Instituto Millenium
Publicado em 26 de novembro de 2025 às 21h14.
Por Letícia Porto Moreto
No Brasil de hoje, gasto público virou assunto de todo dia, e a sensação é de leilão aberto: alguém pergunta “será que dá pra gastar mais?”, e o governo responde “eu cubro, dá pra gastar ainda mais um pouco”. Se nem a própria União consegue segurar o ritmo das despesas, quem conseguirá?
Fechamos 2025 com a sanção da lei que permite que a meta fiscal mire o piso da faixa, ou seja, aceita um déficit de até R$ 30,9 bilhões. No papel, fica tudo dentro do “arcabouço”, a regra que substituiu o antigo teto de gastos e trabalha com uma banda ao redor do zero. Na prática, o recado é simples: o governo ganha tempo. Com o piso como referência, o bloqueio de verbas diminui, os ministérios respiram e a execução do orçamento anda. Funciona para o curto prazo? Funciona. Resolve o problema? Ainda não.
O debate esquenta quando o TCU propõe obrigá-lo a mirar o centro da meta, o que exigiria cortes maiores. Mas o governo opta por recurso jurídico, obtém decisão monocrática favorável e, agora, sanciona lei que reforça o critério mais flexível. Para quem observa de fora, fica uma mensagem dupla. De um lado, evita travar serviços públicos. De outro, passa a impressão de que zerar o déficit vira objetivo “aspiracional”, não compromisso firme, e o mercado tem pouca paciência com metas que parecem opcionais.
Direto ao ponto: “gastar mais” pode aliviar agora, mas a conta chega depois. Juros longos, prêmio de risco e câmbio reagem à confiança do mercado. Quando o piso da meta vira o novo normal, esses indicadores sinalizam que algo vai mal. Quando o governo demonstra disciplina, corta subsídios ineficientes, prioriza investimentos com alto retorno social e elimina o que não entrega, a situação melhora e o arcabouço passa a funcionar como estabilizador, não como convite ao déficit eterno. Também cabe separar mito de fato. Essa decisão presidencial apenas adia a retomada rumo a um possível superávit.
Por isso, é crucial respeitar os limites do arcabouço e manter compromisso de entregar o resultado dentro da faixa. Para que isso faça sentido, ele precisa enfrentar a parte dura
e impopular da política fiscal, dizer “não” quando necessário, reorganizar prioridades e sustentar decisões que não rendem foto bonita.
No fim, a pergunta inicial permanece, “se a União não pisa no freio, quem pisará?” O país precisa de instituições que funcionem, regras cumpridas e um Executivo disposto a escolher onde gastar melhor e onde deixar de gastar. A nova lei compra tempo, mas não compra confiança. Confiança se constrói na execução: fechar o ano dentro dos limites da meta, com receita de qualidade e gasto disciplinado. Qualquer coisa abaixo disso é só mais ruído de leilão.