Nova nuvem: migração coloca as empresas no grupo dos que podem aproveitar o melhor da digitalização (NTT DATA/Divulgação)
Instituto Millenium
Publicado em 7 de novembro de 2025 às 23h20.
Por Maurício F. Bento*
A cena se repete em todo o Brasil: uma rodovia esburacada, um hospital com filas intermináveis, uma licença ambiental que leva uma década para sair. Para o cidadão, é o retrato da ineficiência. Para o país, é o freio de mão puxado no desenvolvimento. Enquanto uma ampla reforma administrativa relatada pelo Deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) avança no Congresso, devemos vê-la como uma oportunidade de discutir melhorias necessárias para a gestão pública nacional.
A proposta é ambiciosa e se estrutura em eixos essenciais para redesenhar o Estado brasileiro. O primeiro deles é a Estratégia, Governança e Gestão, que ataca um problema crônico: a falta de planejamento. Governos vêm e vão, mas o Brasil continua carente de uma visão estratégica de longo prazo e de uma avaliação séria sobre o impacto de suas ações. Precisamos de um Estado que planeje o futuro, meça seus resultados e corrija rotas, em vez de operar no improviso e na urgência do calendário eleitoral.
Complementar a isso, a Transformação Digital surge não como uma opção, mas como uma necessidade inadiável. A digitalização de serviços é a ponte mais curta entre o governo e o cidadão, capaz de simplificar processos, aumentar a transparência e reduzir drasticamente os custos e as oportunidades para a corrupção. Um Estado digital é um Estado mais ágil e acessível a todos.
No eixo de Profissionalização do Serviço Público, debate-se o coração da máquina: as pessoas. A estabilidade, por exemplo, é uma ferramenta indispensável para o Estado de direito. Carreiras que exercem o poder do Estado – como policiais, auditores fiscais e membros do Judiciário – precisam de proteção para agir de forma imparcial contra pressões políticas. Contudo, essa proteção não pode ser utilizada como escudo para a ineficiência. É fundamental encontrar o equilíbrio, mantendo garantias para as funções essenciais, mas criando mecanismos de avaliação que recompensem o mérito e corrijam a baixa performance.
Talvez o ponto de maior apelo popular seja o eixo da Extinção dos Privilégios. É inaceitável que, em pleno século 21, ainda convivamos com benefícios que criam uma casta dentro do Estado. As propostas para combate aos "supersalários", que furam o teto constitucional, são um passo importante, mas a jornada é longa. Benefícios como férias de 60 dias, penduricalhos que inflam contracheques e aposentadorias especiais, sem correspondência com a realidade da imensa maioria dos brasileiros, são resquícios de um passado que não se sustenta mais, nem moral nem financeiramente.
Resolvidos os problemas internos, ainda enfrentamos um inimigo externo à boa gestão: a vetocracia. Mesmo com planejamento e servidores motivados, o poder de paralisar ainda impera. É quando múltiplos órgãos, com suas canetas cheias de poder, conseguem dizer "não", mas nenhum deles tem a força ou a agilidade para construir o "sim". O Parlamento aprova, enquanto o gestor executa, um órgão de controle questiona, uma agência ambiental suspende. O resultado é a paralisia que afugenta investimentos públicos e privados, deixando um rastro de oportunidades perdidas, seja na construção de uma nova ferrovia ou na exploração de recursos estratégicos que poderiam mudar o futuro do país.
No fim das contas, a modernização do Estado brasileiro é a batalha para definir seu propósito. Não deve ser uma guerra contra o servidor público, mas a favor do cidadão que financia a máquina pública e espera, com razão, que ela trabalhe para ele. Precisamos de um Estado que não se esconda atrás de processos, mas que se orgulhe de suas entregas. Um Estado cuja principal função não seja se autoproteger, mas sim impulsionar o potencial de seu povo e de sua nação. A questão não é se o Brasil pode pagar por essa mudança, mas se pode se dar ao luxo de não fazê-la.
*Maurício Bento é graduado e mestre em economia. É Presidente do Instituto de Formação de Líderes de Brasília.