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"Não é realista esperar que o governo corte gastos em ano eleitoral", diz economista

O Instituto Millenium entrevistou Paulo Vieira da Cunha, destaque na 7ª edição da Conferência Anual da Brazilian Legal Society, em Nova Iorque 

"Não é realista esperar que o governo tome essas medidas", afirma economista, sobre ajustes fiscais em ano eleitoral (Brazilian-American Chamber of Commerce/Divulgação)
Instituto Millenium

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Publicado em 16 de abril de 2024 às 13h23.

Última atualização em 17 de abril de 2024 às 10h49.

Diretor da Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos e ex-diretor do COPOM, Paulo Vieira da Cunha foi destaque na 7ª edição da Conferência Anual da Brazilian Legal Society, da New York University School of Law , realizada em 11 de abril. O evento, um dos mais relevantes para profissionais do Direito e empresários com interesses no Brasil, concentrou-se este ano em desafios e oportunidades no cenário econômico e jurídico brasileiro. A conferência abordou uma série de temas que refletem sobre o ambiente regulatório e as perspectivas de desenvolvimento econômico do país.Vieira da Cunha é sócio na Verbank Consulting e obteve seu doutorado pela Universidade da Califórnia, em Berkeley.

Em sua participação como keynote speaker, ele discutiu a evolução do padrão de desenvolvimento brasileiro dentro do contexto macroeconômico atual. A entrevista concedida ao Instituto Millenium revela suas avaliações sobre as recentes reformas implementadas no Brasil e suas implicações para a produtividade e crescimento econômico. Além disso, ele fala sobre a necessidade de ajustes fiscais e a capacidade de implementação de reformas em um ano eleitoral, oferecendo uma análise ponderada sobre a conjuntura econômica nacional e as medidas necessárias para seu avanço.

Instituto Millenium: Recentemente, diferentes setores do governo começaram a admitir que aumentar a arrecadação pode não ser o suficiente para atingir o objetivo de déficit zero, levantando a possibilidade de revisar as metas fiscais. Em sua avaliação, é realista esperar que o governo tome medidas efetivas para reduzir gastos, especialmente em um ano eleitoral? Há espaço político e vontade dentro do governo e do Congresso para avançar com essa agenda?

Paulo Vieira da Cunha: Não, não é realista esperar que o governo tome essas medidas. Além disso, no relacionamento com o Congresso, muito por pressão do próprio Congresso, o aumento do gasto é a nova moeda de troca. Reconhece-se por ambas as partes que os mecanismos do orçamento estão cada vez mais disfuncionais. Por exemplo, há possibilidades para a Reforma Administrativa. Entretanto, de forma realista, nada vai acontecer este ano.

IM: Ao longo dos últimos anos, foram implementadas no Brasil reformas significativas nas áreas tributária, previdenciária e trabalhista. Quais impactos você observa dessas mudanças na produtividade nacional até o momento? Além disso, que outras reformas você julga serem críticas para ampliar a capacidade de crescimento econômico do país?

PVC: Na margem, já é possível observar o impacto dessas reformas no pequeno aumento da produtividade observado nos últimos trimestres. Ao contrário do que ocorreu em 2017, quando houve um surto de produtividade episódico, desta vez, é possível que o impacto seja mais duradouro. Conforme apontado por Fernando Veloso, do FGV-Observatório da Produtividade Regis Bonelli, “existe uma diferença importante no funcionamento do mercado de trabalho que pode representar uma mudança positiva mais duradoura para a produtividade. ... Também é possível que outras reformas implementadas nos últimos anos, como as do mercado de crédito, tenham contribuído para a expansão de empresas formais (com CNPJ), que por sua vez tendem a contratar trabalhadores formais (com carteira de trabalho). Na medida em que empresas formais são muito mais produtivas que as informais, isso pode ter contribuído para o aumento da produtividade.” Entretanto, a reforma mais importante que ainda precisa ser realizada, após a implementação integral do Imposto sobre Valor Agregado, é a abertura gradual da economia. Somente assim o país poderá trilhar um caminho de maior produtividade, inovação e crescimento, com maior competitividade, eficiência e equidade.

IM: Nos últimos tempos, o Banco Central, do qual você fez parte, desempenhou um papel crucial no impulso a iniciativas chave para modernizar o setor financeiro do país, incluindo fomentar a competição com a chegada dos bancos digitais e a criação do PIX. A que fatores você atribui o sucesso na construção de uma instituição tão sólida e profissional? Como essa eficácia pode ser reproduzida em outras entidades da administração pública federal?

