Lei de Abuso de Autoridade divide opiniões
Especialistas analisam medida que prevê punições para integrantes dos Três Poderes, incluindo prisão para investigadores e juízes
institutomillenium
Publicado em 16 de agosto de 2019 às 13h38.
Nesta semana, a Câmara Federal aprovou projeto de lei que tipifica e estabelece punições para os chamados “abusos de autoridade”. A proposta gerou polêmica, sendo vista por alguns segmentos da sociedade como uma tentativa de inibir o combate à corrupção no país. Em entrevista ao Instituto Millenium, o conselheiro do Imil, Sebastião Ventura, criticou a proposta: na opinião do advogado especializado em Direito do Estado, a lei foi aprovada a toque de caixa e tem uma série de pontos subjetivos, que geram insegurança jurídica. Ouça!
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“Toda medida que eleve a ética da responsabilidade pública, querendo de certa maneira impor maior cautela no exercício da função, nós devemos saudá-la. Porém, há formas e meios legítimos de se fazer esses avanços legislativos. Me parece que o projeto de lei aprovado peca tanto pela substância quanto pela forma”, destacou.
Na análise de Ventura, um projeto de tamanha importância e com vários reflexos não pode ser votado de forma simbólica, tirando a possibilidade de a sociedade saber como cada parlamentar votou; e nem em regime de urgência. “O Brasil vive uma forte campanha de combate à corrupção, e essa lei traz consequências sobre a atuação independente dos agentes públicos. O tema é delicado, o assunto é sensível, e uma questão como essa deve ser trabalhada em larga escala nas casas parlamentares. Aprovar em regime de urgência, com votação simbólica, não cheira bem”, criticou.
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O advogado ressaltou a importância de a sociedade estar atenta para a ação de um Congresso que possui problemas, com muitos parlamentares enfrentando denúncias de corrupção. “A sociedade brasileira deve estar atenta a toda manobra legislativa que venha subverter o espírito da lei e, sob a embalagem de dizer que está se punindo o abuso de poder, tiver a intenção real de blindar a classe política de atos investigatórios”, alertou.
Subjetividade gera insegurança jurídica
Além da aprovação sem um debate mais amplo, Sebastião Ventura considera que o projeto é “ilógico em suas funções”, com artigos subjetivos. Apesar de o texto citar que “a divergência na interpretação da lei não configurará, por si só, abuso de autoridade”, vários dispositivos exigem essa interpretação, de acordo com o advogado.
“Um caso concreto é o artigo 34: ‘deixar de corrigir de ofício ou mediante provocação, tendo competência para fazê-lo, erro relevante que saiba existir em processo ou procedimento’. O que é ‘erro relevante’? É um termo absolutamente aberto e subjetivo! O que é relevante para alguns pode ser irrelevante para outros. Sempre que a lei penal possuir termos abertos e subjetivos, ela estimula a insegurança jurídica, e não a objetividade necessária para o justo combate ao crime”, disse.
Os problemas com a formulação do texto levam a algo mais grave: o especialista em Direito de Estado pela UFGRS alerta que os vícios encontrados no projeto de lei aprovado pela Câmara podem atrapalhar o trabalho de investigação contra a corrupção. “Isso deixa o agente policial, o juiz, o promotor completamente à mercê das interpretações subjetivas, que podem atrapalhar suas atividades. Eu acredito que nós devemos regular o abuso de autoridade, uma vez que, na República, não há poder absoluto e a lei anterior era de 1965. No entanto, me parece que, da forma como está, o projeto não é bom e possibilita o mau uso, visando justamente punir ou amedrontar agentes públicos que apenas querem o bom cumprimento da lei”, analisou.
A nova lei
O projeto de lei sobre o abuso de autoridade já havia passado pelo Senado e agora, ao ser aprovado pela Câmara, depende da sanção ou veto do presidente Jair Bolsonaro. Entre as medidas aprovadas, está a punição para o juiz que decretar condução coercitiva sem prévia intimação de comparecimento ao investigado ou a testemunha – iniciativa avaliada como positiva por Ventura, que considera ter havido um excesso no instrumento nos últimos anos.
O projeto também prevê prisão para quem fotografar ou filmar um preso, investigado ou vítima sem consentimento, com a intenção de constranger a pessoa. Também é passível de punição a divulgação de gravação sem relação com as provas que se pretende produzir em investigação.
Contraponto: “não faz sentido proteger direitos violando-os”
O empresário e articulista Roberto Rachewsky, por outro lado, defende a lei. Ele sustenta que o combate à corrupção não pode se dar por ações que têm potencial de violar os direitos individuais dos cidadãos.
“Não faz sentido proteger direitos violando-os. Por isso, eu digo que sou a favor da lei que se dispõe a ser contra o abuso de autoridade – que começa não nas ações furtivas ou autoritárias do MP, Judiciário, Receita Federal ou Coaf, mas muito antes, quando o governo e o Legislativo decidem regular e tributar os cidadãos na sua necessária ação para criação, manutenção e consumo dos valores que escolhe para buscar sua felicidade e garantir sua existência”, acredita.
