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O Nobel de Economia de 2025: o mistério do crescimento

Os economistas Philippe Aghion e Peter Howitt iniciaram suas pesquisas com uma pergunta fundamental: por que algumas sociedades prosperam e outras não?

Prêmio Nobel de Economia 2025 (Divulgação/Niklas Elmehed/Nobel Prize Outreach)

Prêmio Nobel de Economia 2025 (Divulgação/Niklas Elmehed/Nobel Prize Outreach)

Ronald Hillbrecht
Ronald Hillbrecht

Colunista - Instituto Millenium na Exame

Publicado em 7 de novembro de 2025 às 23h17.

Durante milênios, a vida das pessoas mudava pouco. Agricultores medievais viviam quase da mesma forma que seus predecessores. Uma ou outra inovação, ferramentas um pouco melhores, mas nada que mudasse o trabalho pesado no campo e a rotina das pessoas. 

Tudo mudou há cerca de duzentos anos, quando o progresso deixou de ser algo ocasional e passou a produzir inovações cumulativas, gerando prosperidade. Desde a Revolução Industrial, as inovações passaram a se multiplicar — e, mais importante, a se aperfeiçoar umas às outras. É esse ciclo de retroalimentação que explica por que hoje vivemos mais, com mais conforto, conhecimento e oportunidades.

Desvendar esse mistério — o que faz o crescimento econômico se tornar sustentado — foi o que uniu os vencedores do Prêmio Nobel de Economia de 2025: o historiador econômico Joel Mokyr e os economistas Philippe Aghion e Peter Howitt. Suas pesquisas começaram com uma pergunta fundamental: por que algumas sociedades prosperam e enriquecem e outras não? 

Joel Mokyr dedicou sua carreira a entender por que a Europa começou a prosperar e outras sociedades até mais avançadas, como a China, não conseguiram o mesmo feito. Mokyr encontrou a resposta na cultura: o crescimento depende de uma sociedade aberta a novas ideias, disposta a desafiar autoridades e aceitar a mudança.

Para ele, o grande salto da humanidade veio quando dois tipos de conhecimento se combinaram. De um lado, o saber prático — como fundir bronze, fabricar vidro ou construir uma ponte. De outro, o saber científico — as leis e princípios que explicam por que essas coisas funcionam. Quando os artesãos e os cientistas passaram a interagir, surgiu um novo tipo de saber: o “conhecimento útil”, que se renova a cada descoberta. Vemos hoje em dia este feliz casamento na forma de livros-texto: o saber científico é disseminado e usado em aplicações práticas, permitindo amplo acesso à população de uma maneira que um saber reforça o outro. A ciência descobriu a presença de micro-organismos e princípios óticos que possibilitaram a engenharia de construção de lentes e microscópios. Lentes e microscópios mais poderosos permitiram mais descobertas e avanços científicos.  

A partir deste momento, a história nunca mais foi a mesma. A máquina a vapor, a eletricidade, o motor a combustão, a internet e a inteligência artificial são frutos dessa aliança entre teoria e prática — um casamento que mantém o motor do crescimento funcionando há dois séculos.

Enquanto Mokyr revelou as raízes históricas do progresso, Philippe Aghion e Peter Howitt mostraram como ele se renova no presente.

Em 1992, Aghion e Howitt criaram um modelo matemático que descreve o ciclo de destruição criadora, conceito emprestado de Joseph Schumpeter, o influente economista austríaco da primeira metade do século passado, que via o capitalismo como uma máquina de constante transformação.

No processo de destruição criadora, empresas inovam, criam novos produtos e processos de produção e assim tornam obsoletas as firmas incumbentes que não inovam o suficiente. Isto pode parecer injusto e brutal, mas é assim que uma sociedade cria riqueza e prospera: antigas estruturas desaparecem e dão lugar às novas. Para Aghion e Howitt, o crescimento nasce desse equilíbrio dinâmico entre a criação e a destruição, entre o impulso para inovar e a necessidade de adaptar-se às perdas que toda inovação traz. Com a destruição criadora, firmas menos eficientes e inovadoras quebram, dando lugar a outras mais dinâmicas. Empregos menos produtivos são destruídos e substituídos por outros de maior valor. 

O desafio das políticas públicas, dizem eles, é garantir que o dinamismo da destruição criadora continue em ação, protegendo as pessoas que perdem seus empregos, mas não necessariamente os empregos pouco produtivos; incentivando a pesquisa e o empreendedorismo, mas sem permitir que grandes empresas dominem o mercado e bloqueiem os próximos inovadores.

O problema é que por meio da política pode-se bloquear a destruição criadora. Grandes empresas, com grande poder de mercado, pouco inovadoras e com acesso ao mundo político por meio de lobby e contribuições de campanha, podem comprar proteção contra inovadores e novos participantes de mercado. Na analogia da pizza econômica, quem tem uma fatia grande de uma pizza pequena pode, se tiver poder político suficiente, vetar o crescimento da pizza se acreditar que sua fatia será reduzida. Neste caso, a falta de dinamismo e de crescimento sustentado anda de mãos dadas com má distribuição de renda e pobreza.

Governos ruins têm várias formas de obstruir a destruição criadora, além de vender proteção a firmas grandes e pouco eficientes, mantendo-as como firmas zumbis que acabam por consumir recursos que seriam melhor utilizados por firmas mais eficientes. Um mau ambiente de negócios, com excesso de regulação de mercados ou leis esdrúxulas, dificulta a entrada de novas firmas no mercado, dando sobrevida às firmas zumbis incumbentes. Bancos estatais que usam critérios políticos para concessão de crédito alimentam as firmas zumbis, e um sistema educacional de baixa qualidade não forma pessoas com os atributos necessários à inovação, que são as capacidades de pensar e se expressar logicamente, além de resolver problemas usando o “conhecimento útil”.  

O Nobel em economia deste ano nos ensina uma lição importante. A história mostra que o crescimento sustentado não é natural nem garantido. Ele depende de instituições abertas, de liberdade científica, de mercados competitivos e de tolerância ao novo.

Se deixarmos que o medo, os monopólios ou o controle político sufoquem a inovação, o motor da prosperidade pode parar e voltaremos à velha normalidade da estagnação.

Ao mesmo tempo, inovação traz novos problemas e dilemas: desigualdade, mudanças climáticas, riscos éticos com a biotecnologia e a inteligência artificial. Entretanto, Mokyr, Aghion e Howitt acreditam que a própria ciência pode corrigir seus excessos — mas isso exige políticas inteligentes e sociedades que valorizem a liberdade de pensar.

O Nobel de 2025 é uma ode à força das ideias e à pujança de uma sociedade que permite que elas floresçam. Mais crescimento sustentado, baseado em inovações e destruição criadora, é a melhor solução para nossos males atuais. Entretanto, este crescimento só pode existir onde há curiosidade, liberdade e coragem para mudar.

No final das contas, o caminho da prosperidade não é sobre o capital acumulado de uma sociedade – afinal, no passado o Egito construiu suas pirâmides, mas elas não produziram crescimento sustentado; no Brasil de hoje temos máquinas, infraestrutura, um sistema financeiro e escolas públicas, mas não conseguimos prosperar com inclusão social. O que aprendemos com o Nobel deste ano é que o crescimento econômico sustentado depende de pessoas com ideias novas, os empreendedores e os inovadores, e das instituições políticas e econômicas das sociedades que têm sabedoria suficiente para deixá-las transformar o mu