Guarujá (Divulgação/ Prefeitura do Guarujá)
Colunista - Instituto Millenium
Publicado em 16 de janeiro de 2025 às 11h24.
Cidades do litoral paulista registraram um surto de virose gastrointestinal. Até o momento, de acordo com investigação conduzida pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP), o que se sabe é que a contaminação foi causada pelo norovírus, e que não foi causada por água potável.
A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) realizará testes com fumaça e corante nas redes de esgoto de Itanhaém e Guarujá, a partir do dia 14, com o objetivo de identificar irregularidades na rede de esgoto. No Guarujá, a Sabesp foi notificada devido a suspeitas de que casos estariam relacionados a vazamentos e ligações clandestinas de esgoto na região da praia da Enseada.
Esta crise escancara um ciclo vicioso onde falhas históricas de saneamento básico e os impactos das mudanças climáticas convergem, agravando a saúde pública e expondo uma negligência estrutural que persiste há décadas.
De acordo com a edição de 2022 do Censo Demográfico do IBGE, quase 25% da população brasileira (24,3%), ou aproximadamente 49 milhões de pessoas, continua sem acesso a uma estrutura adequada de saneamento básico. Nas regiões litorâneas, onde a densidade populacional aumenta significativamente durante a alta temporada, a infraestrutura precária é ainda mais sobrecarregada, resultando em despejo de esgoto in natura em rios, mares e praias.
Essa contaminação direta dos recursos hídricos cria um ambiente propício para a proliferação de vírus e bactérias que causam doenças como gastroenterites, hepatites e outras infecções. Assim, a falta de saneamento não é apenas uma questão de descaso com o meio ambiente, mas um problema de saúde pública que penaliza principalmente as populações mais vulneráveis.
As mudanças climáticas intensificam esse cenário de precariedade. Chuvas cada vez mais intensas e frequentes, decorrentes do aquecimento global, sobrecarregam sistemas de drenagem e esgotamento sanitário já frágeis. Esses eventos extremos levam para os rios e mares os dejetos acumulados em áreas sem infraestrutura adequada, contaminando ainda mais as águas costeiras.
Além disso, o aumento do nível do mar e a elevação da temperatura das águas favorecem a sobrevivência e disseminação de agentes patogênicos. O resultado é o aumento de surtos de viroses no litoral, especialmente durante o verão, quando as altas temperaturas e a maior circulação de turistas ampliam os riscos de contágio.
Resolver esse desafio exige uma abordagem integrada. Primeiramente, é fundamental priorizar investimentos em saneamento básico, garantindo a universalização do acesso à água potável e ao tratamento de esgoto. Isso passa por políticas públicas que reconheçam a interseção entre saúde, meio ambiente e infraestrutura.
Paralelamente, é urgente reforçar medidas de adaptação e mitigação às mudanças climáticas, como melhorar a capacidade de drenagem urbana, proteger áreas de manguezais que atuam como barreiras naturais e promover ações que reduzam a emissão de gases de efeito estufa.
O surto de virose no litoral é um alerta de que o Brasil precisa romper com o ciclo de negligência em relação ao saneamento básico e assumir a liderança na luta contra os impactos das mudanças climáticas. O custo da inação é alto: prejuízos econômicos, danos ambientais e, acima de tudo, vidas em risco. Um futuro saudável e sustentável só será possível se tratarmos a saúde pública, o meio ambiente e o combate às mudanças climáticas como faces de uma mesma moeda.