O esperto da vez
Mais instrutivo do que aprender economia em livros-texto e gráficos em que as empresas são representadas por letras do alfabeto é ver as coisas acontecendo diretamente, e comparar os resultados com crenças arraigadas ou defesas de intervenções, que acabam provocando resultados opostos aos planejados. Por exemplo: se os empresários se reúnem e conspiram para aumentar orquestradamente seus preços ao reduzir a oferta, criando um cartel, o consumidor é prejudicado e […] Leia mais
Da Redação
Publicado em 9 de abril de 2009 às 15h49.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às 13h47.
Mais instrutivo do que aprender economia em livros-texto e gráficos em que as empresas são representadas por letras do alfabeto é ver as coisas acontecendo diretamente, e comparar os resultados com crenças arraigadas ou defesas de intervenções, que acabam provocando resultados opostos aos planejados. Por exemplo: se os empresários se reúnem e conspiram para aumentar orquestradamente seus preços ao reduzir a oferta, criando um cartel, o consumidor é prejudicado e os empresários sempre ganham. Sempre só se o governo deixar, já que um conluio de empresas só se sustenta com alguma intervenção governamental. Não acredita? Vamos ver o que está acontecendo com um dos cartéis mais fortes do mundo, a famosa Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP).
Os países exportadores de petróleo da OPEP (ou, mais propriamente, dependentes da exportação de petróleo) enfrentam o dilema básico de um cartel: o estímulo a não respeitar a regra do próprio grupo. Individualmente, há um enorme incentivo a se tomar o chamado efeito carona. Todos se beneficiariam de uma redução da oferta, com o objetivo de forçar um preço maior, mas se beneficia ainda mais aquele que continuasse produzindo a mesma quantidade enquanto os demais parceiros diminuem a produção. Resumindo, o resto faz um esforço e o esperto aproveita.
E quem está sendo o esperto da vez? Hugo Chávez, presidente da República bolivariana da Venezuela e sua PDVSA. E as provas do “crime”? O Departamento de Energia dos Estados Unidos, maior destino das exportações da Venezuela, reportou aumento médio de 144 mil barris por dia de petróleo venezuelano para a terra do Tio Sam em janeiro deste ano – quando o país havia se comprometido em reduzir a oferta aos Estados Unidos em 166 mil barris por dia.
Há outra forma de burlar a OPEP, com repercussões de maior prazo. Como a cota de venda é determinada pelas reservas de cada nação, existe um incentivo em superestimar as reservas, de forma a ter maior margem de manobra quando há necessidade de aumentar as vendas. A outra fraqueza do grupo está no seu próprio sucesso. Se a OPEP consegue manter o preço do seu produto elevado por muito tempo, incentiva todos os consumidores a buscar alternativas – como biocombustíveis, células de hidrogênio e energia eólica. E essas alternativas comprometem a longo prazo a sustentabilidade comercial de vender petróleo.
Vários fatores fizeram diminuir a importância da OPEP. A necessidade de petróleo para produzir riqueza hoje é bem menor do que nos anos 70, em boa parte graças à eficiência energética. As alternativas ao petróleo foram mais estudadas e muitas são viáveis economicamente, especialmente com um petróleo acima de US$ 100. Mesmo assim, a OPEP era retratada como uma das forças mais atuantes da valorização recorde no preço do petróleo, alcançada até julho do ano passado, quando chegou a bater US$ 147. A despeito das diferenças específicas dessa commodity, não existe OPEP para soja, cobre ou minério de ferro e esses produtos também estavam com preços elevados durante o recente boom econômico mundial.
Nem o cartel teve essa força toda para puxar os preços do petróleo para cima nem para evitar que eles caíssem muito. E a Venezuela, um dos porta-vozes mais influentes do grupo, está aí desmascarada. E, junto com ela, a fraqueza inerente a um cartel.
Aliás, é muito interessante acompanhar os acontecimentos econômicos da Venezuela – desde que seja como observador. Quase tudo o que os manuais de economia dizem que dá errado está sendo aplicado por lá. E, surpresa! Realmente estão dando errado. Nos produtos tabelados (como arroz ou papel higiênico), há amplo desabastecimento. Na imposição de dois valores para o câmbio, o oficial (artificialmente valorizado) e o paralelo, criou-se um mercado negro e retirou o incentivo a exportação. Com a estatização de amplos setores da economia (e ainda mais sem a devida compensação), o investimento direto externo foge e a produtividade cai.
Essas consequências não geram um conhecimento novo, já que o resultado é igualzinho ao previsto, mas novos exemplos práticos, recheados de inúmeros dramas individuais. Por isso é interessante olhar como observador, mas terrível quando nos colocamos na pele de uma cidadão comum, tendo que, por exemplo, visitar vários supermercados em busca de papel higiênico, ou no desemprego por causa do ambiente econômico que não favorece a atividade empresarial. Obviamente, cada medida dessa tem a sua justificativa pomposa. O tabelamento de preço é para garantir que os bens básicos sejam de igual acesso a todos os cidadãos, independentemente da renda. A nacionalização é para substituir empresários gananciosos ou sabotadores por uma produção alinhada aos interesses nacionais (o que quer que isso signifique). O erro de sempre desses discursos, de quem os acredita, é não levar em conta a lição econômica deixada por Henry Hazlitt, felizmente disponível para download gratuito agora no OrdemLivre.org: “A arte da economia está em considerar não só os efeitos imediatos de qualquer ato ou política, mas, também, os mais remotos; está em descobrir as conseqüências dessa política não somente para um único grupo, mas para todos eles.”
