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Educação: um problema sem causa

Como elites, que reconhecem que as crianças de seu país não aprendem, também não conseguem gerar soluções reais para esse problema

Empresários, sindicalistas, estudantes, acadêmicos: todos, sem exceção, mas com diferentes gradações, identificam algum problema nos serviços de Educação oferecidos por aqui (Freepik)
Empresários, sindicalistas, estudantes, acadêmicos: todos, sem exceção, mas com diferentes gradações, identificam algum problema nos serviços de Educação oferecidos por aqui (Freepik)

Entre julho e agosto 2024, o instituto AtlasIntel perguntou aos potenciais eleitores de Belém, Curitiba, Fortaleza, Manaus, Ponta Grossa e São Paulo quais os maiores problemas em suas cidades. Em todas essas, o tema Educação é pelo menos um dos cinco mais citados. E isso é apenas um recorte temporal atual.  

Se perguntarmos em grupos focais, buscando respostas mais qualitativas, a situação se repete. Empresários, sindicalistas, estudantes, acadêmicos: todos, sem exceção, mas com diferentes gradações, identificam algum problema nos serviços de Educação oferecidos por aqui. 

A percepção que os alunos brasileiros não aprendem é tão cristalina que, pelo menos ao longo dos últimos 30 anos, não faltaram iniciativas para tentar reverter essa triste realidade. 

O Instituto Ayrton Senna (IAS), uma das iniciativas mais incríveis para melhorar a Educação no Brasil, criada pela família de nosso saudoso tricampeão de Fórmula 1, trabalha há 30 anos para reverter a realidade da Educação no país. Outra organização, a Parceiros da Educação, com missão similar, tem raízes que remontam a 1991. Em 2006, surgiu a Todos pela Educação: uma ONG cujo objetivo é “mudar para valer a qualidade da Educação Básica no Brasil”. 

Na academia, também há iniciativas nessa linha. O Insper, em parceria com o próprio IAS, têm uma cátedra, cujo objetivo é desenvolver uma linha de pesquisa inteira para esse tema, desde 2015. Ricardo Paes de Barros, renomado economista brasileiro, foi o professor titular da cátedra. 

Em outra frente, encontramos também empresas privadas que transformaram em seu propósito e modelo de negócio melhorar os serviços educacionais no país, como a Alicerce e a Escola Vereda. 

O poder público também já criou suas iniciativas. Apenas no período da Nova República, é possível mapear pelo menos 28 diferentes políticas públicas que abrangeram desde a mudança na forma de compra de livros didáticos, até o financiamento direto a famílias para tentar garantir a maior permanência das crianças nas escolas.   

Contudo, ano após ano, os estudantes brasileiros continuam a desempenhar mal em provas comparativas a nível internacional. No último PISA, a reconhecida prova internacional da OCDE, o Brasil está 52º, 61º e 65º de 81 países, em Leitura em Língua Materna, Ciências e Matemática – respectivamente. 

Cabe, então, a pergunta: em um país onde seus (i) cidadãos e suas (ii) elites reconhecem que a Educação precisa melhorar, onde iniciativas para resolver a questão são criadas (a) privadamente, (b) filantropicamente, (c) academicamente e (d) governamentalmente, porque o problema persiste? 

Diz um sarcástico ditado que para todo problema complexo existe uma solução simples, fácil, rápida... E errada. Problemas complexos assim o são pois normalmente não estão conectados a uma relação de causa-e-efeito direta: mas, sim, a relações de causa-e-efeito indiretas. Em cenários assim muitas coisas que estão diretamente ligadas ao problema podem parecer a causa – mas, na verdade, são apenas uma coincidência, ou um efeito colateral do problema.  

Ao longo de todos os anos em que essa discussão é feita no Brasil, não faltaram “porquês” para explicar por que nossos alunos não aprendem, nossas escolas não ensinam e, mesmo assim, nada muda. Há, na verdade, muitas hipóteses repetidas exaustivamente para explicar esse problema. Muitas vezes, o debate sobre o tema se torna estéril – quando não, político. Sugestões de tratamento se misturam a conceitos que podem até ter sentido na Política – mas que em nada pertencem ao tema da Educação.  

Nesta série de artigos para o Instituto Millenium, desejo abordar cada uma das mais comuns razões por uma perspectiva honesta e técnica. Honesta significa apresentar uma dessas muitas hipóteses por uma perspectiva em que ela possa ser plausível – assim como uma perspectiva de porque ela não faz sentido. 

Não tenho o objetivo de construir “espantalhos” para serem “espancados” verbalmente. Também não entendo que é meu papel doutrinar, ou “ensinar” você, leitor, quais são as conclusões “corretas”, e quais são as “erradas”.  

Acredito que, se você chegou até este ponto do artigo, você não só é alguém interessado pelo tema, como eu (potencialmente, até preocupado com uma criança específica), mas alguém inteligente o suficiente para construir suas próprias conclusões a partir de um texto que aborde o problema de forma transparente. 

Meu interesse é demonstrar como já temos experimentos e informações suficientes para concluir que o problema parece estar em uma única e profunda causa: os serviços de educação providos aos alunos o são sob incentivos errados. E, como nos ensina a Economia, incentivos errados geram comportamentos disfuncionais.  

O primeiro passo para resolvermos um problema é reconhecê-lo, aceitá-lo e entendê-lo. Conto com a sua leitura para começarmos essa mudança.