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Eleições 2024: é preciso debater as relações público-privadas nas cidades

O fortalecimento da regulação no âmbito municipal é fundamental para garantir a qualidade dos serviços públicos oferecidos à população.

Metro Linha Laranja - Estação Sta Marina (Germano Lüders /Exame)
Fernando Pieroni

Especialista em parcerias público-privadas

Publicado em 10 de maio de 2024 às 12h28.

Última atualização em 10 de maio de 2024 às 12h48.

Com a proximidade das eleições municipais, como é de costume, o debate público se volta às questões cruciais que impactam o desenvolvimento e a qualidade de vida em nossas cidades. Mas alguns temas, por mais relevantes que sejam, muitas vezes acabam sem o devido destaque. Seja por abordarem aspectos apenas indiretamente relacionados à vida das pessoas ou porque produzem resultados no longo prazo, ao final, acabam obscurecidos pela necessidade de visibilidade e o imediatismo cada vez mais presentes nos pleitos eleitorais. A regulação das parcerias entre os setores público e privado no âmbito municipal é, sem dúvida alguma, um desses temas.

A ação conjunta de governos e empresas, via contratos públicos de longo prazo, para desenvolver iniciativas de interesse da sociedade, esteve historicamente relacionada a grandes projetos de infraestrutura, como rodovias e aeroportos. Entretanto, nos últimos anos têm ganhado espaço muito rapidamente na esfera das cidades, em setores que impactam diretamente o dia a dia das pessoas - mobilidade urbana, iluminação pública, terminais e mercados municipais e parques -, para mencionar alguns. Para que se tenha uma dimensão, os municípios já representam 68% dos projetos efetivados ou em estudo para a concessão de serviços públicos à iniciativa privada, sendo que as iniciativas municipais avançaram majoritariamente a partir de 2021, segundo dados da consultoria Radar PPP.

É nesse sentido que não se pode perder de vista o papel fundamental da regulação municipal para garantir o horizonte que esses contratos precisam para mobilizar investimentos que atravessam vários mandatos de prefeitos, ao longo de 20, 30 anos. Nessas condições, o estabelecimento de regras claras e estáveis, além de instituições capazes de garantir sua devida aplicação é indispensável.

Atualmente, existem agências reguladoras relativamente bem consolidadas na esfera federal e dos estados, com maior foco setorial, como energia elétrica, transporte e saneamento, e agências municipais em certas capitais, como Cuiabá, Salvador, Manaus e São Paulo. Há ainda exemplos pontuais em cidades menores e pioneiras, como Erechim (RS) ou Porto Ferreira (SP) ou envolvendo consórcios de cidades em torno de serviços que transbordam suas fronteiras, como os relacionados a bacias hidrográficas. Mas o fato é que em sua maioria, os projetos municipais não contam com estruturas regulatórias dedicadas, quer seja na administração direta ou indireta, o que faz com que sejam regulados muitas vezes por gestores públicos sem especialização ou por equipes com alta rotatividade, sujeitos a pressões dos governos aos quais reportam.

Condição que fere premissas básicas de boa governança e independência técnica da regulação, assim como a segurança jurídica necessária para garantir a qualidade da oferta de serviços públicos no longo prazo. Afinal, as agências ou equipes especializadas desempenham um papel crucial na fiscalização e na aplicação de penalidades em caso de descumprimento das obrigações contratuais pelas empresas concessionárias, assim como são obstáculos ao voluntarismo político de curto prazo. Essa atuação contribui para a eficiência e a transparência na prestação dos serviços, evitando abusos e assegurando o cumprimento dos direitos dos cidadãos.

É fato que a mera criação de agências reguladoras não é suficiente para garantir a eficácia e a legitimidade de sua atuação. Um ponto essencial é preservar ao máximo independência do processo regulatório em relação aos interesses políticos e econômicos, o que pressupõe autonomia financeira, técnica e decisória, bem como de mecanismos de controle e governança que assegurem sua imparcialidade e sua capacidade de operar em prol do interesse público. É necessário também promover a capacitação e a valorização dos profissionais que nelas atuam.

O problema é que esses pré-requisitos muitas vezes podem ser incompatíveis com a realidade de muitos municípios, que contam com um corpo pequeno de servidores, insuficiente para alcançar a escala mínima de técnicos com competências distintas e complementares para exercer essa função. Mas, como diz o ditado, às vezes o ótimo é inimigo do bom e não é porque não podem instituir agências próprias conforme os manuais que não haja espaço para aprimorar a regulação dos programas de parceria municipais, e garantir a participação da sociedade civil nos processos de formulação e fiscalização da regulação.

No Brasil, há exemplos de cooperações técnicas entre municípios e agências estaduais ou até mesmo entre os próprios municípios para o compartilhamento de conhecimento, assistência técnica e suporte na elaboração e implementação de políticas regulatórias locais. Agências reguladoras de outros níveis da federação podem, por exemplo, apoiar os municípios na fiscalização e monitoramento de serviços públicos, ajudá-los na elaboração de normas e diretrizes específicas para determinados setores ou serviços, ou mesmo atuar como mediadoras de conflitos entre as cidades e as empresas prestadoras de serviços públicos.

Em um ano de eleições, estamos no período em que os candidatos se debruçam sobre suas articulações políticas, prioridades e elaboração dos planos de governo que serão publicizados no início da campanha eleitoral oficial, no mês de agosto. Momento oportuno para que reflitam sobre a efetividade e sustentabilidade dos programas de parcerias com a iniciativa privada nas cidades e incorporem a regulação em suas diretrizes. Seja reavaliando a qualidade das agências, a viabilidade de sua criação, ou buscando o fortalecimento da governança e processos regulatórios onde não há essa viabilidade. Afinal, a regulação de qualidade é tão importante quanto projetos públicos bem desenhados para a ampliação e aprimoramento dos serviços prestados à população.