Por Renato Lima*, no portal do Ordem Livre.
Renato Lima é jornalista e apresentador do “Café Colombo – o seu programa de livros e idéias”, da Universitária FM, Recife (www.cafecolombo.com.br).
Mais instrutivo do que aprender economia em livros-texto e gráficos em que as empresas são representadas por letras do alfabeto é ver as coisas acontecendo diretamente, e comparar os resultados com crenças arraigadas ou defesas de intervenções, que acabam provocando resultados opostos aos planejados. Por exemplo: se os empresários se reúnem e conspiram para aumentar orquestradamente seus preços ao reduzir a oferta, criando um cartel, o consumidor é prejudicado e os empresários sempre ganham. Sempre só se o governo deixar, já que um conluio de empresas só se sustenta com alguma intervenção governamental. Não acredita? Vamos ver o que está acontecendo com um dos cartéis mais fortes do mundo, a famosa Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP).
Os países exportadores de petróleo da OPEP (ou, mais propriamente, dependentes da exportação de petróleo) enfrentam o dilema básico de um cartel: o estímulo a não respeitar a regra do próprio grupo. Individualmente, há um enorme incentivo a se tomar o chamado efeito carona. Todos se beneficiariam de uma redução da oferta, com o objetivo de forçar um preço maior, mas se beneficia ainda mais aquele que continuasse produzindo a mesma quantidade enquanto os demais parceiros diminuem a produção. Resumindo, o resto faz um esforço e o esperto aproveita.
E quem está sendo o esperto da vez? Hugo Chávez, presidente da República bolivariana da Venezuela e sua PDVSA. E as provas do “crime”? O Departamento de Energia dos Estados Unidos, maior destino das exportações da Venezuela, reportou aumento médio de 144 mil barris por dia de petróleo venezuelano para a terra do Tio Sam em janeiro deste ano – quando o país havia se comprometido em reduzir a oferta aos Estados Unidos em 166 mil barris por dia.
Há outra forma de burlar a OPEP, com repercussões de maior prazo. Como a cota de venda é determinada pelas reservas de cada nação, existe um incentivo em superestimar as reservas, de forma a ter maior margem de manobra quando há necessidade de aumentar as vendas. A outra fraqueza do grupo está no seu próprio sucesso. Se a OPEP consegue manter o preço do seu produto elevado por muito tempo, incentiva todos os consumidores a buscar alternativas – como biocombustíveis, células de hidrogênio e energia eólica. E essas alternativas comprometem a longo prazo a sustentabilidade comercial de vender petróleo.
Vários fatores fizeram diminuir a importância da OPEP. A necessidade de petróleo para produzir riqueza hoje é bem menor do que nos anos 70, em boa parte graças à eficiência energética. As alternativas ao petróleo foram mais estudadas e muitas são viáveis economicamente, especialmente com um petróleo acima de US$ 100. Mesmo assim, a OPEP era retratada como uma das forças mais atuantes da valorização recorde no preço do petróleo, alcançada até julho do ano passado, quando chegou a bater US$ 147. A despeito das diferenças específicas dessa commodity, não existe OPEP para soja, cobre ou minério de ferro e esses produtos também estavam com preços elevados durante o recente boom econômico mundial.
Nem o cartel teve essa força toda para puxar os preços do petróleo para cima nem para evitar que eles caíssem muito. E a Venezuela, um dos porta-vozes mais influentes do grupo, está aí desmascarada. E, junto com ela, a fraqueza inerente a um cartel.
Aliás, é muito interessante acompanhar os acontecimentos econômicos da Venezuela – desde que seja como observador. Quase tudo o que os manuais de economia dizem que dá errado está sendo aplicado por lá. E, surpresa! Realmente estão dando errado. Nos produtos tabelados (como arroz ou papel higiênico), há amplo desabastecimento. Na imposição de dois valores para o câmbio, o oficial (artificialmente valorizado) e o paralelo, criou-se um mercado negro e retirou o incentivo a exportação. Com a estatização de amplos setores da economia (e ainda mais sem a devida compensação), o investimento direto externo foge e a produtividade cai.
Essas consequências não geram um conhecimento novo, já que o resultado é igualzinho ao previsto, mas novos exemplos práticos, recheados de inúmeros dramas individuais. Por isso é interessante olhar como observador, mas terrível quando nos colocamos na pele de uma cidadão comum, tendo que, por exemplo, visitar vários supermercados em busca de papel higiênico, ou no desemprego por causa do ambiente econômico que não favorece a atividade empresarial. Obviamente, cada medida dessa tem a sua justificativa pomposa. O tabelamento de preço é para garantir que os bens básicos sejam de igual acesso a todos os cidadãos, independentemente da renda. A nacionalização é para substituir empresários gananciosos ou sabotadores por uma produção alinhada aos interesses nacionais (o que quer que isso signifique). O erro de sempre desses discursos, de quem os acredita, é não levar em conta a lição econômica deixada por Henry Hazlitt, felizmente disponível para download gratuito agora no OrdemLivre.org: “A arte da economia está em considerar não só os efeitos imediatos de qualquer ato ou política, mas, também, os mais remotos; está em descobrir as conseqüências dessa política não somente para um único grupo, mas para todos eles.”
Por Renato Lima*, no portal do Ordem Livre.
Renato Lima é jornalista e apresentador do “Café Colombo – o seu programa de livros e idéias”, da Universitária FM, Recife (www.cafecolombo.com.br).