PVC: O sucesso do Banco Central se deve fundamentalmente a dois fatores: a qualidade extraordinária e a dedicação do quadro de profissionais. Além disso, tivemos a sorte de contar com uma sucessão de admiráveis Presidentes ao longo das décadas, começando pelo Armínio Fraga, que foi exemplar. Esses líderes souberam conduzir a instituição de forma modelar. Primeiramente, solidificaram o arcabouço da política monetária e do sistema de pagamentos. Mais recentemente, introduziram inovações no sistema financeiro, tornando-o mais democrático e, esperamos, muito mais eficiente e competitivo.

IM: Diante da necessidade do governo em buscar equilíbrio fiscal, principalmente via aumento de receitas, como você avalia o risco de utilização da regulamentação da reforma tributária (que deveria ser fiscalmente neutra) como um meio para aumentar a arrecadação? Quais seriam as implicações a médio prazo para a política fiscal do governo?

PVC: A Reforma Tributária é o eixo central para a redução do “Custo Brasil”. Em conjunto com o progresso na infraestrutura, ela deve possibilitar a abertura da economia, um instrumento essencial para impulsionar o crescimento com significativo aumento da produtividade. Nesse contexto, a reforma deve ser neutra. Já temos uma carga tributária excessiva, portanto, o equilíbrio fiscal deve ser alcançado por meio do aumento da eficiência nos gastos públicos, com o de-engessamento e remanejamento dos orçamentos nos três níveis de governo, como vem sendo proposto pelo Ministérios do Planejamento e da Gestão, além da Reforma Administrativa.

IM: A criação da Instituição Fiscal Independente pelo Senado brasileiro tem sido uma fonte valiosa de dados e análises, enriquecendo o debate sobre a gestão fiscal no país. Como você avalia o desempenho da IFI até agora? Que medidas poderiam ser adotadas para potencializar ainda mais sua contribuição ao diálogo econômico nacional?

PVC: A IFI tem desempenhado um papel crucial na melhoria da qualidade dos debates sobre as contas públicas. Sua atuação consistente em estabelecer uma base factual e quantitativa para os debates políticos contribui significativamente para aprimorar as políticas orçamentárias. Hoje, a IFI é uma instituição fundamental no processo de preparação e condução do orçamento, sendo amplamente reconhecida e respeitada como uma fonte de conhecimento. Apesar de já ter boa penetração na imprensa especializada, acredito que o trabalho da IFI deveria ser divulgado de maneira mais ampla. Além disso, seria positivo se a instituição pudesse produzir estudos analíticos com maior frequência, abordando temas específicos do Orçamento, como a incidência de certos tributos, por exemplo.

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Diretor da Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos e ex-diretor do COPOM, Paulo Vieira da Cunha foi destaque na 7ª edição da Conferência Anual da Brazilian Legal Society, da New York University School of Law , realizada em 11 de abril. O evento, um dos mais relevantes para profissionais do Direito e empresários com interesses no Brasil, concentrou-se este ano em desafios e oportunidades no cenário econômico e jurídico brasileiro. A conferência abordou uma série de temas que refletem sobre o ambiente regulatório e as perspectivas de desenvolvimento econômico do país.Vieira da Cunha é sócio na Verbank Consulting e obteve seu doutorado pela Universidade da Califórnia, em Berkeley.

Em sua participação como keynote speaker, ele discutiu a evolução do padrão de desenvolvimento brasileiro dentro do contexto macroeconômico atual. A entrevista concedida ao Instituto Millenium revela suas avaliações sobre as recentes reformas implementadas no Brasil e suas implicações para a produtividade e crescimento econômico. Além disso, ele fala sobre a necessidade de ajustes fiscais e a capacidade de implementação de reformas em um ano eleitoral, oferecendo uma análise ponderada sobre a conjuntura econômica nacional e as medidas necessárias para seu avanço.

Instituto Millenium: Recentemente, diferentes setores do governo começaram a admitir que aumentar a arrecadação pode não ser o suficiente para atingir o objetivo de déficit zero, levantando a possibilidade de revisar as metas fiscais. Em sua avaliação, é realista esperar que o governo tome medidas efetivas para reduzir gastos, especialmente em um ano eleitoral? Há espaço político e vontade dentro do governo e do Congresso para avançar com essa agenda?

Paulo Vieira da Cunha: Não, não é realista esperar que o governo tome essas medidas. Além disso, no relacionamento com o Congresso, muito por pressão do próprio Congresso, o aumento do gasto é a nova moeda de troca. Reconhece-se por ambas as partes que os mecanismos do orçamento estão cada vez mais disfuncionais. Por exemplo, há possibilidades para a Reforma Administrativa. Entretanto, de forma realista, nada vai acontecer este ano.