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Com a proximidade das eleições municipais, como é de costume, o debate público se volta às questões cruciais que impactam o desenvolvimento e a qualidade de vida em nossas cidades. Mas alguns temas, por mais relevantes que sejam, muitas vezes acabam sem o devido destaque. Seja por abordarem aspectos apenas indiretamente relacionados à vida das pessoas ou porque produzem resultados no longo prazo, ao final, acabam obscurecidos pela necessidade de visibilidade e o imediatismo cada vez mais presentes nos pleitos eleitorais. A regulação das parcerias entre os setores público e privado no âmbito municipal é, sem dúvida alguma, um desses temas.

A ação conjunta de governos e empresas, via contratos públicos de longo prazo, para desenvolver iniciativas de interesse da sociedade, esteve historicamente relacionada a grandes projetos de infraestrutura, como rodovias e aeroportos. Entretanto, nos últimos anos têm ganhado espaço muito rapidamente na esfera das cidades, em setores que impactam diretamente o dia a dia das pessoas - mobilidade urbana, iluminação pública, terminais e mercados municipais e parques -, para mencionar alguns. Para que se tenha uma dimensão, os municípios já representam 68% dos projetos efetivados ou em estudo para a concessão de serviços públicos à iniciativa privada, sendo que as iniciativas municipais avançaram majoritariamente a partir de 2021, segundo dados da consultoria Radar PPP.

É nesse sentido que não se pode perder de vista o papel fundamental da regulação municipal para garantir o horizonte que esses contratos precisam para mobilizar investimentos que atravessam vários mandatos de prefeitos, ao longo de 20, 30 anos. Nessas condições, o estabelecimento de regras claras e estáveis, além de instituições capazes de garantir sua devida aplicação é indispensável.

Atualmente, existem agências reguladoras relativamente bem consolidadas na esfera federal e dos estados, com maior foco setorial, como energia elétrica, transporte e saneamento, e agências municipais em certas capitais, como Cuiabá, Salvador, Manaus e São Paulo. Há ainda exemplos pontuais em cidades menores e pioneiras, como Erechim (RS) ou Porto Ferreira (SP) ou envolvendo consórcios de cidades em torno de serviços que transbordam suas fronteiras, como os relacionados a bacias hidrográficas. Mas o fato é que em sua maioria, os projetos municipais não contam com estruturas regulatórias dedicadas, quer seja na administração direta ou indireta, o que faz com que sejam regulados muitas vezes por gestores públicos sem especialização ou por equipes com alta rotatividade, sujeitos a pressões dos governos aos quais reportam.

Condição que fere premissas básicas de boa governança e independência técnica da regulação, assim como a segurança jurídica necessária para garantir a qualidade da oferta de serviços públicos no longo prazo. Afinal, as agências ou equipes especializadas desempenham um papel crucial na fiscalização e na aplicação de penalidades em caso de descumprimento das obrigações contratuais pelas empresas concessionárias, assim como são obstáculos ao voluntarismo político de curto prazo. Essa atuação contribui para a eficiência e a transparência na prestação dos serviços, evitando abusos e assegurando o cumprimento dos direitos dos cidadãos.

É fato que a mera criação de agências reguladoras não é suficiente para garantir a eficácia e a legitimidade de sua atuação. Um ponto essencial é preservar ao máximo independência do processo regulatório em relação aos interesses políticos e econômicos, o que pressupõe autonomia financeira, técnica e decisória, bem como de mecanismos de controle e governança que assegurem sua imparcialidade e sua capacidade de operar em prol do interesse público. É necessário também promover a capacitação e a valorização dos profissionais que nelas atuam.

O problema é que esses pré-requisitos muitas vezes podem ser incompatíveis com a realidade de muitos municípios, que contam com um corpo pequeno de servidores, insuficiente para alcançar a escala mínima de técnicos com competências distintas e complementares para exercer essa função. Mas, como diz o ditado, às vezes o ótimo é inimigo do bom e não é porque não podem instituir agências próprias conforme os manuais que não haja espaço para aprimorar a regulação dos programas de parceria municipais, e garantir a participação da sociedade civil nos processos de formulação e fiscalização da regulação.

No Brasil, há exemplos de cooperações técnicas entre municípios e agências estaduais ou até mesmo entre os próprios municípios para o compartilhamento de conhecimento, assistência técnica e suporte na elaboração e implementação de políticas regulatórias locais. Agências reguladoras de outros níveis da federação podem, por exemplo, apoiar os municípios na fiscalização e monitoramento de serviços públicos, ajudá-los na elaboração de normas e diretrizes específicas para determinados setores ou serviços, ou mesmo atuar como mediadoras de conflitos entre as cidades e as empresas prestadoras de serviços públicos.

Em um ano de eleições, estamos no período em que os candidatos se debruçam sobre suas articulações políticas, prioridades e elaboração dos planos de governo que serão publicizados no início da campanha eleitoral oficial, no mês de agosto. Momento oportuno para que reflitam sobre a efetividade e sustentabilidade dos programas de parcerias com a iniciativa privada nas cidades e incorporem a regulação em suas diretrizes. Seja reavaliando a qualidade das agências, a viabilidade de sua criação, ou buscando o fortalecimento da governança e processos regulatórios onde não há essa viabilidade. Afinal, a regulação de qualidade é tão importante quanto projetos públicos bem desenhados para a ampliação e aprimoramento dos serviços prestados à população.

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