Nesta semana, a Câmara Federal aprovou projeto de lei que tipifica e estabelece punições para os chamados “abusos de autoridade”. A proposta gerou polêmica, sendo vista por alguns segmentos da sociedade como uma tentativa de inibir o combate à corrupção no país. Em entrevista ao Instituto Millenium, o conselheiro do Imil, Sebastião Ventura, criticou a proposta: na opinião do advogado especializado em Direito do Estado, a lei foi aprovada a toque de caixa e tem uma série de pontos subjetivos, que geram insegurança jurídica. Ouça!
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“Toda medida que eleve a ética da responsabilidade pública, querendo de certa maneira impor maior cautela no exercício da função, nós devemos saudá-la. Porém, há formas e meios legítimos de se fazer esses avanços legislativos. Me parece que o projeto de lei aprovado peca tanto pela substância quanto pela forma”, destacou.
Na análise de Ventura, um projeto de tamanha importância e com vários reflexos não pode ser votado de forma simbólica, tirando a possibilidade de a sociedade saber como cada parlamentar votou; e nem em regime de urgência. “O Brasil vive uma forte campanha de combate à corrupção, e essa lei traz consequências sobre a atuação independente dos agentes públicos. O tema é delicado, o assunto é sensível, e uma questão como essa deve ser trabalhada em larga escala nas casas parlamentares. Aprovar em regime de urgência, com votação simbólica, não cheira bem”, criticou.
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Mediados por Sebastião Ventura, Fábio Medina Osório e Antônio Augusto Mayer dos Santos debatem atuação do STF
O advogado ressaltou a importância de a sociedade estar atenta para a ação de um Congresso que possui problemas, com muitos parlamentares enfrentando denúncias de corrupção. “A sociedade brasileira deve estar atenta a toda manobra legislativa que venha subverter o espírito da lei e, sob a embalagem de dizer que está se punindo o abuso de poder, tiver a intenção real de blindar a classe política de atos investigatórios”, alertou.
Subjetividade gera insegurança jurídica
Além da aprovação sem um debate mais amplo, Sebastião Ventura considera que o projeto é “ilógico em suas funções”, com artigos subjetivos. Apesar de o texto citar que “a divergência na interpretação da lei não configurará, por si só, abuso de autoridade”, vários dispositivos exigem essa interpretação, de acordo com o advogado.
“Um caso concreto é o artigo 34: ‘deixar de corrigir de ofício ou mediante provocação, tendo competência para fazê-lo, erro relevante que saiba existir em processo ou procedimento’. O que é ‘erro relevante’? É um termo absolutamente aberto e subjetivo! O que é relevante para alguns pode ser irrelevante para outros. Sempre que a lei penal possuir termos abertos e subjetivos, ela estimula a insegurança jurídica, e não a objetividade necessária para o justo combate ao crime”, disse.
Os problemas com a formulação do texto levam a algo mais grave: o especialista em Direito de Estado pela UFGRS alerta que os vícios encontrados no projeto de lei aprovado pela Câmara podem atrapalhar o trabalho de investigação contra a corrupção. “Isso deixa o agente policial, o juiz, o promotor completamente à mercê das interpretações subjetivas, que podem atrapalhar suas atividades. Eu acredito que nós devemos regular o abuso de autoridade, uma vez que, na República, não há poder absoluto e a lei anterior era de 1965. No entanto, me parece que, da forma como está, o projeto não é bom e possibilita o mau uso, visando justamente punir ou amedrontar agentes públicos que apenas querem o bom cumprimento da lei”, analisou.
A nova lei
O projeto de lei sobre o abuso de autoridade já havia passado pelo Senado e agora, ao ser aprovado pela Câmara, depende da sanção ou veto do presidente Jair Bolsonaro. Entre as medidas aprovadas, está a punição para o juiz que decretar condução coercitiva sem prévia intimação de comparecimento ao investigado ou a testemunha – iniciativa avaliada como positiva por Ventura, que considera ter havido um excesso no instrumento nos últimos anos.
O projeto também prevê prisão para quem fotografar ou filmar um preso, investigado ou vítima sem consentimento, com a intenção de constranger a pessoa. Também é passível de punição a divulgação de gravação sem relação com as provas que se pretende produzir em investigação.
Contraponto: “não faz sentido proteger direitos violando-os”
O empresário e articulista Roberto Rachewsky, por outro lado, defende a lei. Ele sustenta que o combate à corrupção não pode se dar por ações que têm potencial de violar os direitos individuais dos cidadãos.
“Não faz sentido proteger direitos violando-os. Por isso, eu digo que sou a favor da lei que se dispõe a ser contra o abuso de autoridade – que começa não nas ações furtivas ou autoritárias do MP, Judiciário, Receita Federal ou Coaf, mas muito antes, quando o governo e o Legislativo decidem regular e tributar os cidadãos na sua necessária ação para criação, manutenção e consumo dos valores que escolhe para buscar sua felicidade e garantir sua existência”, acredita.