IM: Ao longo dos últimos anos, foram implementadas no Brasil reformas significativas nas áreas tributária, previdenciária e trabalhista. Quais impactos você observa dessas mudanças na produtividade nacional até o momento? Além disso, que outras reformas você julga serem críticas para ampliar a capacidade de crescimento econômico do país?

PVC: Na margem, já é possível observar o impacto dessas reformas no pequeno aumento da produtividade observado nos últimos trimestres. Ao contrário do que ocorreu em 2017, quando houve um surto de produtividade episódico, desta vez, é possível que o impacto seja mais duradouro. Conforme apontado por Fernando Veloso, do FGV-Observatório da Produtividade Regis Bonelli, “existe uma diferença importante no funcionamento do mercado de trabalho que pode representar uma mudança positiva mais duradoura para a produtividade. ... Também é possível que outras reformas implementadas nos últimos anos, como as do mercado de crédito, tenham contribuído para a expansão de empresas formais (com CNPJ), que por sua vez tendem a contratar trabalhadores formais (com carteira de trabalho). Na medida em que empresas formais são muito mais produtivas que as informais, isso pode ter contribuído para o aumento da produtividade.” Entretanto, a reforma mais importante que ainda precisa ser realizada, após a implementação integral do Imposto sobre Valor Agregado, é a abertura gradual da economia. Somente assim o país poderá trilhar um caminho de maior produtividade, inovação e crescimento, com maior competitividade, eficiência e equidade.

IM: Nos últimos tempos, o Banco Central, do qual você fez parte, desempenhou um papel crucial no impulso a iniciativas chave para modernizar o setor financeiro do país, incluindo fomentar a competição com a chegada dos bancos digitais e a criação do PIX. A que fatores você atribui o sucesso na construção de uma instituição tão sólida e profissional? Como essa eficácia pode ser reproduzida em outras entidades da administração pública federal?

PVC: O sucesso do Banco Central se deve fundamentalmente a dois fatores: a qualidade extraordinária e a dedicação do quadro de profissionais. Além disso, tivemos a sorte de contar com uma sucessão de admiráveis Presidentes ao longo das décadas, começando pelo Armínio Fraga, que foi exemplar. Esses líderes souberam conduzir a instituição de forma modelar. Primeiramente, solidificaram o arcabouço da política monetária e do sistema de pagamentos. Mais recentemente, introduziram inovações no sistema financeiro, tornando-o mais democrático e, esperamos, muito mais eficiente e competitivo.

IM: Diante da necessidade do governo em buscar equilíbrio fiscal, principalmente via aumento de receitas, como você avalia o risco de utilização da regulamentação da reforma tributária (que deveria ser fiscalmente neutra) como um meio para aumentar a arrecadação? Quais seriam as implicações a médio prazo para a política fiscal do governo?

PVC: A Reforma Tributária é o eixo central para a redução do “Custo Brasil”. Em conjunto com o progresso na infraestrutura, ela deve possibilitar a abertura da economia, um instrumento essencial para impulsionar o crescimento com significativo aumento da produtividade. Nesse contexto, a reforma deve ser neutra. Já temos uma carga tributária excessiva, portanto, o equilíbrio fiscal deve ser alcançado por meio do aumento da eficiência nos gastos públicos, com o de-engessamento e remanejamento dos orçamentos nos três níveis de governo, como vem sendo proposto pelo Ministérios do Planejamento e da Gestão, além da Reforma Administrativa.

IM: A criação da Instituição Fiscal Independente pelo Senado brasileiro tem sido uma fonte valiosa de dados e análises, enriquecendo o debate sobre a gestão fiscal no país. Como você avalia o desempenho da IFI até agora? Que medidas poderiam ser adotadas para potencializar ainda mais sua contribuição ao diálogo econômico nacional?

PVC: A IFI tem desempenhado um papel crucial na melhoria da qualidade dos debates sobre as contas públicas. Sua atuação consistente em estabelecer uma base factual e quantitativa para os debates políticos contribui significativamente para aprimorar as políticas orçamentárias. Hoje, a IFI é uma instituição fundamental no processo de preparação e condução do orçamento, sendo amplamente reconhecida e respeitada como uma fonte de conhecimento. Apesar de já ter boa penetração na imprensa especializada, acredito que o trabalho da IFI deveria ser divulgado de maneira mais ampla. Além disso, seria positivo se a instituição pudesse produzir estudos analíticos com maior frequência, abordando temas específicos do Orçamento, como a incidência de certos tributos, por exemplo.

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