Da “herança maldita” ao suposto privatismo de José Serra: nada como uma inverdade depois da outra
Adeptos do atual governo e do PT tem propagado (e parecem acreditar) que somente medidas diretas como o bolsa família ou o reajuste salarial acima da inflação têm importância no sentido de redistribuir renda e reduzir desigualdades. Vou deixar de lado a apropriação indébita praticada pelo governo Lula, que as assumiu como se fossem suas, quando na verdade se sabe que tais medidas tiveram início no governo Fernando Henrique. Para […] Leia mais
Publicado em 15 de outubro de 2010 às, 01h40.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 11h02.
Adeptos do atual governo e do PT tem propagado (e parecem acreditar) que somente medidas diretas como o bolsa família ou o reajuste salarial acima da inflação têm importância no sentido de redistribuir renda e reduzir desigualdades.
Vou deixar de lado a apropriação indébita praticada pelo governo Lula, que as assumiu como se fossem suas, quando na verdade se sabe que tais medidas tiveram início no governo Fernando Henrique.
Para quem pensa em termos puramente ideológicos – como se tudo o que ocorre no mundo coubesse na dicotomia esquerda X direita -, e a isto adiciona boa dose de desinformação sobre o que aconteceu desde a Segunda Guerra, tal ideia deve fazer sentido.
No imaginário dos militantes políticos, “esquerdistas” são de fato os que professam perseguir sobretudo o bem-estar da maioria e a igualdade social, e “direitistas” os que defendem a estabilidade.
A esquerda quer o crescimento e vê virtudes miraculosas na tributação ou na expropriação pura e simples de patrimônios privados; a direita empenha-se em evitar a inflação e prefere redistribuir renda de maneira paulatina e por meios indiretos, como a ampliação de oportunidades através da educação.
Por último, mas não menos importante, a esquerda diviniza o Estado; acredita que ele pode e deve ter inclusive um amplo papel empresarial; a direita, ao contrário, pugna pela transferência da função empresarial ao mercado.
Agora vem o pulo do gato.
Ao cunhar a expressão “herança maldita” e orquestrar em torno dela uma verdadeira campanha contra o governo Fernando Henrique, Lula e o PT não agiram por ignorância.
Dizer isto seria imputar-lhes um grau extremamente elevado de desconhecimento a respeito não só da história brasileira desde os anos 60, mas até da realidade vivida do país dos anos 80 até meados dos 90.
Quem viveu aquele período como adulto tem obrigação de saber que a instabilidade inflacionária atingira níveis extremamente perigosos, desorganizando a economia e expondo o país a grave risco de convulsão social. Que a prioridade número um dos governos Sarney, Collor, Itamar e em grande parte do próprio governo Fernando Henrique foi a estabilização, sem a qual Lula evidentemente não teria colhido os bons frutos que logrou colher em seu mandato.
Mesmo tendo cumprido uma função sobretudo estabilizadora, o governo Fernando Henrique teve também um sentido distributivo. O próprio controle da inflação serviu para isso, num primeiro momento, mas as “bolsas” que viriam a ser reunidas no bolsa-família, o aumento real do salário, a política educacional e várias outras medidas tiveram igual finalidade.
Um governo propagar uma mensagem mentirosa obviamente não impede que ela seja assimilada como real e verdadeira por uma parte da sociedade. Pode-se em boa-fé acreditar em mensagens difundidas de má-fé.
Infelizmente, há fortes indícios de que um novo capítulo da novela da “herança maldita” está sendo ensaiado para a reta final da eleição.
Agora vamos ouvir que Fernando Henrique vendeu empresas públicas a “preço de banana” e que Serra pretende privatizar a Petrobras, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica.
Lula, o PT e o “dilmismo” parecem entender que, se o objetivo é ganhar a eleição, há que fazê-lo a qualquer preço. Nesse diapasão, perguntas elementares ficam sem resposta.
Se as privatizações (por exemplo, da Vale e das telecomunicações) causaram ao país o dano que se propala, por que o governo atual não as reverteu, reincorporando tais empresas ao patrimônio público?
No mesmo pacote de sandices que se empenhou em distribuir aos eleitores, o petismo incluiu a insinuação de corrupção. Insistiu o tempo todo em caracterizar as privatizações como “privatarias”.
Como então explicar que o governo Lula, tendo 8 anos para tomar providências a esse respeito, não mandou fazer uma auditoria sequer? Será que 8 anos não foram suficientes para o governo cumprir o que seria simplesmente do seu dever?
Publicado no blog de Bolívar Lamounier no portal “Exame”