(ABB/Divulgação)
Colunista - Instituto Millenium
Publicado em 5 de junho de 2025 às 07h23.
Em recente conversa promovida pelo Instituto Millenium, com Marina Helena e Wagner Lenhart, o economista Marcos Mendes nos lembrou que o avanço na digitalização dos serviços públicos é um dos caminhos importantes para o avanço do que eu chamaria - e, creio, ele também - de qualidade dos gastos públicos. Como isto se dá?
Um serviço público digitalizado, em primeiro lugar, só faz sentido se ele poupar tempo e dinheiro para o cidadão. Não ter que sair de casa, gastar combustível e passar parte do seu dia em uma fila significa, em resumo, uma poupança de tempo que pode ser utilizada em atividades produtivas. Quem reclamaria disto? Talvez apenas alguns servidores públicos que não entendem que devam ‘servir’ ao público, escondendo-se atrás de alguns carimbos que apenas criam dificuldades (para vender facilidades?) aos cidadãos.
O fato de usarmos um aplicativo do governo para assinaturas, termos o histórico de vacinas em outro e, ainda, a carteira de habilitação digital como um documento com foto válido significa não só economia de tempo: o meio ambiente, por exemplo, também agradece. A despeito do custo inicial de adaptação (como as insistentes falhas de reconhecimento facial ou o cadastro inicial em boa parte desses aplicativos), os benefícios mais que compensam os custos, e a prova disto é que, voluntariamente, a maior parte das pessoas prefere um governo digital (e, eu aposto, o número de pessoas que não querem mais abrir mão dele, aumenta a cada dia).
A automação, a inteligência artificial e as plataformas são um símbolo do século 21. Um símbolo de que a destruição criativa é, de fato, um bom conceito para se explicar a dinâmica da mudança tecnológica na sociedade. Nem governos escapam a ela, como aprenderam os reguladores quando do advento de plataformas como a Uber ou a 99. As últimas inovações forçaram os reguladores para fora de sua área de conforto e, a cada dia que passa, ganha mais popularidade o conceito de sandboxes regulatórios, ferramenta que, se não perfeita (nenhuma o é, claro), auxilia bastante na construção de regulações mais eficazes e amigáveis à inovação.
Vez por outra falo aqui da hesitocracia, ou seja, da dificuldade do setor público em atuar de forma ágil, em prol da manutenção da liberdade dos cidadãos, para que possam buscar sua própria felicidade. Afinal, não se defende, em uma democracia, a agilidade do setor público em censurar ou perseguir pessoas. É necessário um compromisso auto-sustentável dos governos com a liberdade individual, ainda mais em um cenário de digitalização crescente.
A história nos ensina que, a despeito do deslumbramento das pessoas com as últimas mudanças tecnológicas, estas - as mudanças - são uma constante. A transformação (ou, para usar um modismo, a ‘reinvenção’) das relações sociais, da regulação ou mesmo das formas de governança privada e pública é uma força irresistível. A digitalização dos serviços públicos, na minha opinião, é apenas um primeiro ato de uma ópera que transformará a própria concepção de governo. A experimentação de novas formas institucionais, antes uma utopia, é, a cada dia
que passa, uma realidade que se constrói. Mais do que nunca, é preciso que a liberdade seja o farol para estas transformações. Sem ela, o risco de um retrocesso democrático é elevado.