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Mais foco, menos ansiedade climática

O atual impasse ambiental é um bom problema, pois deriva da grande elevação no padrão de vida nos últimos 200 anos

Calor; onda de calor; temperatura; clima; mudança climática (Fernando Frazão/Agência Brasil)

Calor; onda de calor; temperatura; clima; mudança climática (Fernando Frazão/Agência Brasil)

Instituto Millenium
Instituto Millenium

Instituto Millenium

Publicado em 17 de outubro de 2025 às 19h23.

Por Nilo Saccaro, pesquisador do IPEA e associado do IFL Brasília

 

“Quero que vocês entrem em pânico”, declarou a então adolescente Greta Thunberg no Fórum Econômico Mundial de Davos, em 2019. “Quero que sintam o medo que eu sinto todos os dias. E então, que ajam", prosseguiu a ativista ambiental sueca. Esse discurso ainda é amplamente celebrado. De lá para cá, ganharam destaque os termos “ansiedade climática” e “ecoansiedade”. Mas certamente esse não é o estado de espírito adequado para lidarmos com um desafio tão complexo.

O pânico é uma reação instintiva de luta, fuga ou paralisia. Quando persistente, evolui para ansiedade, prejudicando o foco e o discernimento. Uma forma de reduzir a ansiedade climática é perceber que o atual impasse ambiental é um bom problema, pois deriva da grande elevação no padrão de vida nos últimos 200 anos. Ao longo desse período, saímos de mais de 90% da população mundial em pobreza extrema para menos de 9% hoje.

Hans Rosling (outro sueco), em seu livro Factfulness, mostra como o mundo melhorou nas últimas décadas. Ele destaca dados como a redução da mortalidade infantil, o aumento da expectativa de vida e o maior acesso a alimentação, moradia, educação e saúde, especialmente para meninas. Por isso, a capa do livro traz a frase “Informações como uma forma de terapia”.

Ainda mais notável, porém, é que Rosling descobre, com questionários simples aplicados a cientistas, ativistas, empresários, burocratas, políticos, economistas e tomadores de decisão – de diversos países e organizações internacionais – que esses grupos, em geral, desconhecem os avanços. O autor esclarece que vieses cognitivos e narrativas pessimistas sobrepujam os dados. Ele não nega os problemas, mas enfatiza a necessidade de uma visão baseada em fatos para entender o mundo com clareza.

Um exemplo especialmente relevante é o número de mortes por desastres naturais. Hoje, é cerca de 25% do que era há cem anos, mesmo com 5 bilhões de pessoas a mais (em termos per capita, caiu para cerca de 6%). Isso se deve principalmente a melhorias infraestruturais, como concreto armado, climatização e transportes – três dos maiores responsáveis pela geração de gases de efeito estufa (GEE).

Desse ângulo, fica claro que o impacto ambiental tem sido reflexo do progresso social. Valeu a pena: ainda que cheguemos aos piores cenários previstos pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) no final deste século, o bem-estar global dificilmente seria menor que no século XX.

Por isso, propostas radicais de restrição, redistribuição ou equalização, baseadas em forte coerção, não fazem muito sentido. Primeiro, porque a história mostra que ideias parecidas geralmente resultam em desastres sociais e ambientais. Mas também porque eliminar o passivo ambiental exigiria equalizar a pegada ecológica per capita — e o padrão de vida associado — ao nível atual de países como Sudão ou Mianmar. Por fim, a maioria dos governos tem acumulado dívidas públicas insustentáveis que ameaçam justamente os jovens e as gerações futuras – se falham em controlar o passivo que eles próprios emitem, é difícil crer que estariam aptos a gerenciar o passivo ambiental.

Isso não significa que temos que chegar aos piores cenários do IPCC. Podemos fazer mais com menos. Menos insumos, menos resíduos (inclusive GEE) – menos impacto. A agricultura brasileira, por exemplo, tem aumentado a produtividade por área e por tonelada de carbono emitida nos últimos 30 anos. As lâmpadas LED utilizam um décimo da eletricidade das lâmpadas incandescentes e duram 25 vezes mais. Andrew McAfee, em seu livro Mais com Menos, mostra que os EUA, desde 2000, reduziram o consumo de aço, cobre, madeira e papel. Como ele escreve, “desejamos mais refrigerante, não mais alumínio nas latas. Desejamos ouvir música, calcular e comunicar, mas não queremos um arsenal de dispositivos, basta um smartphone. Desejamos o transporte individual, mas não o carro. Desejamos mais comida, não mais terras cultivadas”.

Sim, ainda há muito a melhorar. Mas nossa capacidade de inovação tem superado os piores prognósticos desde Malthus. Ela foi a fonte da maioria dos avanços, se não todos. Tem sido mais seguro confiar na inovação do que na política.

A consciência ambiental é essencial para ambas. O ativismo tem seu papel. Mas é preciso mais foco nos fatos – completos. Pânico e ansiedade sempre serviram apenas à concentração do poder nas mãos de quem o ambiciona – o que historicamente leva mais à opressão do que a soluções. Por isso, adaptando o famoso bordão de um influencer de saúde mental brasileiro:

Mais foco, menos ansiedade – climática.