento da economia à crise internacional e ao pessimismo dos empresários. Até que ponto esse é um argumento legítimo? Estamos vivendo, de fato, um momento de crise na economia mundial?
Pastore: Quando a crise internacional eclodiu, o Brasil estava preparado para enfrentá-la. A inflação estava abaixo da meta, o que permitia reduzir a taxa de juros; a dívida pública havia caído, o que permitia o uso de políticas fiscais contra cíclicas; e o sistema bancário havia sido saneado, o que permitia expandir o crédito. Tudo isso foi feito, e em grande parte devido a isso a recessão no Brasil foi branda e muito curta. Duraram apenas dois trimestres, contra sete nos Estados Unidos e cinco na Europa. No início de 2010, a economia brasileira já havia retornado ao pleno emprego no mercado de trabalho, e a produção industrial já havia retornado ao pico prévio. Não havia mais o efeito negativo da crise mundial. O que ocorreu daí em diante foi uma sucessão de erros como o abuso dos estímulos ao crédito e o crescimento dos gastos públicos que elevaram as incertezas e reduziram a taxa de investimentos.

Imil: Economistas, empresários e cidadãos parecem concordar com a necessidade de mudanças nos rumos da economia. Quais as prioridades?
Pastore: Não há uma “bala de prata”. O Brasil teria que retornar a práticas mais sadias de política econômica. O retorno ao “tripé” da política macroeconômica com metas para os superávits primários, metas de inflação e razoável grau de flutuação cambial seriam um bom começo.

Imil: As expectativas para 2015 não são muito positivas. Além do baixo crescimento e da inflação alta, amargaremos a crise energética. Qual é a sua expectativa para o próximo ano?
Pastore: O Banco Central coleta as expectativas junto aos participantes do mercado e o consenso é de um crescimento próximo de 1% em 2015. Infelizmente, esta pode ser uma estimativa otimista.

Imil: A pirâmide demográfica está em um momento positivo para a economia, com o aumento da população ativa. O senhor acha que o governo soube aproveitar o bônus demográfico ou estamos deixando a oportunidade passar?
Pastore: No passado havia abundância de mão de obra no Brasil. Nos anos 1950 e 1960, a população crescia a uma taxa de 2,5% ao ano, ou mais, e o grosso da população brasileira estava no interior, em atividades agrícolas. Atualmente a população cresce abaixo de 1% ao ano e o grosso da população já migrou para as cidades. Se o “bônus demográfico” ainda não se encerrou está muito próximo de terminar. Daqui para frente só há um caminho para o crescimento: o aumento da produtividade do trabalho. Isso requer mais capital por trabalhador e mais intensidade no capital humano.

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