Negócios verdes (Dreamstime)
Colunista - Instituto Millenium
Publicado em 21 de maio de 2025 às 17h56.
Charqueadas é uma cidade no Rio Grande do Sul cuja economia gira em torno de termelétricas a carvão. A cidade possui uma longa história associada à mineração de carvão, que emprega milhares de trabalhadores, diretamente e indiretamente. Para essas pessoas, a promessa de uma transição energética é sinônimo de incerteza. A economia verde, para elas, ameaça não só a economia local mas também a cultura da cidade, a qual se organizou em torno da atividade baseada em energia fóssil.
A transição para uma economia de baixo carbono é uma necessidade urgente diante das mudanças climáticas que ameaçam o futuro do planeta. No entanto, como qualquer transformação estrutural, ela traz impactos significativos, especialmente para os trabalhadores de setores que serão diretamente afetados. Enquanto celebramos avanços tecnológicos e a redução de emissões de gases de efeito estufa, é essencial olhar para o lado humano dessa mudança, que pode deixar milhões de pessoas vulneráveis.
De acordo com o relatório O Futuro do Trabalho 2023, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial (World Economic Forum – WEF) com o apoio da Fundação Dom Cabral (FDC), a transição verde e a transformação tecnológica devem liderar a criação de cerca de 69 milhões de empregos entre 2023 a 2027, em uma base de dados que analisa 673 milhões postos de trabalho. Contudo, no mesmo período 83 milhões, postos poderão ser eliminados. Isso corresponde a uma redução líquida de 14 milhões de postos de trabalho, ou 2% do emprego atual.
Em várias partes do mundo, comunidades inteiras dependem de indústrias altamente poluentes, como as termelétricas movidas a carvão ou o garimpo. Essas atividades, ainda que ambientalmente insustentáveis, são as bases econômicas de muitas regiões, gerando empregos e movimentando economias locais. Para essas populações, o futuro sustentável pode parecer mais uma ameaça do que uma oportunidade.
Para evitar que a transição para uma economia de baixo carbono aprofunde desigualdades sociais, é fundamental adotar o conceito de “transição justa”. Isso significa planejar políticas que garantam o apoio necessário aos trabalhadores e às comunidades afetadas, como programas de requalificação profissional, incentivos para novas indústrias sustentáveis e apoio financeiro durante o período de transição.
Em Charqueadas, por exemplo, seria possível investir em projetos de energia solar e eólica, reaproveitando a infraestrutura já existente e treinando os trabalhadores do setor de carvão para atuar em novas funções. No caso do Vale do Rio Doce, iniciativas de turismo sustentável, agricultura de baixo impacto ambiental ou artesanato poderiam ser alternativas viáveis com o devido apoio governamental e privado.
Governos, empresas e a sociedade precisam enxergar essa transição como uma oportunidade não apenas de salvar o meio ambiente, mas também de corrigir desigualdades históricas. O futuro sustentável deve incluir todos, e isso só será possível se as necessidades dos trabalhadores e das comunidades forem colocadas no centro das políticas públicas.
A luta contra as mudanças climáticas é coletiva, mas os sacrifícios não podem ser desiguais. Ignorar os impactos humanos dessa transição é abrir caminho para mais exclusão e injustiça, algo que um futuro verdadeiramente sustentável não pode permitir.